O temor pela afronta aos direitos humanos no Afeganistão e pela segurança das 270 magistradas que pediram asilo humanitário ao governo movimentam o Poder Judiciário brasileiro. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) informou que as juízas que obtiverem o asilo poderão continuar atuando na Magistratura. A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) reforçou sua defesa das magistradas ao reunir-se no Ministério das Relações Exteriores para tratar da retirada das afegãs de Cabul.
A atuação das magistradas asiladas se dará por meio do Programa Visão Global do Poder Judiciário, instituído pela Resolução CNJ 411/2021, em que magistrados de outros países podem exercer serviço voluntário no Brasil, visando a cooperação internacional e o estímulo à troca de informações. A informação foi transmitida nesta terça-feira (31) por meio de carta pelo presidente do CNJ e do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, ao diplomata Carlos Alberto Franco França, ministro das Relações Exteriores.
Também nesta terça (31), a presidente da AMB, Renata Gil, foi recebida pelo embaixador Fernando Simas, secretário-geral do ministério. A magistrada entregou ofício em que solicita a edição de uma portaria entre o Itamaraty e o Ministério da Justiça e Segurança Pública para auxiliar na retirada urgente de Cabul (capital do Afeganistão) das 270 juízas e de seus parentes.
A entidade tem agido em amparo às magistradas afegãs. Além de articular-se com a UIM (União Internacional de Magistrados) e outras entidades jurídicas, a presidente já se reuniu com o deputado Aécio Neves (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, e encaminhou ofício ao presidente do STF e do CNJ. A AMB também tem reivindicado a concessão imediata de vistos humanitários ou especiais, por meio da Embaixada do Brasil no Paquistão.
“Toda a nossa concentração de esforços foi para trazê-las com suas famílias antes que algo de mal pudesse acontecer. Nós temos a notícia de duas juízas assassinadas. Queremos agora, de forma bastante rápida, obter os vistos humanitários para que elas cheguem ao Brasil”, relatou Renata Gil.
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Ascensão do Talibã e guinada autoritária
O anúncio em abril da retirada das tropas dos Estados Unidos após 20 anos de guerra e ocupação, foi o estopim para o fortalecimento do grupo fundamentalista Talibã no Afeganistão. Em poucos meses, o grupo retomou o controle de províncias importantes e, em 15 de agosto, ocupou Cabul.
As 270 magistradas afegãs que pediram asilo estão escondidas em casas de amigas. Em carta à Associação Brasileira de Juízas, cem integrantes da associação afegã afirmam ter recebido recados de que correm risco de vida.
As ações do Talibã em relação aos direitos das mulheres ainda não estão claras. No último domingo (29), o governo informou que mulheres terão acesso ao ensino superior, mas as salas mistas estão proibidas pelo Sharia, conjunto de normas islâmicas.
A mudança de atitude é vista com ceticismo, pois, quando o Talibã governou o país, de 1996 a 2001, mulheres e meninas foram impedidas de trabalhar e estudar. Os direitos à liberdade de movimento e expressão pessoal também eram infringidos, além de diversas outras violações de normas internacionais de direitos humanos.