Notícias | 29 de maio de 2013 10:49

Sinos dobram por nós

* João Batista Damasceno

John Donne, poeta inglês contemporâneo de Shakespeare, disse que “Nenhum homem é uma ilha, completo em si mesmo. Todo homem é um pedaço do continente; uma parte do todo. Se um torrão de terra for levado pelo mar, a Europa fica menor. Assim, a morte de qualquer homem me diminui porque eu sou parte da humanidade. Portanto, nunca procure saber por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti”.

Todas as vidas se equivalem, mas a falta de algumas nos deixa em maior orfandade. Hoje será celebrada a missa de 7º dia do jurista e pensador social brasileiro Paulo Mercadante, intérprete do Brasil que explicitou, em obra, a nossa consciência conservadora. Ele nos explicou como o jeitinho conciliatório brasileiro harmonizou o liberalismo econômico com o barbarismo da escravatura e como o romantismo nas instituições nos fez tratar o Estado como unidade transcendente e não uma realidade contratual, fazendo-nos repelir as transformações abruptas e impondo-nos apenas possibilidades de mudanças que se operem imperceptíveis.

A cultura bacharelesca da sociedade brasileira propicia belos discursos. São românticas as análises das nossas instituições. A estética do belo institucional nos impele ao conservadorismo. Em contraponto, a ética do bem propicia que Joaquins e UPPs se arvorem construtores de uma nova ordem e nos violentem sem apontar para a construção de parâmetros republicanos. Equilibramo-nos entre a estética nos discursos sobre o ‘belo institucional’ e a ética do autoritarismo, que se diz ‘do bem’, e nos mantemos sem perspectivas para nossos dilemas contemporâneos.

Em 1965, no prefácio à 1ª edição de ‘A Consciência Conservadora no Brasil’, Paulo Mercadante dizia sobre o golpe de 1964 que “A escolha de um energúmeno para a direção política deveria levar o grupo vitorioso a um destino trágico”. É para onde nos levam os energúmenos. A perda de um intérprete de nossa realidade, quando a problemática contemporânea mais dele precisa, nos impõe que não choremos por ele, mas porque ficamos sem ele.

Doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Membro da Associação Juízes para a Democracia

Fonte: O Dia