Brasil | 19 de fevereiro de 2018 11:08

Portal permite consulta a decisões favoráveis ao consumidor

*O Globo

FOTO: Pixabay

Um espaço para que as pessoas se informem sobre decisões judiciais relativas a questões de consumo, que sirvam como ferramenta na defesa de seus direitos. Existe: é o portal Consumidor Vencedor (consumidorvencedor.mp.br). Criada em dezembro de 2012 pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), no início deste ano a plataforma digital passou a concentrar dados dos 27 MPs estaduais, além do MP do Distrito Federal e do Ministério Público Federal (MPF). Com esse manancial de informações, a meta é amplificar a atuação das promotorias em prol do cidadão.

Leia também: 1º Congresso Internacional sobre Inovação e Mediação será no TJ-RJ
Varas Cíveis voltam ao Fórum Central segunda-feira

Em seus cinco anos de existência, o Consumidor Vencedor acumulou mais de 290 mil acessos e 1.164 denúncias de descumprimento de decisões e acordos por empresas. Após sua reformulação, em janeiro, a plataforma passou a permitir acesso pelo celular e aceita envio de fotos e vídeos.

— Como o celular permite o acesso a qualquer momento e em qualquer lugar, o consumidor que verificar o descumprimento de uma das vitórias listadas no site poderá, imediatamente, fotografar ou filmar o ocorrido. A imagem facilitará bastante a comprovação de descumprimento e a consequente punição das empresas — diz Christiane Cavassa Freire, coordenadora das Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa do Consumidor do MPRJ e uma das mentoras do portal.

O primeiro tema a ser trabalhado em conjunto pelas 28 promotorias de defesa do consumidor do país será plano de saúde. Serão cruzados 1.433 decisões judiciais e 3.148 termos de ajustamento de conduta (TACs) cadastrados no Consumidor Vencedor.

— O portal tornou muito mais fácil dimensionar o tamanho dos danos causados aos consumidores. Num país com uma imensa dificuldade em obter dados, agora conseguimos trocar informações facilmente, o que permite aumentar a efetividade, a agilidade e o alcance do trabalho das promotorias — ressalta Alessandra Garcia Marques, presidente da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCon), acrescentando que a definição final sobre o tema da articulação nacional ocorrerá na reunião dos MPs no fim deste mês, em São Paulo.

Instrumento da sociedade civil

Para se ter uma ideia do impacto do portal na atuação das promotorias, as denúncias de descumprimentos de acordos e decisões judiciais feitas por consumidores via Consumidor Vencedor ao MPRJ resultaram em cerca de R$ 24,5 milhões em pedidos de aplicação de multa desde 2012.

— Não podemos garantir, no entanto, que todo esse valor tenha sido desembolsado pelas empresas, já que muitas recorrem ao Judiciário na tentativa de reduzir a punição. Mas o fato é que a aproximação do MP com os consumidores fortalece a fiscalização de irregularidades e pode direcionar novas atuações de promotores e procuradores — ressalta Christiane.

De acordo com pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a execução das vitórias é um dos nós das ações coletivas no país. O levantamento “Ações coletivas no Brasil: Temas, atores e desafios da tutela coletiva” recomenda, inclusive, a adoção de mecanismos de divulgações das decisões em ações coletivas por todo o Judiciário e cita o Consumidor Vencedor como um exemplo a ser seguido.

— O MP percebeu, ao longo dos anos, que, apesar dos bons resultados, os cidadãos lesados não conseguiam se beneficiar das decisões. Além disso, práticas ilegais reincidentes das empresas eram tratadas como se fossem praticadas pela primeira vez, por desconhecimento das ações e decisões já existentes — afirma Rogério Bastos Arantes, um dos coordenadores do estudo, feito pela Sociedade Brasileira de Direito Público para o CNJ.

Segundo Christiane, no Rio, em apenas 7% das ações há adesão suficiente de consumidores para recebimento de indenização. Na maior parte das vezes, explica, é a promotoria que precisa executar a sentença para que a indenização seja recolhida a um fundo de direitos difusos:

— Foi isso que nos levou a marcar no Consumidor Vencedor, com um saquinho de dinheiro, as decisões judiciais com direito a indenização para os cidadãos. A ideia é incentivar as habilitações.

Para Arantes, que também é professor da Universidade de São Paulo (USP), o movimento atual dos MPs resgata a proposta inicial das ações civis públicas (ACPs) como instrumento da sociedade civil:

— Em 1985, quando as ACPs foram criadas, o MP trabalhou para ter um papel de protagonista como provedor dessas ações coletivas. Trinta anos depois, volta à sociedade para pedir apoio para que essas ações não caiam no vazio.

A administradora carioca Elizabeth Paz já recorreu às decisões listadas no Consumidor Vencedor para fazer valer seus direitos em um caso de cobranças abusivas em sua conta corrente.

— Já tinha tentado negociar, e o banco se negava. Mas, quando mostrei que tinha conhecimento da ação movida pelo MPRJ que proibia a cobrança, resolveram de imediato. Agora, já sei onde ir para consultar os meus direitos — conta Elizabeth, que denunciou o descumprimento da decisão pelo banco ao portal.

‘O maior desafio é mobilizar o cidadão’

Os dados da plataforma também são usados como referência pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça.

— Sempre verificamos se o caso do qual vamos tratar já foi alvo de ação do MP, e se a decisão é regional ou nacional. Os dados ainda nos permitem ter uma noção de qual é o entendimento do Judiciário sobre um determinado tema. A existência do portal nos ajuda a atuar, de fato, como um sistema de defesa do consumidor, com ações coordenadas com as promotorias — diz Ana Carolina Caran, diretora do DPDC.

Mas é a apropriação pelos consumidores das decisões judiciais e acordos que os beneficiam que pode mudar o rumo do jogo, argumenta o advogado Rafael Zanatta, pesquisador em Telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e usuário frequente do banco de dados do Consumidor Vencedor.

— Não basta dar transparência aos dados. O maior desafio é mobilizar o cidadão — observa Zanatta.