AMAERJ | 08 de novembro de 2018 10:30

Revista FÓRUM: Choro, a nobre música do Brasil

Gênero fundiu a percussão originária da África e a música oitocentista dos salões da Europa

POR SERGIO TORRES

O choro é um gênero da música brasileira, basicamente instrumental, que, a partir de meados do século 19, mesclou ritmos da moda europeia a elementos percussivos de origem africana. Deste mix nasceu um som novo, rico em improviso, inovação melódica e talento de músicos e compositores.

A fim de preservar e difundir o gênero surgiu no Rio, em 1999, o Instituto Casa do Choro. Criado por músicos, funciona no secular casarão no número 38 da Rua da Carioca (Centro). Espaço único na cidade, nele se alternam oficinas, depoimentos, aulas, mostras, palestras, festivais e shows no Auditório Radamés Gnatalli, de acústica irretocável.

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A Casa do Choro reúne 18 mil partituras, 2.000 discos, vasto acervo fotográfico e iconográfico, catalogado e digitalizado. Guarda peças do Instituto Jacob do Bandolim, músico genial que, vivo fosse, teria 100 anos neste 2018. Abriga, entre as coleções, a doada pelo poeta e escritor Hermínio Bello de Carvalho.

Em 2000, a Casa do Choro criou a Escola Portátil de Música, que já atendeu a 15 mil alunos no Brasil. A EPM já atuou em áreas pobres no Rio. O projeto poderá voltar em 2019.

“Os projetos de formação são os mais importantes. Os resultados são maravilhosos! Fizemos o primeiro em 2003/2004, em Ramos. Depois, Rocinha, Itaguaí, Santa Cruz, Alemão, Manguinhos, Penha e Cantagalo. Com a descontinuação [por falta de verba], nosso Núcleo Fixo na Urca absorveu alguns ‘órfãos’ dos projetos. Damos bolsa de estudo, mas o ideal seria retomar os projetos nos locais de moradia. Transporte e alimentação são os maiores complicadores, pois não temos recursos”, disse a compositora Luciana Rabello,
cavaquinista e presidente da Casa do Choro.

O choro já é interpretado mundo afora. Desde 2012, a EPM tem filial na Holanda, no Conservatório de Roterdã. Um dos projetos da Casa é montar em 2019 um festival internacional que traga ao Rio músicos como o australiano Doug de Vries, violonista de sete cordas, e a flautista japonesa Naomi Kumamoto.

Única gravadora brasileira dedicada exclusivamente ao choro, a Acari Records é uma iniciativa da Casa. Por seu estúdio já passaram craques como Maurício Carrilho, Pedro Amorim e Cristóvão Bastos, músicos que, além de novas composições, dedicam-se a perpetuar o gênero que rendeu à cultura brasileira valores como Jacob, Pixinguinha, Radamés e Altamiro Carrilho.

Luciana fala da vocação arquivista da Casa do Choro, evidenciada na recuperação de partituras de quase 200 anos, na gravação de choros antigos e na montagem de acervos. “Todo mundo que se dedica ao choro acaba sendo pesquisador. Como foi Jacob do Bandolim”, afirma.

Ela conta que a EPM ocupou um espaço não preenchido pelo ensino superior de música. Antes, o jovem tinha aqui a opção de cursar uma universidade com foco na música clássica ou viajar para Berklee, reduto musical universitário nos Estados Unidos.

“São opções maravilhosas, a música erudita e o jazz. Mas não era com isso que sonhavam os músicos da nossa geração. Queríamos um ensino voltado à música popular. Criamos a Escola Portátil. O compromisso que temos é não deixar o choro morrer. Não somos do time que senta e chora. Somos do que levanta e faz”, avisa.

Jacob, o gênio do bandolim

Jacob do Bandolim partiu cedo, vítima de um infarto em 1969, aos 51 anos. Em 14 de fevereiro, comemorou-se o centenário de seu nascimento. Jacob Pick Bittencourt e Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha (1897-1973), são os mais importantes chorões de todos os tempos.

Carioca, referência na música brasileira pelo talento e dedicação ao instrumento que lhe valeu o apelido, Jacob tinha uma segunda profissão: servidor do Tribunal de Justiça do Rio, aprovado em concurso público. Casado, dois filhos pequenos, ele concorreu à vaga no Tribunal a conselho do compositor Donga (Ernesto dos Santos, 1889-1974). O bandolinista, atuante no rádio e em gravações, passou a ter vida dupla. Era serventuário e músico.

O primeiro disco solo data de 1947. Obcecado pelo choro, ao longo de quatro décadas reuniu acervo precioso de documentos, partituras, gravações, discos, fotografias, livros e reportagens. Amigos músicos e admiradores criaram o Instituto Jacob do Bandolim, a fim de eternizar a obra do mestre, autor dos clássicos “Doce de Coco” e “Noites Cariocas”. A Casa do Choro também guarda fotos e objetos pessoais do compositor.

Jacob do Bandolim batiza a rua ao lado do prédio da Escola da Magistratura do Estado do Rio e do Museu da Justiça, onde fica a sede da AMAERJ. Curta, ela liga a Rua Dom Manuel à Praça 15.

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