A edição de hoje (15) do jornal O Globo traz em destaque matéria sobre o Protocolo Violeta, projeto idealizado pela juíza Adriana Ramos de Mello, titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar do Rio. A iniciativa, que é finalista no Prêmio Innovare, tem objetivo de acelerar o atendimento às mulheres em situações de risco – vítimas de ameaças de maridos, companheiros e filhos – e combater o feminicídio no País. A matéria traz relatos de vítimas amparadas pelo projeto, e destaca o trabalho realizado pelos juizados especiais. O jornal destaca, também, que a juíza Adriana Ramos de Mello é hoje uma das defensoras que o crime de feminicídio seja incluído no Código Penal brasileiro.
Confira abaixo a reportagem na íntegra
Violeta: projeto do 1º Juizado de Violência Doméstica acelera atendimento em casos de maior perigo
RIO – — Quantas violetas temos hoje? — pergunta a assistente social Alcineia Gonçalves à equipe do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar do Rio de Janeiro.
— Cinco — responde alguém.
Quem olha ao redor estranha, pois não há flores. Violetas é como são chamadas ali as mulheres em situação de risco, ameaçadas gravemente por maridos, companheiros ou filhos. São todas incluídas no Protocolo Violeta, um projeto com nome de filme criado pelo 1º Juizado para acelerar o atendimento nos casos de maior perigo. Pela Lei Maria da Penha, em vigor desde setembro de 2007, um delegado, depois que uma mulher registra uma ocorrência de ameaça ou lesão corporal, por exemplo, tem 48 horas para levar o caso à Justiça. O juiz tem mais 24 horas para decidir o que fazer.
Atendimento no 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar
Com o Protocolo Violeta, a mulher pode sair da delegacia e, com uma cópia da ocorrência, ir direto para o 1º Juizado, que atende boa parte da cidade do Rio. Em no máximo quatro horas sai a decisão judicial sobre que medida deverá ser adotada para proteger aquela mulher, e a Polícia Civil é notificada para cumpri-la. O processo é sinalizado com uma tarja violeta, para que todos saibam que ali há uma história de grave risco, e todo o trâmite é acelerado. De junho de 2013 até agora, dos nove mil processos que tramitam no 1º Juizado, 530 têm a marca violeta. Da mesma cor são todas as paredes das salas usadas pelo projeto.
EM 2013, 356 MULHERES MORTAS
A novidade do Violeta é apostar que é possível dar mais velocidade às decisões judiciais em casos de risco, para combater um problema que cresce no país e no Rio: a violência contra a mulher. Em 2013, 356 mulheres foram mortas no Estado do Rio, um crescimento de 20,7% em relação a 2012, elevando um patamar que se mantivera nos três anos anteriores em, aproximadamente, 300 homicídios. Os crimes de ameaça têm registrado crescimento pequeno, mas constante, chegando a 55.218 casos em 2013. O número de mulheres vítimas de lesões corporais dolosas (intencionais) chegou a 56.377 no ano passado, com leve queda (2,9%) em relação a 2012.
O Protocolo Violeta é finalista do Prêmio Innovare, que destaca iniciativas positivas do Judiciário. A criadora do projeto, a juíza Adriana Mello, titular do 1º Juizado, inspirou-se numa experiência semelhante realizada em Barcelona, cidade onde concluirá um doutorado sobre homicídios de mulheres. A juíza é hoje uma das defensoras no Brasil da tese de que é preciso incluir no Código Penal o crime de feminicídio, o homicídio de mulheres em razão do gênero. Foi dela também a ideia da cor símbolo do projeto, o violeta, associado à espiritualidade, à paz, à compaixão e ao combate ao medo — traço comum entre as mulheres que chegam ao Juizado para contar sua história.
Muitas aparecem chorando, com marcas de espancamento. Quase todas relatam uma rotina de pequenas ou grandes violências até a agressão que motivou a ida à delegacia e, de lá, à Justiça. No Violeta, recebem atendimentos psicológico e jurídico, para saber como proceder dali em diante. E, como determina a Lei Maria da Penha, defensores públicos providenciam, se necessário for, pedidos de pensão alimentícia e guarda provisória dos filhos. Esse foi um dos principais ganhos da Lei Maria da Penha — a criação de juizados próprios para tratar casos de violência doméstica, capazes de decidir também sobre assuntos correlatos, como guarda e pensão alimentícia.
X., de 20 anos, moradora de um dos morros da Tijuca, chegou ao 1º Juizado na última quarta-feira, depois de prestar queixa na delegacia por causa de uma surra do ex-marido que a fez perder os sentidos. Ela conta que, mais uma vez, tinha ido cobrar dele ajuda para comprar fraldas para a filha de 1 ano. Na antessala do Violeta também estava Z., de 28 anos, moradora de uma favela da Zona Sul, que levou um soco do ex-marido, pai de seus três filhos. Ele foi até o trabalho de Z. para dizer que não admite o relacionamento dela com outro rapaz, pai da sua quarta filha.
Tanto X. quanto Z. pediram que os agressores sejam proibidos de chegar perto delas e dos filhos, uma das medidas de segurança previstas na Maria da Penha.
— Ainda estou com muito medo. Quem faz uma vez pode fazer de novo. Mas aqui estou aprendendo sobre meus direitos, o que ele pode e não pode fazer — diz Z.
VINTE ATENDIMENTOS
No mesmo dia em que a mulher chega ao Violeta, uma das três juízas decide qual será a medida de proteção necessária: mandar prender o agressor, afastá-lo de casa ou proibir que ele procure a vítima ou se comunique com ela por qualquer meio.
Em fins de semana e feriados, os casos são atendidos pela equipe de plantão na Central Judiciária de Abrigamento Provisório da Mulher Vítima de Violência Doméstica (Cejuvida). Em média, são 20 atendimentos semanais. O dia de maior movimento é a segunda-feira, no pós-fim de semana de brigas e bebedeiras. É quando há mais violetas à espera de socorro.
Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj