* Peterson Barroso Simão
Ao seguir seu próprio conselho – “Nunca ande por trilhas, pois assim só irá até onde os outros já foram” – o escocês Graham Bell deu enorme contribuição à humanidade, aprimorando o instrumento de comunicação conhecido por telefone.
Lembro-me da minha infância em Santo Antônio de Pádua, no noroeste fluminense, quando o rio afluente de cidade próxima começava a transbordar, prenunciando uma enchente e o Rio Pomba receberia grandes consequências do que iria acontecer horas depois. Através de alguns telefonemas, dava tempo de todos se prevenirem e os efeitos devastadores ficavam bastante reduzidos.
Nas reportagens sobre a tragédia ocorrida em Mariana, cidade histórica de Minas Gerais, algo semelhante se sucedeu.
Quando iniciou o desastre ambiental de enormes proporções, uma pessoa teve a sabedoria de telefonar para o povoado que seria atingido duas horas depois pelo lamaçal com entulhos. Também uma senhora, conduzindo uma motocicleta, foi avisando a todos sobre o que estava prestes a ocorrer. O caminhoneiro providenciou o transporte.
Não foi o suficiente para salvar todos, mas creio que salvou muitos.
Independente das responsabilidades cíveis, criminais e administrativas que serão apuradas, conforme impõe a Constituição da República (art.225, §3º), a verdade é que, muitos anos passarão até que a Natureza seja restabelecida na trajetória da devastação que ainda continua correndo por diversas cidades.
A população, que já sofre com a crise econômica, agora tem esta catástrofe para enfrentar e superar. Os efeitos colaterais são gigantescos, quer na visão do dano ecológico, quer sob o ângulo social, habitacional, de desabastecimento de água e saúde pública.
Cabem à União, aos Estados e aos Municípios, através das respectivas autoridades tomarem providências rápidas, enérgicas, para a restauração ecológica do lugar. Nessa hora, a reunião de todos é muito importante, tal como a solidariedade e a humanidade mostradas por aqueles ilustres desconhecidos que, a tempo, evitaram o pior.
Em casos de desastres, deve-se em primeiro lugar prestar socorro imediato às vítimas. Todavia, em razão da dimensão do dano ambiental causado, o Município afetado fica com sua estrutura administrativa completamente comprometida, o que inviabiliza um atendimento eficaz. Surge então a necessidade de contratações urgentes, sendo inclusive dispensável licitação pública (art.24, IV, Lei 8.666/93).
A situação justifica a decretação de “emergência administrativa” a ser editada pelo Poder Executivo. Embora célere, deve respeitar a legalidade com contratação regular de pessoal, empresas e compra de materiais, justamente para que amanhã não se alegue a improbidade administrativa (Lei 8.429/92). A Justiça, a moralidade, a dignidade e os direitos da cidadania estarão presentes no decorrer deste longo processo de restauração.
É preciso extrair a experiência deste sofrimento e fazer séria fiscalização em todas as barragens do País (mais de seiscentas), usinas e similares, pois a prevenção é sempre essencial. O mar de lama que se transformou o inocente “Rio-Mãe” deve servir de lição e alerta máximo em época de chuvas.
Aos importantes patriotas que não os conheço, mas os admiro pelas atitudes que salvaram vidas, fica registrado o agradecimento.
(*) Peterson Barroso Simão é desembargador da 3ª Câmara Cível do TJ-RJ
Fonte: TJ-RJ