Notícias | 13 de maio de 2013 12:51

JB publica artigo do desembargador Siro Darlan sobre o descumprimento do ECA

O Jornal do Brasil publicou no último sábado (11/05) o artigo do desembargador Siro Darlan intitulado “Cidadania das crianças brasileiras”. O artigo questiona o não cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente e critica a ideia da redução da maioridade penal. Segundo o texto, “crianças respeitadas, bem alimentadas, escolarizadas e bem tratadas não praticam violência contra o próximo”.

 O desembargador afirma ainda que “atribuir-se maturidade aos jovens em conflito com a lei chega às raias da irresponsabilidade quando o CNJ apurou que quase 90% desses jovens abandonaram (ou foram abandonados) pela escola e não completaram o ensino fundamental. As maiores vítimas de violência no Brasil são as crianças e adolescentes. Em 2012, segundo relatório do Disque 100 foram registrados 12 mil casos de violência contra crianças e adolescentes, enquanto, conforme dados do ISP, da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro, apenas 8% dos registros policiais se referem a adolescentes como protagonistas de violência”.

 

Leia a íntegra do artigo:

 

Cidadania das crianças brasileiras

* Siro Darlan

A dignidade da pessoa humana é um princípio presente em todas as Constituições civilizadas do mundo. Não é diferente na nossa. O Brasil é signatário da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança que define a maioridade aos 18 anos. Esse fato torna imutável o artigo 226 da Constituição do Brasil. 

Em 2010 foram assassinadas no Brasil 8.600 crianças e adolescentes, fazendo com que o Brasil ocupe a quarta posição com as maiores taxas de homicídios na faixa etária entre zero e 18 anos no ranking das nações que mais matam crianças. Não houve qualquer reação a esses números escandalosos. Bastou que um filho da classe média fosse vítima de violência praticada por um adolescente para que voltasse às manchetes a ladainha dos que desejam o aumento da população carcerária. 

O que proponho é uma agenda positiva. O Estatuto da Criança e do Adolescente deveria estar em vigor há 22 anos, e não está porque a reação desses setores da sociedade que clamam pela redução da responsabilidade penal não é a mesma diante da negação dos direitos das crianças e dos adolescentes. Crianças respeitadas, bem alimentadas, escolarizadas e bem tratadas não praticam violência contra o próximo. Que sejam respeitadas e implementadas as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente. Que sejam responsabilizados os administradores que não respeitarem a norma constitucional que determina que crianças e adolescentes devam ter precedência de atendimento nas políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos públicos. 

Atribuir-se maturidade aos jovens em conflito com a lei chega às raias da irresponsabilidade quando o CNJ apurou que quase 90% desses jovens abandonaram (ou foram abandonados) pela escola e não completaram o ensino fundamental. As maiores vítimas de violência no Brasil são as crianças e adolescentes. Em 2012, segundo relatório do Disque 100 foram registrados 12 mil casos de violência contra crianças e adolescentes, enquanto, conforme dados do ISP, da Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro, apenas 8% dos registros policiais se referem a adolescentes como protagonistas de violência. 

Interessa apenas aos negligentes administradores que não cumprem as leis que priorizam as crianças o encarceramento precoce desses jovens porque assim escondem nas masmorras as vergonhas de sua negligência administrativa. 

É falso afirmar-se que os adolescentes não são responsabilizados pelos atos infracionais que cometem. Segundo o CNJ, existem 15 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas no Brasil, e essas medidas vão, segundo a gravidade dos atos cometidos, de advertência a internação (prisão), o que pode variar em até três anos. Ora, numa fase de plena energia, o enclausuramento de um jovem por um período tão longo chega a ser mais gravoso do que a pena máxima de um adulto. 

Levando-se em conta que a finalidade da pena deve ser a reabilitação, a reforma, a correição, visando o retorno à sociedade como um membro produtivo e reintegrado, o grande infrator, mais uma vez, é o Estado brasileiro, uma vez que não cumpre as normas legais que impõem que as unidades socioeducativas devam, em obediência aos princípios constitucionais da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, privá-los da liberdade, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física, e gravidade da infração, e nenhuma das unidades de cumprimento de medidas no Brasil cumpre a lei. 

A lei obriga ainda que os jovens em conflito com a lei e em cumprimento da medida de internação devem permanecer em unidades que ofereçam instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança, além de propiciar escolarização e profissionalização, atividades culturais, esportivas e de lazer; preservar a identidade em ambiente de respeito e dignidade, em pequenas unidades com grupos reduzidos. Nada disso é cumprido por nenhum estado da Federação e, mais grave, o CNJ constatou abusos sexuais de adolescentes, pelo menos 19 mortes foram registradas nas unidades, 28% tinham sofrido agressões de funcionários. Em pelo menos 11 estados as unidades operam acima da sua capacidade.

* Siro Darlan Oliveira, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, é membro da Associação Juízes para a democracia.

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Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj