Terminou nesta sexta-feira (14) o curso “Organização Criminal Mafiosa e Lavagem de Dinheiro”, realizado na Università Degli Studi di Palermo, na Sicília (Itália). Desde segunda-feira (10), os magistrados brasileiros participaram de workshops e aulas práticas e doutrinárias da lei italiana. A imersão na experiência da Justiça do país europeu foi transformadora para Vitor Moreira Lima (Vara Cível de Vila Inhomirim – Regional Magé): “jamais serei de novo o mesmo juiz”.
Na magistratura há 13 anos, este foi o primeiro curso internacional que ele participou como juiz. O descendente de calabreses e sicilianos teve um conexão profissional e pessoal com a terra de seus avôs e tios-avôs. “Até meu bisavô, Francisco Mauro, deixou a Itália por causa da opressão mafiosa na Calábria nos anos 1930”, contou ele.
Em sua avaliação, a máfia italiana se assemelha às milícias no Rio de Janeiro na forma de atuação, assim como as organizações do interior da Itália – como os corleoneses – com o coronelismo no entorno metropolitano. O juiz Eduardo Alam (auxiliar na 1ª Vara Cível de Magé) concorda com Lima e lembra que “a Lei 12.850/2013 foi inspirada nos dispositivos da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, também conhecida como Convenção de Palermo, cidade que sediou o evento”.
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Alam, que também participou de um curso no exterior pela primeira vez, aprendeu que a legislação italiana se enrijeceu à medida que o poderio da organização crescia. “O próprio tipo penal de associação à máfia é peculiar, em que se criminalizou o método mafioso até mesmo para eventos que, por si, seriam penalmente lícitos”, disse.
Camila Guerin (Vara Única de Paraty) destacou que as legislações de Brasil e Itália têm como base a “Convenção Mérida, demonstrando o empenho dos dois países em adaptar a legislação para o combate à corrupção. Tanto a máfia italiana quanto o crime organizado no Brasil são estruturados, hierarquizados”.
Ponto alto do curso
Os três acreditam que a melhor parte do curso foi a aula de Leonardo Guarnotta, que participou do Pool Antimáfia que processou mais de 400 criminosos. Único juiz vivo do grupo, ele substituiu o idealizador, juiz Rocco Chinnici, assassinado pela Máfia, assim como os magistrados e amigos pessoais de Guarnotta, Paolo Borsellino e Giovanni Falconi. Alam contou que Guarnotta “foi escoltado pela polícia por praticamente 35 anos”.
Para Camila, “a aula com o magistrado foi uma experiência única. Trata-se de pessoa admirável e que merece respeito. Uma inspiração”. Foi nele que, desde jovem, se inspirou Lima.
“Ele era um ídolo para mim. Quebrei um protocolo e levei um livro antigo pedindo que me deixasse uma dedicatória, em que ele escreveu: ‘Para meu colega Vitor Moreira, que nunca se esqueça da Justiça, dos Direitos Humanos e da força da Constituição para guiar nossos corações. Existem coisas que fazemos não por coragem, mas para nossos filhos e para os filhos de nossos filhos. Guarnotta me motiva a continuar”, finalizou ele.