Notícias | 28 de fevereiro de 2012 17:48

Amaerj apresenta “Segredos de Sangue” do juiz Aylton Vasconcellos, nesta segunda (5)

O juiz Aylton Cardoso Vasconcellos vai tornar público seus “Segredos de Sangue”, nesta segunda-feira (5 de março), no auditório da Amaerj, em coquetel de lançamento com início às 17h30. O título, a ser publicado pela editora Multifoco, é sua estreia na ficção literária. Formado pela Uerj, em 1999, ele conta que começou a escrever este romance policial – o primeiro de uma trilogia –, há cerca de 10 anos. Desde então, o autor viveu muitas aventuras até retomar seu projeto pessoal: foi procurador federal, procurador da Fazenda Nacional, ingressou na magistratura, em 2005, e concluiu seu mestrado em Direito Processual, pela mesma Uerj, no ano seguinte.

Foto: Amaerj

Admirador de Dostoiévski, o juiz Aylton revela que somente após ser transferido para a Vara Única de Arraial do Cabo, na Região dos Lagos, onde está atualmente, que conseguiu retomar para valer o desenvolvimento de sua obra. Além do clássico autor russo, ele se diz admirador de três autores em particular: Miguel de Cervantes, Alexandre Dumas e Sir Arthur Conan Doyle, este, criador do célebre Sherlock Holmes e considerado o pai das novelas policiais. Não é surpresa, portanto, que o escritor Aylton Vasconcellos tenha optado pelo gênero policial para contar a história de Carlos, um detetive particular que começa a investigar o misterioso assassinato de Frei Michel, um sacerdote que dirigiu o orfanato onde ele foi abrigado em sua infância. Durante as investigações ele enfrenta diversos perigos, fazendo o leitor viajar pelo estado do Rio e um pouco pela França. Entretanto, além dos fatos ligados à morte do sacerdote franciscano, acaba descobrindo segredos desconcertantes sobre o seu próprio passado e o de sua família. Daí os “segredos” do título.

| Livro do juiz Aylton Vasconcellos, que será lançado hoje, ganha destaque em coluna da ConJur

Casado há 12 anos com a advogada Carla, que conheceu ainda na faculdade de Direito, o juiz Aylton fala, nesta entrevista exclusiva, sobre a influência da literatura no seu modo de ver o mundo e de julgar.

O ministro do STJ Luis Salomão afirmou que a literatura o ajuda a julgar melhor. O sr. concorda?

Esse comentário é muito pertinente. De fato, a literatura te leva a conhecer melhor o ser humano. Quando você lê ficção e tem acesso à psicologia dos personagens, você consegue algo muito difícil de obter em um texto técnico ou científico, que é colocar-se no lugar daquela pessoa, acessar os pensamentos e sentimentos daquela pessoa. Isso vai, sem dúvida, ajudar qualquer pessoa a fazer um julgamento melhor. E não só um juiz. Afinal, todos julgam instintivamente o tempo inteiro, sobre a atitude dos outros, das próprias… A leitura vai somar à sua experiência pessoal a de várias outras pessoas. Você fica muito mais humano, consegue entender melhor a motivação das pessoas, aquilo que está por trás de suas ações, ficando mais imune ao instinto de rotular as pessoas e suas condutas.

Antes de entrar no universo do Direito, que leituras contribuíram na sua formação?

Vou citar de cabeça, sem estabelecer ordem de importância. Um dos autores que eu mais admiro é Sir Arthur Conan Doyle, autor do célebre Sherlock Holmes. No meu romance faço até uma citação em homenagem a ele. Conan Doyle teve uma importância enorme ao ajudar a consolidar a linha de investigação científica, mas também por ter construído personagens interessantíssimos. Outro é Alexandre Dumas, mais conhecido como autor de aventuras (Os três mosqueteiros, O conde de Montecristo), mas que criou, também, personagens muito ricos, além de ter feito, na sua época, uma crítica muito forte ao sistema político vigente. Por fim, cito o russo Dostoiévski, por quem tenho uma admiração extraordinária, e é um dos maiores escritores da literatura universal. Na nossa área do Direito, ele é mais conhecido pelo romance “Crime e Castigo”. Dostoiévski talvez seja o autor que tenha feito com mais profundidade a análise do ser humano. Nessa obra especificamente, ele consegue criar um protagonista que é um assassino…

E consegue fazer com que o leitor sinta empatia por ele…

Exatamente. E o livro começa com o crime. Não há surpresa alguma. O drama enfrentado por ele, a culpa e como ele lida com aquilo, é de um valor inestimável. Pelo que me recordo, este livro foi muito divulgado no Brasil pelo jurista Clóvis Bevilacqua.

Em que a experiência em uma comarca do interior tem contribuído para o seu lado escritor?

Ela me proporciona a oportunidade de ter um contato humano que eu não teria em um grande centro urbano. Em função, também, da grande variedade de assuntos a que somos submetidos, pelo fato de a vara única exigir uma competência múltipla, a gente trava contato com o drama humano em todas os seus aspectos.

Algum aspecto do seu romance saiu dessa matéria-prima, digamos assim?

Eu diria que sim. Quando a gente faz uma obra de ficção, é feito um planejamento, há todo um lado racional, de estrutura, mas você escreve muito com o seu inconsciente. Você tem que estar com o seu espírito livre para dar vazão às suas ideias e à construção dos personagens. Então você se refere a algo vivido sem nem perceber. Isso acontece muito, até porque nosso inconsciente tem uma capacidade de armazenagem muito maior. Os leitores que atuam na área jurídica, por exemplo, vão reconhecer muita coisa da nossa vivência. O protagonista, que foi criado em um orfanato franciscano, resolve investigar o assassinato do diretor da instituição e acaba se envolvendo em um julgamento… Na verdade, o livro começou com a ideia de ser uma obra de ficção que não tivesse nada a ver com a área jurídica. Mas a gente não consegue deixar de colocar o que está ligado à nossa experiência, é aquela história do inconsciente… Isso surgiu meio sem querer, não foi planejado, e eu acho que enriqueceu muito.

O sr. levou quanto tempo para escrever o livro?

Eu comecei a escrever um pouco antes de entrar na carreira da magistratura. Aí tive que parar para estudar para o concurso, depois interrompi novamente por causa do mestrado.

Esse tempo mais extenso ajudou a amadurecer a história?

Ajuda porque a gente amadurece. Se eu tivesse concluído o livro lá atrás, não teria tantos elementos, não teria podido incluir tantas experiências. Isso foi bom pro romance, porque a proposta era, mesmo estando dentro do gênero de suspense, seguir um pouco além.

Como o sr. vê o preconceito em relação à literatura policial, apesar de tantos autores premiados, como o brasileiro Luiz Afredo Garcia Roza, criador do inspetor Espinosa?

O gênero literário é um formato. Nesse formato, você pode encaixar um conteúdo muito variado. Então, vai depender de cada escritor. Talvez, tenha contribuído para fortalecer esse preconceito algumas histórias que não se aventuraram a ir mais fundo. E eu acho que falta ousar mais nesse campo. Usar esse formato, que consegue falar tão perto e cativar tanto o leitor, através do suspense, do mistério, e usar esse canal para tratar de temas mais profundos, que demandam mais reflexão. E o bonito é fazer isso sem produzir um texto pesado, sem tanta solenidade. O título do meu livro, aliás, é um trocadilho entre o assassinato que precisa ser desvendado e segredos da própria família do protagonista que começam a vir à luz durante a história. No meio disso, são tratadas questões de paternidade, corrupção, drogas, celibato, e há espaço, até, para uma abordagem sobre o meio jurídico.

A rotina de magistrado tem lhe permitido ler ficção?

Costumo dizer que a gente sempre encontra tempo para aquilo que está entre nossas prioridades. Recentemente, eu tenho voltado aos clássicos, que é uma fonte de inspiração. Vou dar um exemplo de uma obra que todo mundo conhece, mas que não é muito lida: Dom Quixote de La Mancha, de Cervantes. Este é, talvez, um dos mais importantes livros que já tenha sido escrito. A editora 34 está publicando a tradução de Sergio Molina e, na quarta capa há uma bela citação de Dostoiévski sobre essa obra. Diz ele (abre e lê direto no livro): “(….) Não existe nada de mais profundo e poderoso do que este livro. Ele representa até hoje a mais grandiosa e perfeita expressão da mente humana. Se o mundo acabasse e no Além nos perguntassem: ´Então, o que você aprendeu da vida?`, poderíamos simplesmente mostrar o D. Quixote e dizer: “Esta é a minha conclusão sobre a vida. E você? O que me diz?`”

Creio que em algum lugar no plano espiritual Cervantes deve ter ficado muito feliz com o pensamento do grande escritor russo… E se “lá em cima” também gostam de literatura, certamente os dois ainda devem estar escrevendo muito…

Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj/Marcelo Pinto