A necessidade de trabalhar, no âmbito da Justiça, temas como igualdade de gênero, racismo e violência doméstica contra a mulher levou membros do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) à sede da Delegação da União Europeia no Brasil (DelBra), na quinta-feira (17/1), em Brasília. Magistrados e representantes da UE debateram a possibilidade de intercâmbio de conhecimento em relação a temas de interesse comum, como a capacitação de juízes e de agentes públicos envolvidos com o enfrentamento da violência contra a mulher.
Leia também: Comissão discute resultados da pesquisa “Quem somos. A magistratura que queremos”
Órgão Especial vota no dia 28 a remoção e promoção de juízes de Entrância
Volta Redonda recebe primeira audiência em sala para crianças
Presidente da Comissão de Acesso à Justiça e Cidadania do CNJ, a conselheira Daldice Santana ressaltou que a capacitação dos juízes é fundamental para que a Justiça possa avançar.
“Qualquer instrumento legal precisa ser dominado para poder avançar. Tudo depende de capacitação. Queremos que os cursos oferecidos pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) preparem o profissional para essa realidade”, disse.
A ex-presidente do Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica (Fonavid), Luciana Rocha, afirmou que a capacitação de magistrados é um dos três pilares para o aprimoramento da Justiça, ao lado da efetividade das medidas protetivas de urgência e do atendimento psicossocial de homens e mulheres envolvidos em situação de violência.
“Buscamos o compartilhamento de experiências para que tenhamos uma formação especializada, geral, e não apenas inicial, mas contínua, para aprimorarmos a aplicação da Lei Maria da Penha. Todos os juízes brasileiros devem estar aptos a julgar casos dessa natureza”, afirmou a magistrada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJ-DFT).
Além da necessidade de aprimoramento da capacitação em violência doméstica e familiar, os juízes presentes também indicaram o racismo e o assédio sexual e moral, ocorridos no âmbito da Justiça, como temas que também devem ser aprofundados por meio da troca de informações. Maria Rosa Sabatelli, Chefe do Setor FPI-Regional Team Américas na Delegação da União Europeia no Brasil (DelBra), afirmou que a entidade europeia irá analisar a possibilidade de implementação de ações que possam colaborar com o CNJ.
A reunião contou ainda com as juízas auxiliares do CNJ, Flávia Moreira Guimarães Pessoa, e da Corregedoria do CNJ, Sandra Silvestre Torres. Também esteve presente a ex-presidente e membro do Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar (Fonavid), Adriana Ramos de Mello, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ).
Formulário de risco
Durante a reunião, o juiz auxiliar da Presidência do CNJ, Rodrigo Capez, envolvido com o desenvolvimento do Formulário Nacional de Risco e Proteção à Vida (FRIDA) – em conjunto com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) – alertou para a necessidade de aplicação do questionário em um projeto-piloto, antes da replicação no país.
Fruto de um acordo de cooperação assinado no ano passado entre o CNJ, o Ministério dos Direitos Humanos (MDH) e o CNMP, o FRIDA deverá ajudar na identificação dos riscos pelos quais passam uma mulher que enfrenta um episódio de violência. No TJ-DFT, um questionário semelhante já é utilizado há três anos. Segundo a juíza Luciana Rocha, ele é fundamental para ajudar o juiz a fazer o reconhecimento dos riscos e gerenciá-los.
O formulário ainda está em fase de elaboração. Serão 20 perguntas que mapearão a relação do agressor com drogas, álcool, animais domésticos e histórico familiar. Dependendo do grau de perigo detectado – elevado, médio ou baixo –, a rede de atendimento deverá ser acionada e a mulher, encaminhada para o acolhimento específico. Uma versão reduzida e experimental deste formulário de avaliação de risco está sendo aplicada às mulheres que procuram a Central Telefônica de Atendimento à Mulher em situação de violência (Ligue 180).
O Brasil ocupa o 5º lugar no ranking de países com mais alto índice de feminicídio do mundo, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). A maioria dos crimes de feminicídio no Brasil foi cometida por maridos ou ex-companheiros das vítimas que, muitas vezes, já recebiam ameaças ou eram agredidas constantemente por eles.
CNJ no combate à violência
A Resolução CNJ 254/2018 instituiu a Política Judiciária Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, antes prevista na Portaria 15/2017 do CNJ. O texto define diretrizes e ações de prevenção e combate à violência contra as mulheres e garantir a adequada solução de conflitos que envolvam mulheres em situação de violência física, psicológica, moral, patrimonial e institucional, nos termos da legislação nacional vigente e das normas internacionais sobre direitos humanos sobre a matéria.
A violência doméstica contra a mulher tem sido debatida pelo CNJ desde 2007, por meio da Jornada Maria da Penha e do Movimento Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Entre as ações institucionais concretas, destaca-se o programa Semana Justiça pela Paz em Casa, promovido desde 2015, em parceria com os Tribunais de Justiça, com o objetivo de ampliar a efetividade da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), ao agilizar o andamento dos processos relacionados à violência de gênero e promover a visibilidade do tema.
No 12º Encontro Nacional do Poder Judiciário, em 2018, os tribunais de Justiça aprovaram a Meta 8, que prevê, em 2019, esforço dos juízes para identificar e julgar metade dos casos pendentes de julgamento relacionados à feminicídio distribuídos até 31/12/2018, e 50% dos casos sem julgamento relacionados à violência doméstica e familiar contra a mulher distribuídos no mesmo período.
Fonte: CNJ