* O Globo
O presidente do Tribunal de Justiça do Rio, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, e o procurador-geral de Justiça, Marfan Vieira, declararam guerra ao pacote de austeridade do governo do estado. As medidas afetam vantagens do Judiciário e do Ministério Público, como os repasses mensais para pagamentos de salários que hoje são calculados com base na arrecadação prevista no orçamento anual, mas passariam a se limitar à receita realizada. Além disso, o ajuste fiscal proposto pelo estado, se for aprovado pelos deputados, permitirá que 40% dos fundos especiais geridos pelo TJ e pelo MP sejam usados, por um período, para pagamento de salários. Outros órgãos também dispõem de fundos especiais, como a Assembleia Legislativa, a polícia e os bombeiros.
Nesta quinta, ao se pronunciarem sobre as medidas, o presidente do TJ e o procurador-geral de Justiça disseram que as medidas propostas pelo estado e que serão votadas pela Alerj são inconstitucionais e interferem na independência e na harmonia entre os poderes. O desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho disse que não deixará a Constituição seja “rasgada”.
— O Poder Judiciário não irá permitir que a crise financeira seja utilizada como motivo para que seja rasgada a Constituição Federal, desrespeitados os princípios da independência e da separação dos poderes, com a quebra da autonomia financeira e orçamentária, em evidente prejuízo para o estado democrático de direito e milhares de pessoas que, diariamente, têm suas demandas analisadas e julgadas pela Justiça — disse.
O procurador-geral de Justiça, Marfan Vieira, afirmou que as medidas anunciadas, que incluem uma alíquota suplementar para cobrir o rombo do Rioprevidência, são uma forma de “confisco”. Segundo ele, se aprovadas, as medidas “produzirão penosos e imediatos efeitos sobre a população em geral e, particularmente, sobre o funcionalismo público estadual, alcançando, inclusive, os membros e servidores da nossa instituição”.
Ao analisar os 22 projetos de lei encaminhados pelo Executivo à Alerj — dos quais três atingem diretamente o Judiciário —, o presidente do TJ disse que as medidas são absurdas e inaceitáveis. Além dos duodécimos e dos fundos especiais, ele também se referia à proposta do estado para que cada poder assuma o pagamento de seus aposentados.
Ribeiro Carvalho disse que a mudança na fórmula de cálculo do duodécimo traria “caos financeiro a todos os poderes e às instituições”, que não teriam condições de programar seus gastos:
— Como aceitar que o Poder Executivo, que retém indevidamente valores de duodécimos e que criou, unilateralmente, um calendário de pagamento no qual trata os demais poderes e instituições como se fossem autarquias suas, possa estabelecer, mês a mês, qual o valor que entende que deve ser repassado? — criticou.
O presidente do TJ também lembrou que o fundo especial do tribunal garante o custeio da Justiça, “indispensável para a independência deste poder”, e lembrou que a instituição socorreu o estado com R$ 400 milhões do fundo em novembro de 2014 para livrar o governo da Lei de Responsabilidade Fiscal, valor que, de acordo com ele, não foi devolvido.
Ribeiro de Carvalho também protestou contra o atraso do duodécimo de novembro, que atingiu a magistrados e servidores:
— O Poder Executivo tem a chave do cofre, mas, embora tenha direito à maior fatia, não é o dono de todo o valor que está dentro dele. Assim, não pode se apropriar de parcela que não lhe pertence, ainda que em um período de gravíssima crise financeira.
O procurador-geral de Justiça afirmou que a equipe de assessoramento técnico do MP analisou as medidas anunciadas pelo governo e constatou uma série de inconstitucionalidades. Os órgãos vão propor à Alerj a rejeição dessas propostas, mas, caso não tenham sucesso, irão entrar com ações de inconstitucionalidade no TJ e no STF.
— Não obstante a necessidade de contenção da crise, qualquer medida a ser adotada no plano legislativo há de observar estritamente os balizamentos constitucionais, sendo nosso dever zelar para que tal ocorra — afirmou o procurador-geral.
Segundo nota assinada por Marfan, “não há como aquiescer com o confisco ou o apoderamento de parte da remuneração de agentes públicos, mediante exponencial aumento de contribuições sociais ou extinção de benefícios estatutários. Isso enfraquece o próprio serviço público, gerando reflexos imediatos nos direitos assegurados à população, que já será afetada severamente pelos aludidos projetos, com a extinção e a restrição de programas sociais em áreas sensíveis como moradia, transporte, alimentação e saúde”.
Fonte: O Globo