No discurso de encerramento de sua gestão à frente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), o desembargador Claudio de Mello Tavares afirmou que “o curto período de dois anos dedicado à gestão judiciária não nos permite soluções provisórias ou superficiais”.
“Impõe-se à alta administração, por conseguinte, a priorização da gestão e da governança; a determinação de um planejamento estratégico; a ordenação de ações objetivas e, fundamentalmente, a congregação de todos, magistrados e servidores, em torno de escopos comuns, de sorte que, sem deixar de perceber as demandas cotidianas, voltemos nossos olhos para programas que impactem o futuro da atividade judicante e a prestação de serviço à sociedade fluminense, a médio e longo prazos”, disse ele.
Mello Tavares comentou na fala os impactos da pandemia em sua administração.
“Quis o destino que o segundo ano da minha gestão se desse por meio virtual, durante uma pandemia que vem abalando o curso da nossa história, possivelmente o nosso momento mais sensível desde a 2ª Guerra Mundial. O impacto da Covid-19 se produz em múltiplas dimensões da vida: sanitária, social, econômica, fiscal e política.”
Após prestar solidariedade “às pessoas que estão sofrendo pela perda de entes queridos, do emprego, da renda ou por dificuldades em suas empresas” e “aos profissionais de saúde de todo o país, especialmente aos do Sistema Único de Saúde, os quais, com abnegação e coragem, salvam vidas em meio a essa crise humanitária”, o desembargador falou esperar que “o futuro nos encontre mais conscientes dos nossos problemas, mais solidários perante nossos irmãos e ainda mais comprometidos com os valores que fazem a grandeza das nações: justiça, igualdade de oportunidades para todos e um sentimento verdadeiro de solidariedade e de comunhão fraterna”.
Para Mello Tavares, “sem ignorar as graves consequências políticas, sociais e econômicas advindas da atual crise, é preciso seguir adiante”.
“Diante do cenário tão peculiar que estamos vivemos, debatemos como nunca sobre reinvenção. Todos já ouviram falar sobre o ‘novo normal’. Afinal, a pandemia provocada pela Covid-19 trouxe à tona a questão do distanciamento social e, com ele, mudanças profundas na estrutura das relações. Hoje, usamos como nunca ferramentas que encurtam distâncias. E vencemos lacunas que, até então, pareciam intransponíveis. Se, antes, constatávamos bolhas digitais que esfriam relações humanas, agora estamos convictos de que o digital, ao contrário, também pode unir, estreitar laços. Pode aproximar pessoas e instituições que, talvez, nunca se conectassem de outra forma; otimizar e multiplicar o tempo e, enfim, dar ainda mais transparência ao serviço jurisdicional prestado pelo nosso Tribunal.”
O desembargador destacou o fato de o TJ-RJ ter se mantido, em 2020, “em pleno funcionamento, oferecendo o devido amparo à sociedade brasileira. Graças ao trabalho desempenhado pelos seus magistrados e serventuários, atuou com independência e altivez como elemento estabilizador da ordem política, econômica e social, conferindo confiança, previsibilidade e estabilidade às relações jurídicas”.
“Os julgamentos virtuais são uma realidade cada vez mais presente nas grandes democracias do mundo, sendo propulsores de uma prestação jurisdicional mais célere, eficiente, isonômica, transparente e acessível a todos. Nada disso, todavia, reduz a relevância das sessões presenciais e o valor inerente aos julgamentos realizados por magistrados, para os jurisdicionados, com enriquecedora participação de advogados, defensores públicos, membros do Ministério Público, reunidos na mesma sala de audiências”, acrescentou.
Mello Tavares discorreu sobre suas realizações administrativas, como a convocação de cerca de 400 candidatos aprovados no concurso de 2014, para “preencher a carência decorrente da aposentadoria de mais de 600 servidores”. Também falou sobre a apresentação ao Órgão Especial da minuta do anteprojeto de lei que permitiu a progressão funcional a cada dois anos.
“No tocante à prestação jurisdicional, o Poder Judiciário Fluminense adotou diversas medidas para conferir-lhe efetividade, fazendo do Direito instrumento de transformação social. Toda e qualquer revisão de nossas estruturas organizacionais teve por escopo assegurar melhor apoio à nossa atividade-fim.”
Em combate ao crime organizado, ele citou a proposta de transformação da 25ª Vara Criminal da Capital na 1ª Vara Criminal Especializada para julgamento de processos de lavagem de dinheiro e atos praticados por organizações criminosas, inaugurada em 12 de setembro de 2019.
Para manter a Justiça em funcionamento na pandemia, a gestão Mello Tavares implantou em 16 de março de 2020 o Regime Diferenciado de Atendimento de Urgência (RDAU).
“Diversos Atos Normativos regulamentaram o funcionamento do Judiciário fluminense, orientando a população sobre as mudanças. O resultado do esforço de todos se refletiu nas estatísticas de produtividade: desde o início do RDAU, até 31 de janeiro, o TJ-RJ somou mais de 2 milhões e 900 mil sentenças, outras tantas decisões, mais de 5 milhões de despachos e de mais de 65 milhões de atos cumpridos por servidores. Uma produção que ultrapassa 75 milhões de movimentações e nos assegura que o Poder Judiciário está, permanentemente, de pé e com as mangas arregaçadas.”
(O desembargador destacou que, mais uma vez, o Relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pelo 11º ano consecutivo, concluiu que magistrados e serventuários do TJ-RJ) foram os mais produtivos do país.
“O ano de 2020 trouxe um marco especial para o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que se tornou o primeiro tribunal estadual do país a implementar o Juízo 100% Digital, método que utiliza exclusivamente os meios eletrônicos para a execução de atos processuais. Desde outubro, 13 unidades da Justiça estadual passaram a participar do projeto, um dos cinco eixos da gestão do ministro Luiz Fux como presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal.”
Para concluir o discurso, Mello Tavares afirmou que, “pela primeira vez na história, um Tribunal Especial Misto foi instalado no Estado do Rio de Janeiro para julgar o processo de impeachment de um dirigente do Poder Executivo estadual”.
“É certo que nunca mais seremos os mesmos depois desta pandemia, mas acredito que, para superar as dificuldades atuais, a visão estratégica, a paciência, a dedicação e a resiliência são ferramentas fundamentais a serem associadas às nossas atividades cotidianas. Às demandas já conhecidas somam-se novos desafios. O que se mantém perene é o compromisso de envidar todos os esforços na busca de soluções que melhor atendam os apelos sociais, a começar pelo diálogo franco e aberto com os demais Poderes e instituições. A nossa vocação é servir à sociedade. Esqueçamos os caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares, porquanto chegado o tempo da travessia, e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos. Um Judiciário forte é sinônimo de uma sociedade justa, solidária e democrática. Creio que isso seja o que todos desejam, precisam e merecem.”
Ao terminar o discurso, Mello Tavares afirmou ter buscado “exercer a presidência com o equilíbrio entre o indispensável espírito de independência em relação aos outros e o desejado espírito de humildade em relação a mim mesmo”.
“Presidir esta Corte foi um desejo, uma vocação e uma responsabilidade para a qual me preparei e à qual me dediquei de corpo e alma. Agradeço profundamente a todos os que participaram desta gestão que hoje se encerra, sobretudo aos meus auxiliares: desembargadores, juízes, servidores, agentes de segurança e terceirizados, os quais, com competência e dedicação, me ajudaram a cumprir a minha missão.”