A violência contra a mulher com deficiência foi o tema escolhido pela desembargadora Regina Lúcia Passos para sua dissertação no Mestrado Profissional “Justiça e Saúde”, organizado pela EMERJ (Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro). Divulgado recentemente pela magistrada, o trabalho converge com o atual debate sobre o aumento da violência doméstica durante o isolamento social. “Todas as dificuldades oriundas da violência, este problema de saúde pública, são potencializadas na pessoa com deficiência [PCD]”, conta a mestre.
Diretora de Assistência e Previdência da AMAERJ, ela foi a única desembargadora da primeira turma do mestrado, aberta em 2017 pela Escola em convênio com a ENSP/Fiocruz (Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca). A pesquisa para a dissertação “Da violência sexual e outras ofensas contra a mulher com deficiência”, defendida em junho de 2019, abriu um assunto até então desconhecido para a magistrada.
“É um tema tão invisível, impactante e necessário que precisava ser trazido à luz. É um mundo invisibilizado, com uma constatação triste. As pessoas vivem através dos tempos o que diz o autor Otto Marques da Silva: uma epopeia ignorada”. Leia aqui a dissertação na íntegra.
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A ausência da acessibilidade atitudinal – ou seja, a percepção do outro sem preconceitos e discriminações – às pessoas com deficiência se soma à dificuldade das vítimas de violência reportarem os crimes cometidos contra elas. Isso quando a violência não se torna tão extrema a ponto de ser o fator inicial de uma deficiência.
“A mulher com deficiência é vítima potencializada. Não raro, a violência gera a deficiência, exatamente o exemplo da Maria da Penha”, lembra a magistrada, sobre a farmacêutica cearense que ficou paraplégica em tentativa de assassinato perpetrada pelo marido.
A invisibilidade neste caso de vítima de violência se constatou ao pesquisar jurisprudência. Regina encontrou apenas um julgado do 6º Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, que originou recurso na 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio. No caso, a mulher preparava o jantar quando o companheiro chegou em casa a agredindo. Mesmo após a chegada da polícia e ordem para parar, a violência continuou. A vítima, ao fim, retirou a queixa e alegou ter sofrido queda em razão da deficiência.
“Esse caso é emblemático porque, muitas vezes, elas dependem financeiramente destes provedores e ficam mais uma vez reféns. É uma espiral perversa”, explica ela.
A dissertação de mestrado também originou o artigo de mesmo título, publicado na edição de dezembro passado na revista “Saúde em Debate”.