O artigo “Todo poder se funda, em última instância, na força”, escrito pelo juiz João Batista Damasceno, da 1ª Vara de Órfãos e Sucessões da Capital, foi publicado na edição de hoje (15/5) do jornal O Dia. No texto, Damasceno faz críticas aos métodos adotados pela política de segurança do Rio de Janeiro nas comunidades e afirma que “ao invés de gerar segurança, paz e tranquilidade, engendra medo e terror”. De acordo com o magistrado,“A atual política de segurança no Rio afronta o Estado de Direito e retira do Estado a superioridade ética que há de nortear sua atuação, deixando-o tal como os marginais à margem da legalidade”.
Confira abaixo a íntegra do artigo:
Todo poder se funda, em última instância, na força
Todo poder se funda, em última instância, na força. É conceito elementar para quem estuda relações de poder e de Estado. Mas, no Rio, o poder público se funda na força, em primeira instância. Vídeos exibidos na TV mostram assassinatos de pessoas que deveriam ser presas, processadas e, se culpadas, condenadas, e exemplificam o modo como o Estado age nas comunidades pobres. Os casos denotam a militarização de uma política que, ao invés de gerar segurança, paz e tranquilidade, engendra medo e terror. A responsabilização dos executores daquelas mortes não implicará mudança da política de segurança e não é garantia de apuração de outras operações.
Tampouco resultaria em responsabilização dos formuladores de tal política e mandantes de tais atos. Se os métodos fossem bons e adequados, os coronéis estariam à frente das operações, ladeados pelo secretário de Segurança e pelo governador para aparição midiática. Policiais executam, mas os dirigentes do Estado é que determinam o enfrentamento que aterroriza os cidadãos nas comunidades e coloca em risco a vida dos próprios policiais.
O poder que se exerce legitimamente não se fundamenta na força, mas na crença da legitimidade de sua atuação. A autoridade legítima se exerce pelo domínio. O uso da força é a fraqueza da autoridade, pois é o meio pelo qual busca se recolocar no seu lugar de mando, ameaçado pela desobediência.
O pior legado da ditadura empresarial-militar foi a confusão entre exercício da autoridade e exercício da força, que nos legou a militarização da segurança pública. Cessada a ‘gratificação faroeste’, prêmio em dinheiro para o policial que matasse ou ferisse alguém em serviço, ainda se condecora por atos de bravura aqueles que cometem atrocidades. A atual política de segurança no Rio afronta o Estado de Direito e retira do Estado a superioridade ética que há de nortear sua atuação, deixando-o tal como os marginais à margem da legalidade.
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Além de membro da Associação Juízes para a Democracia.
Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj