Até sexta-feira (27/11), milhares de pessoas devem participar da 10ª Semana Nacional da Conciliação, evento do Conselho Nacional de Justiça que mobiliza tribunais de todo o país para fomentar e concentrar a solução consensual de conflitos. O lançamento em São Paulo teve a presença do presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, que acompanhou algumas das 7,5 mil audiências agendadas.
No mesmo local, a advogada Roberta Mantovani comemorava o resultado de uma audiência ao deixar o local com seu cliente. “Os magistrados e todo o pessoal envolvido foram muito prestativos e estavam bem preparados para chegarmos a um bom acordo. É a primeira vez que participo da semana da conciliação e certamente a indicaria”, disse.
Para a juíza federal Isadora Segalla, coordenadora da Central de Conciliação de São Paulo, o foco no cidadão é o principal objetivo da conciliação. “É muito importante que o CNJ tenha abraçado essa ação pela conciliação e promova a semana nacional, que é um esforço concentrado de uma prática que já temos o ano todo”, complementou.
Coordenador do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania Central do TJ-SP, o juiz Ricardo Pereira Júnior diz acreditar que o CNJ teve papel fundamental para fomentar a cultura de conciliação entre juízes, cidadãos e demais instituições que trabalham com o Judiciário. “As pessoas estão buscando um movimento de pacificação de forma adequada, não mais em um processo que demora anos, mas em um procedimento mais informal e aberto em que as partes se sentem incentivadas a participar ativamente da composição de seus problemas.”
De acordo com o magistrado, enquanto os processos no Judiciário paulista levam cerca de quatro anos, a expectativa de atendimento de reclamações extraprocessuais é de 40 dias. “É muito melhor buscar conciliação qualificada, e temos sucesso em 70% dos casos levados a conciliação pré-judicial.”
Ex-conselheiro do CNJ, presidente do Fórum Nacional da Mediação e Conciliação e coordenador do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do TJ-SP, o desembargador José Roberto Neves Amorim foi um dos responsáveis por desenvolver a aplicação da Resolução CNJ 125/2010, que criou a política nacional judiciária de conciliação. Embora imaginasse que o movimento iria dar certo, não esperava que o engajamento social se daria de forma tão rápida. “A sociedade precisa disso hoje, clama por um momento em que ela seja bem recebida e entendida pelo Poder Judiciário. Precisamos aprender a receber o cidadão que vem com um conflito para solucionar, e isso é fundamental para o desenvolvimento da conciliação.”
Ex-conselheiro do CNJ, o juiz José Guilherme Vasi Werner avalia que a Resolução 125 do conselho é um marco, tendo incentivado que partes, advogados, juízes e tribunais passassem a agir concretamente para abrir o caminho das soluções alternativas.
Para ele, desde que a resolução foi publicada, há cinco anos, houve um avanço no modo da sociedade entender essa questão. Segundo Werner, em um primeiro momento, a sociedade exitou em acolher as práticas de solução consensual de conflitos, mas agora essa hesitação tem desaparecido.
“Os anos que virão, principalmente os primeiros anos da vigência do novo CPC e da Lei da Mediação, serão fundamentais para a consolidação dessa nova mentalidade de maturidade e independência para resolver os próprios conflitos quando possível.”
Novas leis
Em 2015, o Congresso Nacional aprovou duas normas que colocam a solução consensual de conflitos como protagonista no cenário jurídico brasileiro: em março foi o novo Código de Processo Civil, no qual a conciliação e a mediação se tornaram etapas processuais obrigatória, e em junho a Lei da Mediação. Para integrantes do CNJ, essa agenda legislativa está diretamente relacionada a um movimento que partiu de dentro do próprio Judiciário, cada vez mais engajado com a humanização da prestação jurisdicional.
Para o coordenador do Comitê Gestor do Movimento pela Conciliação do CNJ, conselheiro Emmanoel Campelo, o país vive uma mudança de paradigmas, saindo de um Código de Processo Civil que não citava mediação e que agora trata os meios consensuais de solução de conflitos como prioritários e os facilitadores como auxiliares da Justiça.
“O Judiciário deixa de ser uma mera fábrica de sentenças. Há muitos anos se vem fomentando essa ideia, com uma iniciativa que nasceu dentro do próprio Judiciário, que está muito mais preocupado com o cidadão e com o serviço prestado que com qualquer viés corporativista”, disse o conselheiro, durante abertura da 10ª Semana Nacional da Conciliação em São Paulo.
Campelo avalia que essa política judiciária deu certo porque os cidadãos se sentiram mais confiantes por voltarem a ter o poder de decisão sobre seus conflitos, e que os próprios juízes acabaram convencidos das vantagens de trazer a sociedade para esse processo.
Juiz auxiliar da presidência e membro do Comitê Gestor do Movimento pela Conciliação do CNJ, André Gomma de Azevedo avalia que o ponto de partida de ambas as normas aprovadas em 2015 foi a preocupação de alguns juízes que começaram a repensar a Justiça há mais de uma década e acabaram inspirando toda a magistratura e demais instâncias de poder. “O novo CPC e a Lei de Mediação foram aprovadas a partir da política pública do Judiciário e praticamente seguiram os patamares que o CNJ tem estabelecido nesse movimento pró conciliação”, explica.
De acordo com o magistrado, a realização da Semana Nacional da Conciliação é um momento importante para que o Judiciário continue discutindo seu papel e seus valores em um caráter mais humanista, uma das principais preocupações da atual gestão do CNJ.
O magistrado avalia que diversos tribunais já estão prontos para atender às exigências das novas normas sobre solução consensual de conflitos e lembra que o CNJ está à disposição para auxiliar as cortes que ainda precisam se adaptar, fornecendo cursos, instrutores, guias e demais orientações necessárias.
Rapidez elogiada
Em Brasília, o advogado Leonardo Oliveira se surpreendeu com a eficácia das audiências de conciliação: “Não achávamos que chegaríamos a um acordo”, relata. Ele representou Gimário dos Santos em caso que envolveu a compra de um carro. Morador de Taguatinga (DF), Gimário comprou o veículo de Eliesio Ferreira e o revendeu. No entanto, o terceiro dono não transferiu o nome, trazendo problemas para Eliesio, que continuou recebendo taxas, multas e acumulação de pontos na carteira de motorista. Na audiência de conciliação, as partes chegaram a um acordo e vão regularizar os documentos em cartório. Gimário comprometeu-se a arcar com os custos.
Desde que descobriu as audiências de conciliação, o supervisor industrial Pedro Barros recorre à prática. Há duas semanas, participou de mais uma audiência bem-sucedida. Ao parar numa faixa de pedestres, no fim do mês passado, o morador de São Luís (MA) teve o carro atingido por outro veículo. “No começo, o rapaz resistiu a pagar, mas entramos em acordo”, disse.
Em julho, Pedro também recorreu às audiências de conciliação para resolver uma divergência com uma loja de eletrônicos. “Compramos um aparelho de DVD, para o carro, que deu problema. Passou um mês na autorizada e voltou a quebrar no dia em que devolveram”, relata. Após audiência, a empresa devolveu o valor do produto. “Sempre que procurei a conciliação foi rápido e fui bem atendido”, observou.
Fonte: ConJur