Siro Darlan*
A Escola da Magistratura do Rio de Janeiro colocou em debate o tema da legalização das drogas no Brasil trazendo para a conferência importantes especialistas como a médica uruguaia Raquel Peyraube do Instituto de Regulação e Controle da Cannabis do Uruguai e o jornalista e advogado americano Glenn Greenwald que abordaram as experiências de legalização no país vizinho e em Portugal.
Em Portugal, uma experiência mais sedimentada, desde 2000, através da Lei 30/2000 é autorizado o porte e uso de estupefacientes e substâncias psicotrópicas em quantidade média individual durante um período de até 10 dias. A economia feita com a ausência de guerra ás drogas permite que os usuários e vítimas possam ter acesso a tratamentos espontâneos fornecidos pelo Estado, reduzindo em muito os danos provocados pela repressão tradicional.
Uma Comissão composta por profissionais de saúde e da justiça, sob segredo profissional assiste aos consumidores e orienta o tratamento necessário. Esse processo permite uma regulação das drogas pelo próprio Estado e não mais pelos traficantes violentos e corruptores. Essa mudança de mentalidade permitiu que Portugal direcionasse os recursos usados na “guerra às drogas” para o tratamento de suas vítimas, com redução das vítimas fatais e dos agentes de corrupção e do sofrimento como consequência que toda guerra acarreta.
Por outro lado quando se está em estado de guerra você precisa de armas e inimigos, já quando você trata os usuários como parceiros para combater os riscos que as drogas representam, facilita o tratamento e o diálogo. Não é mais o criminoso tratado como inimigo e sim a pessoa que precisa de ajuda.
O fato é que a guerra que se trava há 50 anos sob o pretexto de proibir o uso e comércio de drogas tem servido a interesses que não são o da sociedade civilizada e a dignidade dos seres humanos, uma vez que nunca se consumiu tantas drogas lesivas como modernamente e nunca tantas pessoas foram vítimas desse flagelo. No Rio de Janeiro só em 2014 setenta policiais foram mortos, sem falar as mortes dos chamados traficantes que parece estar justificada pelos simples fato de assim serem chamados.
Parte da mídia promotora dessa guerra suja justifica o aprisionamento dos indesejáveis, mascarados de vendedores de drogas e a violência como irmãos fardados ou não se tratam mutuamente. Isso sem falar da corrupção decorrente das relações promíscuas fomentadas por um proibicionismo inexplicável e selvagem.
A experiência do Uruguai que com sua tradição de neutralidade e sociedade pacífica resolveu ignorar os tratados conduzidos pelas nações mais poderosas que declararam essa guerra e fazer valer em seu território os verdadeiros valores e direitos humanos deve inspirar o debate e o direcionamento de pesquisas sérias na direção de uma política que salva vidas, reduz a violência legalizando e regulamentando a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas.
*Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça e coordenador Rio da Associação Juízes para a democracia
Fonte: Jornal do Brasil