A magistrada Yedda Filizzola, em artigo publicado nesta segunda-feira (15) no site do jornal “O Estado de S. Paulo”, critica o PLC 94/2018, aprovado pelo Congresso Nacional e à espera da sanção presidencial.
Para a juíza titular do 4º Juizado da Violência Domestica e Familiar Contra a Mulher do TJ-RJ e diretora do Departamento de Segurança dos Magistrados da AMAERJ, “a grande maioria” dos projetos que propõem ao Congresso alterações na Lei Maria da Penha “não foi elaborada com a cautela e o estudo adequados”.
“Um deles é o PLC 94/2018”, sustenta Yedda Filizzola. Leia abaixo o artigo:
Da inconstitucionalidade do PLC 94/2018
Há no Congresso Nacional diversos projetos de lei no qual se pretende modificação da Lei Maria da Penha. Todos, em tese, objetivam beneficiar as mulheres. Contudo, a grande maioria destes projetos não foi elaborada com a cautela e o estudo adequados. Um deles é o PLC 94/2018, aprovado pelo Congresso e que aguarda sanção presidencial.
Por este projeto, cria-se a obrigatoriedade da determinação de afastamento do lar do homem quando houver risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher.
A primeira crítica é à pretensão quase premonitória de se saber quando há risco atual ou iminente. Não se trata de uma situação de legitima defesa, por exemplo, quando os fatos são instantâneos, imediatos. Ao contrário, estamos tratando de uma situação reportada ao juízo ou à polícia, no qual a vítima (ou terceiro) afirma haver certa probabilidade dela, ou seus dependentes, ser vítima de violência física.
A segunda crítica é à solução dada para a gravíssima situação apresentada: informa-se, por exemplo, que um homem está em vias de agredir sua companheira, não se conforma com a intenção dela de encerrar o relacionamento e, digamos, já adquiriu uma arma de fogo.
Pois bem, se há indícios de que o iminente agressor é pessoa deveras violenta, razão pela qual se exige a imediata intervenção estatal, por que não se requer a prisão preventiva do indiciado nos termos do artigo 313 III, c/c 312: prisão preventiva para a proteção da vítima, como garantia da execução da proibição de aproximação?
A questão é se o simples afastamento do lar, qual seja, a retirada do homem do seu domicilio e a consequente proibição de reingresso, não é medida suficiente para garantir a segurança da vítima em uma situação extrema.
A terceira e mais veemente critica se dá em razão da violação do princípio da reserva de jurisdição. Ao delegado de polícia não é dado decidir sobre concessão de medidas processuais assecuratórias – e muito menos ao policial militar. Trata-se de evidente inconstitucionalidade material do projeto de lei, razão pela qual deve ser ele integralmente vetado.
As gambiarras legislativas sempre geram prejuízos aos cidadãos.
Há que se reconhecer a necessidade de maior efetividade na prestação jurisdicional, inclusive com relação à proteção às vítimas. Contudo, não se pode negociar com os mais caros valores do Estado Democrático de Direito.
Jurisdição é prestada pelo Poder Judiciário.
À Polícia Militar está reservado o exercício de fundamental função de preservação da ordem pública e garantia da segurança de todos. À Polícia Civil, de investigação das infrações penais. Se tais funções forem bem prestadas, se houver um excelente procedimento investigatório e um excelente serviço de segurança preventiva, as mulheres estarão mais protegidas.
Leia o que é o PLC 94/2018
“Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida:
I – pela autoridade judicial;
II – pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou
III – pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia.
§ 1.º Nas hipóteses dos incisos II e III do caput deste artigo, o juiz será comunicado no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas e decidirá, em igual prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida aplicada, devendo dar ciência ao Ministério Público concomitantemente.
§ 2.º Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso.
Art. 3.º A Lei n.º 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), passa a vigorar acrescida do seguinte art. 38-A:
Art. 38-A. O juiz competente providenciará o registro da medida protetiva de urgência. Parágrafo único. As medidas protetivas de urgência serão registradas em banco de dados mantido e regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça, garantido o acesso do Ministério Público, da Defensoria Pública e dos órgãos de segurança pública e de assistência social, com vistas à fiscalização e à efetividade das medidas protetivas.”