AMAERJ | 14 de julho de 2017 17:50

Revista FÓRUM: Vitórias políticas

Foto: Raphael Gomide

AMAERJ foi determinante para barrar perda do Fundo Especial. Trabalho legislativo resulta em conquistas para toda a magistratura

POR DIEGO CARVALHO E RAPHAEL GOMIDE

Na tarde de 4 de abril, a Câmara dos Deputados se preparava para votar o relatório do PLP 343, assinado pelo deputado federal Pedro Paulo (PMDB-RJ). O texto que criaria o Regime de Recuperação Fiscal dos Estados previa o uso dos fundos especiais do Tribunal de Justiça, Ministério Público e Defensoria Pública para pagar aposentados e pensionistas. O restante dos fundos seria absorvido pelo Tesouro dos Estados. Na prática, a medida sepultava o Fundo Especial, responsável pela autonomia financeira do TJ-RJ – fator que permitiu a modernização e levou o Rio de Janeiro a ser eleito, há sete anos, o tribunal mais eficiente do país pelo Conselho Nacional de Justiça.

O Fundo cobre despesas de custeio do TJ-RJ, como luz, telefone, limpeza e informática. Retirá-lo significaria paralisar o tribunal e deixá-lo inteiramente dependente do Executivo em crise – o que, além de minar sua autonomia, tem causado permanente insegurança. O mesmo valia para MP e Defensoria.

Por coincidência ou destino, a AMAERJ agendara semanas antes para aquele dia uma inédita reunião da bancada de deputados federais do Rio com as lideranças máximas do TJ-RJ, do TRE-RJ, do MP-RJ e da Defensoria Pública.

Ao chegar em Brasília, pela manhã, a presidente da AMAERJ, Renata Gil, soube da movimentação que se acelerava para votar o texto que prejudicaria a área jurídica. Ao lado do presidente da AMB, Jayme de Oliveira, aproveitou um encontro com a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, para pedir auxílio. A ministra agendou em seguida uma audiência com o presidente da República, Michel Temer, e Renata percebeu que o movimento estava em marcha acelerada.

Após conversar com o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão – em Brasília justamente para a votação do projeto – Renata Gil tinha certeza de que tudo se encaminhava para a aprovação do texto que prejudicaria o TJ-RJ e os magistrados fluminenses. Contatou então lideranças políticas aliadas e pediu que segurassem a votação ao menos para depois da reunião promovida pela AMAERJ com os deputados do Rio para discutir os pontos relativos à área.

Ao mesmo tempo em que o encontro com mais de 20 parlamentares começava, às 19h30, em uma das salas de comissões, no plenário da Câmara o presidente Rodrigo Maia iniciava as discussões sobre o texto de Pedro Paulo. Por isso, a tensa reunião foi interrompida 15 minutos depois para os parlamentares irem ao plenário e solicitarem a suspensão da votação. Quando recomeçou, com a presença do relator Pedro Paulo, o presidente do TJ-RJ, Milton Fernandes, deixou claro o impacto devastador caso o relatório passasse como estava redigido.

“O projeto interfere no dinheiro do Fundo Especial. Essa situação nos preocupa sobremaneira”, disse Fernandes. “A proposta inviabiliza o MP”, adicionou Marfan Vieira, subprocurador-geral.

Ao lado deles, expuseram suas críticas a presidente do TRE-RJ, Jacqueline Montenegro, o procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, e o defensor-público geral, André Luís Castro. “Este projeto acaba com os Estados, é uma rendição total”, afirmou Alessandro Molon (Rede). Após conhecer a gravidade da situação, a bancada se comprometeu a se opor ao texto. Sergio Zveiter (PMDB) afirmou que o uso do Fundo quebraria “o Judiciário em dois meses”. Hugo Leal (PSB-RJ) destacou que o Fundo deveria ser preservado por uma questão de justiça. “É importante que esses recursos sejam preservados para as instituições, um direito já conquistado pelos Poderes.”

A mobilização da comunidade do Direito do Rio pela AMAERJ chamou a atenção dos deputados e os alertou para os perigos que a medida trazia para o funcionamento da Justiça. Foi também uma demonstração de união – arregimentada pela AMAERJ – do TJ-RJ, TRE-RJ, MP-RJ e Defensoria Pública.

Outros Estados além do Rio dependiam da aprovação do PLP 343, e a pressão era grande sobre os parlamentares. Mas a reunião com a bancada do Rio e com o relator, Pedro Paulo, foi o início de uma reviravolta.

