O documento final do 1º Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros sintetizou as reivindicações dos participantes do evento por mais representação dos negros na Justiça brasileira. Embora o segmento represente metade da população, ele corresponde a apenas cerca de 15% dos magistrados do país. A carta inclui uma moção pela criação de uma secretaria de igualdade racial na estrutura da AMB, entre outras medidas com o objetivo de efetivar políticas afirmativas no Judiciário, como a inclusão de avaliadores negros nas bancas de concursos para ingresso na magistratura.
Encerrado na sexta-feira (12), na véspera do aniversário da proclamação da Lei Áurea, que aboliu a escravidão no país em 1888, o encontro reuniu de forma inédita juízes, advogados, promotores e defensores públicos e militantes do movimento negro para denunciar a urgência de políticas públicas que promovam a representatividade de uma parcela da população até hoje sub-representada no Judiciário e no Estado brasileiro. O Encontro contou com a presença do desembargador do TJ-RJ Paulo Rangel.
Segundo a juíza federal, Adriana Cruz, reverter a baixa participação dos negros nas esferas de poder, mesmo após 129 anos da abolição, demanda uma postura de pró-atividade não apenas do movimento negro, mas de toda a sociedade.
“Já estamos na quinta geração pós-abolição e os números da participação negra no Judiciário e no Estado brasileiro são vergonhosos e inaceitáveis. Não podemos normalizar essa situação de só encontrar brancos em determinados postos quando a população do país é 53% negra. É uma situação anômala e não é só um problema negro, mas da sociedade brasileira”, disse a magistrada, que atua na seção da Justiça Federal do Rio de Janeiro.
O desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT15), Lorival Ferreira, lembrou que não foi fácil chegar à magistratura e manter-se na carreira. Contou que para estudar, na infância, tinha de superar todos os dias sete quilômetros entre o sítio onde morava até a escola, a pé. Mais tarde, foi alvo de preconceito no próprio local de trabalho. “Cheguei para trabalhar com meu carro e o responsável pelo estacionamento do fórum, desconfiado que eu mentira, disse à diretora do fórum que ‘um neguinho subira dizendo-se juiz substituto’”, afirmou.
Presente ao encerramento do Encontro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Ricardo Lewandowski, lembrou a resistência que a edição da norma do CNJ que estabeleceu 20% de cotas para magistrados e servidores da Justiça causou em determinados setores, por conta de um conceito “ultrapassado” de meritocracia.
“A meritocracia não pode ser apreciada de forma neutra, diante da desigualdade natural que existe entre as pessoas. O aspecto mais importante da meritocracia é substantivo, não formal, e diz respeito à igualdade de oportunidades”, afirmou.
(Com informações do CNJ e da AMAGIS-DF)