Notícias | 20 de março de 2015 08:55

Conciliação e arbitragem para desafogar a Justiça

Até a Constituição de 1988 o Brasil tinha um acréscimo de 350 mil processos/ano no sistema judicial do país. Já em 2015, decorridos 27 anos, o estoque de processos em tramitação no país é de 100 milhões. A informação é do presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, acrescentando que desse total, o Judiciário fluminense responde por 10 milhões.

De acordo com o desembargador, a Justiça estadual só conta com 850 juízes e desembargadores, o que dá uma média superior a 11.700 processos para cada magistrado. “Nós não podemos, com os nossos meios comuns, dar conta disso, porque a demanda cresce em progressão geométrica, e os meios da estrutura crescem em progressão aritmética, quando crescem. Então, nós temos inúmeros problemas e só vamos superá-los com a utilização dos chamados meios alternativos, mecanismos paralelos à jurisdição (conciliação, mediação e arbitragem)”, ressalta, ao enfatizar que esses meios podem impedir a abertura de novos processos.

“A demanda não diminui. Só aumenta. Então, nós temos esses chamados meios alternativos para tentar impedir que se abra mais processos”, salienta, lembrando das Câmaras de Conciliação. “O Judiciário vai continuar a se valer por muito tempo do processo judicial e os meios por excelência, mas esses meios alternativos de arbitragem, conciliação e mediação evitam a entrada de novos processos”, garante em entrevista exclusiva ao MONITOR MERCANTIL.

Carrossel holandês

Luiz Fernando faz uma comparação da atuação da Justiça com o futebol ao lembrar a seleção holandesa de 1974, o chamado “carrossel holandês”, em que os jogadores atuavam em todas as partes do campo, durante todo o tempo, sem posições fixas.

“Eu comparo com essa demanda judicial. Só não pode jogar aquela posição fixa, que é o processo judicial. Você tem que jogar com os meios alternativos também. Ocupar o tempo todo, com todos os jogadores. E como o Judiciário hoje cresceu muito, a Constituição de 1988 lhe deu outras tarefas, principalmente em garantir a democracia”, explica, salientando que o Judiciário não é só para julgar conflitos entre particulares, na medida em hoje julga conflitos de direito público entre poderes.

Carência

Quanto à carência de magistrados, o desembargador admite que essa falta existe há anos, pois os concursos não conseguem preencher as vagas. Atualmente, segundo ele, há cerca de 180 vagas para juízes no cargo inicial. Essa carência ocorre em virtude do longo tempo para se realizar a seleção, pois é necessário a publicação de edital, inscrições, escolha de banca examinadora, entre outros pontos.

“Tem diversas fases até a realização das provas: objetivas, escritas, orais e as de títulos. Tudo isso pode demorar cerca de seis meses a um ano. No último (concurso) aprovamos 35 juízes. Nós vemos que a defasagem vai aumentando, até porque no prazo de duração do concurso alguns juízes se aposentam. Com isso, aumenta ainda mais o número de vagas.”

Mais que nos EUA

O desembargador Luiz Fernando disse ainda que um outro complicador é a formação dos candidatos. Muitos, segundo ele, não sabem formular um pensamento com uma frase razoável, com começo meio e fim. As faculdades, diz, são massificadas. E acrescentou: o Brasil é o país que tem mais faculdades de Direito do mundo, superando os Estados Unidos, país maior que o Brasil em território e em população.

Grande parte das faculdades de Direito, segundo ele, não possui ensino de boa qualidade para colocar um candidato em condições de fazer um concurso para a Magistratura. Por isso, diz, surgiram as Escolas Judiciais, que têm se dedicar ao aprimoramento dos juízes, sua vocação, e também preparar os candidatos para o concurso. “É como se fosse uma segunda faculdade, porque a inicial não o preparou.”

“Entre a ausência do juiz ou um outro despreparado, não se sabe muito bem o que é pior. Às vezes, o juiz despreparado é pior porque coloca em risco o direito das pessoas que ele está julgando.”

Mais concursos

O desembargador promete que pretende fazer concursos como forma de reduzir ao máximo a carência de magistrados. No entanto, ressalta que Responsabilidade Fiscal é complicador que não pode ser ignorado, na medida em estabelece para o Judiciário 6% da receita líquida corrente do Estado e estabelece 5,7% de limite prudencial.

“Esse limite prudencial é para deixar qualquer um apavorado, porque estabelece o seguinte: chegou ao limite de gastos com pessoal de 5,7%, trava qualquer despesa de pessoal. Não se pode contratar ou nomear ninguém. Não se pode fazer concurso. Então, é um conjunto de circunstâncias que complicam.”

Novo CPC

Luiz Fernando de Carvalho faz questão de ressaltar um outro ponto do novo Código de Processo Civil, sancionado esta semana pela presidente Dilma Rousseff, que é o julgamento de processos mais antigos na frente dos mais novos, determinação que considera desejável, em princípio, uma vez que admite exceções. Explica, por exemplo, que um processo que tramita há cinco anos é julgado na frente de um outro que só está tramitando há um mês.

 

“É normal que o processo mais antigo seja julgado primeiro. A cronologia é um critério razoável. Agora, vou dar um exemplo contrário: ter esse mesmo processo de cinco anos e entra um outro processo como medida para garantir uma internação de sobrevivência do paciente. Aí, você vai julgar o mais antigo na frente, e o paciente morre. Então, há medidas de urgências, e o Código de Processo Civil não impede que essas questões de urgência sejam absolutamente prioritárias. Então temos duas regras, uma geral e razoável, que é o processo mais antigo e outra, de urgência, nos caos de direito à vida.”

O presidente do TJ-RJ faz questão de frisar que a súmula vinculante também irá ajudar no andamento dos processos, pois representará um norte, trazendo uma regra. Na sua opinião, , se outro processo tiver os mesmos elementos ou for igual, a súmula é aplicada, e aí o processo termina mais rapidamente. Como também os recursos repetitivos, “aquele que foi julgado 100 vezes”, razão pela qual considera que a celeridade tem uma regra, “que é o direito fundamental de duração razoável do processo. Aplicaremos isso aos casos mais urgentes e também aos mais antigos.”

 

Fonte: Monitor Mercantil