Nas semanas seguintes, a peregrinação de Renata Gil aos gabinetes de parlamentares do País todo prosseguiu com intensidade, com o apoio da AMB e de outras associações. Em reunião com a presidente, Pedro Paulo se comprometeu a salvaguardar o Judiciário sem prejuízo ao projeto. Uma nota técnica da AMB apontava a inconstitucionalidade da medida, uma vez que o orçamento do Judiciário não pode ser alterado pelo Executivo ou Legislativo. A AMAERJ atuou junto aos partidos por uma emenda supressiva do artigo. O destaque foi apresentado pela bancada do PSD e, depois de inúmeros adiamentos por falta de quórum, o texto foi votado em maio.

Fundamental para a autonomia do Judiciário, o Fundo Especial foi inteiramente preservado. O plenário da Câmara aprovou, por 270 votos a 3, o destaque 23 para suprimir o uso da sobra do fundo dos tribunais pelos Estados. Uma vitória maiúscula. O próprio Pedro Paulo reconheceu publicamente que a atuação da AMAERJ foi determinante para a mudança do relatório que acabou votado e aprovado, sem o texto que prejudicava o TJ.

Este foi um exemplo da relevância do intenso trabalho que vem sendo feito nos Legislativos nacional e estadual desde fevereiro de 2016. Em meio à crise política que se instalou no País, a magistratura passou a ser o foco de uma série de projetos contra a categoria, com o objetivo de atingir a independência do Judiciário.

Para defender as prerrogativas dos juízes, a Associação passou a atuar no contato direto com deputados e senadores em um cenário de confronto entre os Poderes.

Abuso de autoridade

Em reuniões frequentes com parlamentares da Câmara e do Senado, a AMAERJ tem expressado a necessidade de preservar direitos fundamentais do Judiciário para a democracia. Além do Fundo, a atuação política da Associação no segundo trimestre ajudou a aprovar a Lei do abuso de autoridade, excluindo a possibilidade de punição por interpretação do juiz.

A proposta era uma retaliação contra a atuação firme e independente do Judiciário e do MP, demonstrada em ações em todo o País e na Operação Lava-Jato. Assim a AMAERJ e a AMB enxergaram o PLS 280/2016, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL). As associações trabalharam em conjunto contra o projeto de responsabilização de membros da magistratura e do Ministério Público por abuso de autoridade.

“Os magistrados já respondem por seus atos na forma do estatuto da magistratura. Os poderes fortes e independentes é que garantem a defesa da democracia”, disse Renata Gil, aos parlamentares, para que os juízes não fossem silenciados.

Depois do trabalho de articulação parlamentar, o relator Roberto Requião (PMDB-PR) modificou o artigo que permitia a punição de juízes por divergência na interpretação da lei, e o Plenário do Senado aprovou o texto do abuso de autoridade, por 54 votos a 19, sem o “crime de hermenêutica”. Mais uma grande conquista.

Outra vitória para o Judiciário foi na Comissão Especial da Reforma da Previdência, que rejeitou, em maio, a proposta de alteração do artigo 109 da Constituição Federal, conforme redação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 287/16, que pretendia transferir a competência da Justiça Estadual para a Federal nas causas de “acidentes de trabalho”. A AMAERJ e outras associações haviam emitido nota técnica contra a proposta. Segundo as entidades, o projeto oneraria cada vez mais para a União.

Luta continua

A AMAERJ também se opõe ao texto de Reforma da Previdência enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional. Para Renata Gil, as regras de transição não atendem ao funcionalismo público. “É uma mudança da regra do jogo no meio do jogo. As carreiras públicas estão imbuídas no espírito de convencer o governo e os parlamentares de que o texto é ruim.”

Renata participou de reunião sobre destaques e emendas aglutinativas para alterar os pontos negativos do projeto na liderança do Governo e com a AMB. Em outros encontros, as associações ressaltam aos deputados que o texto retira direitos da magistratura e demais carreiras. Para ser aprovada, a Reforma precisa de 308 votos favoráveis no plenário da Casa.

Outros dois projetos são acompanhados de perto pela AMAERJ nas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara e do Senado. O primeiro é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 505/2010, que prevê a exclusão da aposentadoria compulsória como sanção e perda do cargo a magistrados e membros do Ministério Público. A Associação trabalha para que o projeto seja rejeitado.

A relatora, deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), deu parecer contrário. “A PEC 505 viola o preceito constitucional da separação dos poderes, uma vez que a plena harmonia de poderes e a preservação do sistema de freios e contrapesos vigente na democracia, visa a assegurar a independência do Ministério Público e do Poder Judiciário, que se afigura primordial”, destaca a parlamentar.

O segundo projeto é a PEC 35/2013, que permite a participação dos juízes de primeira instância nas eleições para os cargos diretivos dos tribunais. A AMAERJ defende a aprovação da antiga bandeira da categoria por Diretas.

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