*Poder 360
A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, disse na noite desta 2ª feira (29) que usar o caso do ex-presidente Lula para revisar o início da execução penal após condenação em 2ª Instância é “apequenar” o STF.
A declaração foi dada em jantar do Poder360-ideias, divisão de eventos do Poder360. O encontro reuniu empresários e jornalistas no Piantella, tradicional restaurante de Brasília. Cármen Lúcia disse que não conversou com os ministros da Corte sobre o tema e que não há previsão para julgamento do assunto.
“Não sei por que 1 caso específico geraria uma pauta diferente. [analisar o tema por causa do Lula] Seria apequenar muito o Supremo. Não conversei sobre isso com ninguém”, afirmou a presidente do STF.
Leia também: Juizado do Torcedor e Vara da Infância darão plantão no Sambódromo
Em uma sociedade emancipada, demandas judiciais cairiam, diz Jessé Torres
Os 3 juízes da 8ª Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) decidiram na última 4ª feira (24.jan.2018) manter, por unanimidade, a condenação do ex-presidente Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A pena foi fixada em 12 anos e 1 mês de prisão.
Com o resultado, as possibilidades de recurso da defesa de Lula na 2ª Instância ficaram restritas a embargos de declaração –ação que questiona apenas o palavreado da sentença, mas não a sua conclusão. De acordo com entendimento fixado pelo STF, após o julgamento desses recursos pelo TRF-4, seria possível o início da execução da pena do ex-presidente. Isso deve acontecer em até cerca de 60 dias e nesse momento é que Lula poderia ser preso.
A presidente do STF lembrou que votou por duas vezes pelo início da execução da pena em 2ª Instância. “Votei igual duas vezes [pela permissão da prisão em 2ª instância]. Em 2009 fui voto vencido, em 2016, fui voto vencedor”, disse.
Cármen Lúcia disse que em fevereiro o tema não estará em pauta. Em março, tampouco há previsão de que ações que questionam o entendimento sejam levadas ao plenário.
Nesse cenário, a defesa do ex-presidente pretende entrar com recursos no Superior Tribunal de Justiça e no STF para tentar reverter a prisão de Lula. Nada impede que o petista tenha sucesso obtendo 1 habeas corpus para ficar em liberdade até que seu caso seja apreciado pelo STJ.
Ficar em liberdade, entretanto, não será suficiente para o ex-presidente ficar imune à Lei da Ficha Limpa. A presidente do STF foi indagada sobre o que pode ser esperado a respeito da aplicação desse dispositivo legal. Ela afirmou que é improvável que o STF reverta o entendimento atual: o de que condenados em 2ª Instância ficam automaticamente impedidos de concorrer a cargos públicos, independentemente de entrarem com recursos em tribunais superiores.
Durante o jantar do Poder360-ideias, a ministra enfatizou que esse entendimento tem sido o do TSE e o do STF. A ser mantida essa jurisprudência, a candidatura do ex-presidente Lula torna-se inviável.
A ministra também citou o fato de que agora a Lei Eleitoral impede a substituição de 1 candidato a menos de 20 dias da eleição. Isso inviabiliza uma estratégia pensada pelo PT, de manter Lula candidato até que sua foto fosse carregada em todas as urnas eletrônicas. Isso não será possível agora em 2018.
“Eu acho que isso está pacificado. Muito difícil mudar. Improvável que seja reversível, porque a composição [do Supremo] que decidiu lá atrás é praticamente a mesma”, declarou Cármen Lúcia.
CRISTIANE BRASIL
A presidente do STF disse que não assistiu ao vídeo em que a deputada se defende das condenações trabalhistas. Em 22 de janeiro, suspendeu a decisão do STJ que permitia a Cristiane Brasil assumir o Ministério do Trabalho.
Cármen Lúcia não quis comentar sobre recurso do governo que tenta permitir a posse da deputada no Ministério do Trabalho. “O tempo do direito não é o tempo da imprensa, da política. Exige respeito a prazo”, afirmou.
DELAÇÕES PREMIADAS
A presidente do STF afirmou que o processo de homologação das delações premiadas é assunto pacificado no STF. Para a ministra, é apenas uma questão de aplicação.
Ministros da Corte, porém, têm adotado posições contrastantes. Edson Fachin, por exemplo, homologou a delação da JBS, permitindo que o Ministério Público oferecesse imunidade aos delatores quanto a uma eventual denúncia.
Ricardo Lewandowski, por sua vez, devolveu para ajustes a delação do marqueteiro Renato Pereira por discordar das cláusulas propostas pelo MPF, que fixava inclusive regime de cumprimento da pena do delator.
“Não é uma rediscussão. O que fez o ministro Lewandowski é o que fazia, por exemplo, o ministro Teori. Algumas delações foram devolvidas parcialmente, outras na íntegra”, disse a presidente.
AUXÍLIO-MORADIA
A retomada da discussão sobre a garantia de auxílio-moradia a todos os magistrados não foi descartada. A presidente do STF disse que o assunto ainda não está pautado, mas pode entrar em discussão já em março. Relembrou que, como presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) determinou que os tribunais de todo o país enviassem à entidade a íntegra dos valores gastos.
O tema voltou à tona nesta 2ª, com os comentários do juiz federal Marcelo Bretas, responsável pela Lava Jato no Rio. Ele e a mulher acionaram a Justiça para garantir que os 2 recebam o auxílio. O CNJ proíbe o recebimento do benefício a casais que morem no mesmo imóvel.
TRF-4 E LULA
Na última semana, após o julgamento de Lula pelo TRF-4, análises publicadas pela mídia destacaram o tom mais comedido dos 3 juízes ao proferirem os votos (assista às íntegras) que condenaram o ex-presidente a 12 anos e 1 mês de pena por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Os comentários foram feitos em comparação às discussões acaloradas e trocas de farpas entre os ministros nos julgamentos do STF. Cármen Lúcia ponderou: “[Essa característica] de ser mais circunspecto deve valer para nós também. Mas esse tipo de discussão depende de uma composição menor. No TRF-4, são só 3 juízes, no STF são 11 com visões diferentes de mundo”.
O caráter constitucional das discussões no Supremo também contribui para argumentações mais incisivas, afirmou a ministra. “O STF discute muito mais teses do que os tribunais. Muitas vezes o caso concreto já está prejudicado, mas a discussão vale para casos análogos. Em casos penais, as discussões costumam ser restritas às provas”, disse Cármen Lúcia.
SUPREMO DIVIDIDO E TV
A ministra afirmou ainda que os 11 membros da Corte têm, sim, posicionamentos diferentes. No entanto, disse que as disparidades entre os ministros não são tão gritantes. “A TV potencializa muito as diferenças. Hoje as pessoas, os cidadãos assistem à TV Justiça. Essa é a diferença”, disse.
INDULTO DE NATAL
A presidente do STF negou que sua decisão de suspender parcialmente o indulto presidencial concedido por Michel Temer tenha provocado qualquer desarmonia entre os Poderes.
“Não houve tensão entre o Executivo e o Judiciário. Era um julgamento. O Judiciário cumpriu o seu papel de julgar a constitucionalidade da decisão”, disse.
Cármen Lúcia suspendeu trechos que concediam o benefício a pessoas que tivessem cumprido pelo menos 1/5 de sua pena (aos presos não reincidentes) ou 1/3 da pena (aos presos reincidentes) nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência a pessoa e a redução de penas aos presos que cometeram crimes sem grave ameaça ou violência a pessoa.
Argumentou que “indulto não é e nem pode ser instrumento de impunidade”.
PRETENSÃO ELEITORAL
Muito lembrada como possível nome para uma eleição indireta nos momentos de maior fraqueza do governo de Michel Temer, a ministra do STF negou qualquer possibilidade de disputar qualquer eleição para cargos do Executivo ou Legislativo. “Nunca pensei nessa possiblidade. Eu sou do Judiciário”, disse.
SEGURANÇA PÚBLICA
Plantonista do Supremo durante o recesso do Judiciário, Cármen Lúcia começou 2018 vendo rebeliões serem registradas em vários presídios no país. O 1º motim foi em Aparecida de Goiânia, na região metropolitana de Goiânia. Terminou com 9 mortos e 14 feridos. A penitenciária registrou 3 rebeliões em 5 dias.
Na semana seguinte ao incidente, a presidente do STF foi ao Estado discutir a crise penitenciária. Também visitou presídios no Sergipe.
Apesar das rebeliões se repetirem ano após ano, a magistrada afirmou que a crise penitenciária está sendo monitorada pelo Judiciário. A ministra citou que a crise penitenciária é o assunto que mais a preocupa neste momento em que ocupa o comando do STF e do CNJ. “Desde 13 de setembro de 2016 [data da posse da ministra como presidente da Corte], nenhum dia eu parei de mexer com isso”, disse.