O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), juiz Frederico Mendes Junior, ressaltou ser fundamental para o Estado de Direito que os magistrados tenham um salário compatível com a relevância da função. O artigo “A remuneração adequada como pressuposto da independência” foi publicado pela Revista Justiça & Cidadania.
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Confira a íntegra do artigo do presidente da AMB:
A remuneração adequada como pressuposto da independência
Quem acompanha o noticiário atentamente percebe a recorrência do tema da remuneração dos magistrados. A constância da abordagem, todavia, não vem acompanhada de uma melhor compreensão dos fatos. Pelo contrário: quanto mais se volta para a questão, menos a imprensa parece refletir a realidade.
O problema não reside na descrição dos casos, mas na ausência de contextualização e, sobretudo, na reiteração de expressões jocosas, que distorcem o significado dos subsídios – o qual ultrapassa a recompensa ao juiz pelo desvelo na lida. Um salário adequado, compatível com a relevância da função, é um pressuposto do Estado de Direito.
O cidadão que bate às portas do Judiciário busca uma decisão imparcial, tomada por um magistrado isento e imune a quaisquer pressões das partes. Para que não sofra influências do poderio econômico – e atue com autonomia –, o juiz depende de uma guarnição pecuniária suficiente para livrá-lo de preocupações externas ao processo.
Semelhante proteção não se destina à figura pessoal do juiz, mas ao cargo que exerce. Afinal, ninguém deseja ver sua causa julgada por um profissional em situação de insegurança financeira, em más condições de trabalho, sob a mira do crime organizado ou carecendo de cuidados médicos para a manutenção da saúde mental. Esse cenário – infelizmente, generalizado na magistratura – não favorece a distribuição de justiça e prejudica sobremaneira os serviços oferecidos à população.
É claro que o incremento dos proventos não tem o condão de resolver todos os gargalos que afligem o Judiciário, entretanto, sem ele, a conjuntura tende a se tornar gravosa, pois um número cada vez maior de juízes está deixando a toga para se dedicar à iniciativa privada – atitude compreensível, que leva em conta a qualidade de vida de suas famílias, mas que pode afetar negativamente a prestação jurisdicional (visto que os melhores quadros já não enxergam boas perspectivas na carreira).
E a circunstância é preocupante: 50% dos juízes brasileiros vivem ou viveram episódios de ameaça à vida ou à integridade física, segundo estudo do Centro de Pesquisas Judiciais (CPJ) da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Um terço afirmou tomar remédios para controle de estresse e ansiedade, e metade demandou acompanhamento psicológico ou psiquiátrico em razão da atividade.
A Constituição determina a correção anual dos vencimentos dos servidores, o que não tem ocorrido (no caso dos magistrados, os aumentos não repõem sequer a inflação). Apesar disso, graças a um esforço hercúleo, a produtividade dos juízes cresceu: em 2022 foram baixados 30,3 milhões de processos – quantitativo 10,8% superior ao do ano anterior. A evolução do índice demonstra o comprometimento da magistratura com o serviço público e reforça a necessidade de um tratamento digno.
O Judiciário assumiu nos últimos anos um protagonismo inédito na pacificação de conflitos que outros Poderes e instituições não puderam dirimir sozinhos – inclusive, na defesa da democracia contra as investidas que resultaram nas invasões do dia 8 de janeiro. A verdade é que os juízes brasileiros não servem a ideologias, não têm lado na polarização política e tampouco estão a serviço de interesses particulares. É inaceitável que sejam alvo de iniciativas que visam extirpar a sua independência. Precisamos resistir.
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