Artigos de Magistrados | 23 de abril de 2021 12:39

‘O Globo’ publica artigo de juíza e comissária sobre violência infantil

Os casos recentes de violência física e psicológica envolvendo crianças são tema do artigo “Henrys, Bernardos, Rafaéis, Isabellas e Vivianes”, escrito pela juíza Juliana Kalichsztein, ouvidora-geral do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e titular da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso de Duque de Caxias, e pela comissária de Justiça do TJ-RJ Andréa Bacos. O texto foi publicado nesta quinta-feira (22) no site do jornal “O Globo”.

Juliana e Andréa relatam que todos os dias as Varas da Infância e da Juventude são informadas sobre abusos, maus-tratos, negligências e violências cometidas contra crianças e adolescentes.

“Na maioria das vezes, as vítimas estão imersas em situação de extrema vulnerabilidade, e seus algozes são justamente aqueles que detêm o dever de proteção e cuidado, exigindo a pronta interferência do Poder Judiciário. Equipes técnicas multidisciplinares, servidores capacitados, juízes, defensores e Ministério Público unidos para que o sofrimento das vítimas seja minimizado e, especialmente, a fim de prevenir a ocorrência de dano maior.”

As profissionais frisam que as covardias cometidas no âmbito doméstico contra crianças são recorrentes e atingem famílias de todas as camadas sociais.

“Os casos noticiados causam tristeza e indignação. Promovem inquietação na sociedade, desafiam a reflexão e incentivam que suspeitas de abuso sofridas por crianças devam ser levadas, com urgência, ao conhecimento das autoridades competentes, independentemente da posição do agressor, para que não tenhamos que lamentar por outros Henrys, Bernardos, Rafaéis, Isabellas e Vivianes.”

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Confira a íntegra do artigo:

Henrys, Bernardos, Rafaéis, Isabellas e Vivianes

A violência manifesta-se de diversas formas: física, psicológica, direta ou indireta. Em geral, o agressor procura vítimas com capacidade reduzida de defesa, porque não quer correr o risco de revide com a mesma intensidade do ataque. Quando a violência é dirigida contra crianças, é sempre covardia, marca o corpo e a alma das pequenas ou, na pior das hipóteses, tira suas vidas precocemente.

Nas últimas semanas a sociedade vem acompanhando diariamente o desenrolar de mais um episódio brutal envolvendo uma criança indefesa, entre tantos os que já estamparam o noticiário do país. Henry Borel, falecido em 8 de março de 2021. Assim como os assassinatos de Isabella Nardoni (2008), Bernardo Boldrini (2014) e Rafael Winques (2020), a morte violenta do menino de 4 anos vem novamente chocar a sociedade, poucos dias após a crueldade sofrida pela juíza Viviane Vieira do Amaral na véspera do Natal passado e na frente das três filhas, crianças de tenra idade.

Chamam a atenção características semelhantes entre os casos citados, nos quais as crianças têm seu desenvolvimento sadio atingido pela violência, seja pela morte ou pelo restante da vida marcado.

Note-se que a emissão de sinais pelas vítimas não passa despercebido, desencadeando excesso de tensão ante a proximidade do agressor. Mesmo que a criança não consiga verbalizar, o corpo certamente aponta a direção do abuso. Choro, apatia, depressão, vômitos, crises de estresse, hematomas constantes, pedidos silenciosos de socorro. Precisamos estar muito atentos e agir rapidamente.

Todos os dias as Varas da Infância e da Juventude são cientificadas de abusos, maus-tratos, negligências e violências cometidas contra crianças e adolescentes. Na maioria das vezes, as vítimas estão imersas em situação de extrema vulnerabilidade, e seus algozes são justamente aqueles que detêm o dever de proteção e cuidado, exigindo a pronta interferência do Poder Judiciário.

Equipes técnicas multidisciplinares, servidores capacitados, juízes, defensores e Ministério Público unidos para que o sofrimento das vítimas seja minimizado e, especialmente, a fim de prevenir a ocorrência de dano maior.

As estatísticas do terror demonstram que as covardias cometidas no âmbito doméstico contra crianças são recorrentes e atingem famílias de todas as camadas sociais, independentemente da situação socioeconômica, da raça, ou do nível intelectual.

Lamentavelmente, o que se tem feito para a atenuação da violência contra a criança ainda parece insuficiente frente às atrocidades cotidianas. Atento à necessidade de mudanças, o legislador tenta endurecer as sanções para os autores dos abusos. Nesse sentido, a Câmara dos Deputados aprovou, em 15/04/2021, o Projeto de Lei 4626/2020, que propõe o aumento das penas para abandono de incapaz, e maus-tratos de crianças e idosos.

Os casos noticiados causam tristeza e indignação. Promovem inquietação na sociedade, desafiam a reflexão e incentivam que suspeitas de abuso sofridas por crianças devam ser levadas, com urgência, ao conhecimento das autoridades competentes, independentemente da posição do agressor, para que não tenhamos que lamentar por outros Henrys, Bernardos, Rafaéis, Isabellas e Vivianes.

Juliana Kalichsztein e Andréa Bacos | Divulgação