Em precedente inédito, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a assistência jurídica qualificada prevista na Lei Maria da Penha é obrigatória, inclusive nas ações submetidas ao Tribunal do Júri. A decisão seguiu o entendimento unânime da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), em recurso do Ministério Público de relatoria do desembargador André de Franciscis.
De acordo com a decisão, a nomeação automática da Defensoria Pública como assistente qualificada é medida de tutela provisória, válida na ausência de manifestação expressa da vítima – a qual pode optar por advogado particular a qualquer tempo.
“O cerne da questão posta em discussão é se os artigos 27 e 28, da Lei Maria da Penha, teriam criado a obrigatoriedade no sentido de a vítima mulher de violência doméstica e/ou familiar ou seus parentes, em caso de homicídio consumado (vítimas indiretas) figurarem como parte, ao lado do MP, nos processos respectivos. De fato, o tema é novo e extremamente árido, ainda sem muitos precedentes jurisprudenciais, sendo certo que ainda não há (pelo menos não foram encontradas) manifestações dos Tribunais Superiores”, havia frisado o desembargador André de Franciscis em seu voto.
Em julgamento de recurso especial, o Ministério Público do Rio de Janeiro questionava a atuação da Defensoria como representante dos interesses da mãe, do irmão e do filho de uma vítima de feminicídio, reconhecidos judicialmente como vítimas indiretas.
O 2º Tribunal do Júri do TJ-RJ havia deferido o pedido de assistência qualificada formulado pela Defensoria. O MP recorreu, e a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a decisão.
O órgão ministerial sustentou, entre outros pontos, que a lei não prevê a possibilidade de a Defensoria Pública representar simultaneamente o acusado e os interesses da vítima ou das vítimas indiretas, razão pela qual requereu a revogação da decisão.
Assistência qualificada obrigatória
O TJ-RJ decidiu pela inexistência de incompatibilidade na atuação da Defensoria em favor do réu e da vítima, desde que por defensores públicos distintos, e pela obrigatoriedade da assistência jurídica qualificada em todas as fases do procedimento criminal, conforme a Lei Maria da Penha.
O relator do recurso no STJ, o ministro Joel Ilan Paciornik, também rejeitou os argumentos do Ministério Público, e ressaltou que a Lei Maria da Penha impõe de forma obrigatória a prestação de assistência jurídica qualificada às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Ao analisar a incidência desse direito nos processos de competência do Tribunal do Júri, o ministro afastou qualquer restrição à assistência jurídica qualificada nos casos de feminicídio. Joel Ilan Paciornik frisou que a expressão utilizada no artigo 27 da Lei Maria da Penha – “em todos os atos processuais, cíveis e criminais” – deve ser interpretada de forma ampliativa, reforçando a necessidade de uma assistência especializada e humanizada também no âmbito do Tribunal do Júri.
Para o desembargador André de Franciscis, embora não ainda tenha efeito vinculante, a decisão é de extrema importância para a reflexão do tema, em razão de seu ineditismo.
Desembargador André de Franciscis e ministro Joel Ilan Paciornik | Fotos: AMAERJ e Lucas Pricken/STJ
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