AMAERJ | 29 de março de 2017 12:33

Associações emitem nota técnica contra PEC que transfere competência para a Justiça Federal

As associações dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (AMAERJ), do Paraná (AMAPAR), Minas Gerais (AMAGIS), Tocantins (ASMETO), Mato Grosso do Sul (AMAMSUL), Mato Grosso (AMAM) e Rondônia (AMERON) emitiram nota técnica, nesta quarta-feira (29), contra a Proposta de Emenda à Constituição que transfere a competência da Justiça Estadual para a Federal nas causas de “acidentes de trabalho”. Para as entidades, a alteração impõe ônus cada vez maior para a União.

“Não parece razoável ou conveniente a alteração de competência constitucional que acarretará, cada vez mais, o agigantamento da máquina da Justiça Federal. Se os Estados da Federação já possuem instalados nas centenas de milhares de comarcas existentes no Brasil, não faz sentido promover-se a ampliação da Justiça Federal com sobreposição de estruturas”, diz a nota técnica.

Leia abaixo a íntegra da nota:

NOTA TÉCNICA

A Associação dos Magistrados do Paraná – AMAPAR, Associação dos Magistrados Mineiros – AMAGIS, Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro – AMAERJ, Associação dos Magistrados do Estado do Tocantins – ASMETO, Associação dos Magistrados do Mato Grosso do Sul – AMAMSUL, Associação Mato-grossense de Magistrados – AMAM, Associação dos Magistrados do Estado de Rondônia – AMERON, vêm, respeitosamente, a presença de Vossas Excelências, apresentar nota técnica referente à PEC 287/2016, “no tocante à alteração do art. 109 da Constituição Federal, para dispor sobre a competência da justiça federal para o julgamento de ações decorrentes de acidentes de trabalho em que a União, entidades autárquicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista federal forem interessadas”.

Preocupa as Associações signatárias a mudança pretendida pela PEC, porque, como parece óbvio, ao promover a ampliação da competência da Justiça Federal  —  e de maneira expressiva  —  com o deslocamento de competência atualmente detida pela Justiça dos Estados, acarretará um aumento igualmente expressivo da estrutura da Justiça Federal (em edificações, instalações e pessoal), com o incremento de gastos absolutamente desnecessários, em oposição manifesta ao “movimento” do Estado brasileiro de contenção de gastos (EC n. 95 é exemplo) e melhora da eficiência da máquina existente.

I – Não parece razoável ou conveniente a alteração de competência constitucional que acarretará, cada vez mais, o agigantamento da máquina da Justiça Federal e a imposição de ônus cada vez maior para a União

Visa a PEC 287/2016, basicamente, transferir da competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal, as causas de “acidentes de trabalho” que atualmente estão expressamente afastadas da competência da Justiça Federal.

O texto atual do inciso I do art. 109 da CF dispõe o seguinte:

“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I – as causas em que a União, entidade autárquica, empresa pública federal ou sociedade de economia mista federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

Na proposta legislativa o texto do inciso I do art. 109 passará a ser o seguinte:

“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I – as causas em que a União, entidade autárquica, empresa pública federal ou sociedade de economia mista federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, inclusive nas decorrentes de acidentes de trabalho, exceto as de falência e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

É dizer: as causas em que a União, entidade autárquica, empresa pública federal ou sociedade de economia mista federal forem interessadas INCLUSIVE as decorrentes de acidentes de trabalho, deixarão de ser da competência da Justiça Estadual e passarão a ser da competência da Justiça Federal.

Vale ressaltar que no parecer oferecido no Senado Federal à PEC 127/2015, consta a informação de que, com essa proposta, promover-se-á a “centralização” na Justiça Federal de “todas as demandas concernentes à concessão ou revisão de benefícios previdenciários, o que deverá implicar maior celeridade na tramitação dessas causas”.

Com a ressalva do devido respeito a eventual concentração das demandas pertinentes à concessão ou revisão de benefícios previdenciários na Justiça Federal ou na Justiça Estadual não tem como dar causa à uma maior celeridade ou morosidade nesses causas. Não há, efetivamente, relação de causa e efeito.

Aliás, a Justiça Federal encontra-se absolutamente engessada e incapaz de atender até mesmo a atual demanda de feitos atribuídos à sua competência.

Tanto é assim que a Justiça Federal lutou, e continua lutando, pela ampliação do número de Tribunais Regionais Federais, para atender à demanda dos feitos que são, atualmente, da sua competência.

E, na parte que toca aos Juizados Especiais, encontram-se os mesmos igualmente abarrotados de feitos, tanto assim que já passaram a ser qualificados como o “fracasso do sucesso”, decorrente do fato de estar sofrendo com uma “corrida” de jurisdicionados  —  que antes sequer procuravam o Poder Judiciário  —  sem ter capacidade de oferecer a devida prestação jurisdicional.

Acresce que a recente EC n. 95 constitucionalizou um engessamento do orçamento do Poder Judiciário da União por 20 anos.

Por meio da referida emenda constitucional o Poder Judiciário da União restou SEM POSSIBILIDADE de AMPLIAÇÃO, pelos próximos 20 anos, do orçamento da Justiça Federal.

Então, não parece possível promover-se qualquer movimento legislativo destinado a ampliação das competências da Justiça Federal, diante da certeza de que NÃO haverá aumento do seu orçamento pelos próximos 20 anos, mas apenas mera atualização do valor.

Não é só.

O agigantamento da máquina da Justiça Federal não parece se ajustar ao próprio conceito da Federação, porque toma por premissa a necessidade de promover-se uma capilarização dos órgãos da Justiça Federal, que somente pode ser compreendida sob a ótica de que a União precisa estar presente em cada rincão ou comarca do País.

Historicamente a Justiça Federal foi concebida para estar sediada apenas nas capitais dos Estados da Federação, constituindo a exceção a criação de seções judiciárias.

A ampliação da Justiça Federal, no sentido da criação de novas seções judiciárias, inverte a lógica do Estado Federado para impor a lógica do Estado Unitário, em flagrante violação do princípio federativo.

Se os Estados da Federação já possuem instalados nas centenas de milhares de comarcas existentes no Brasil, sedes do Poder Judiciário, com a presença de Juízes Togados, que constitucionalmente possuem competência para processar e julgar os feitos que seriam da competência da Justiça Federal (a competência delegada) não faz sentido promover-se a ampliação da Justiça Federal com sobreposição de estruturas.

Ademais, diante da ampliação e reafirmação do conceito de que o Poder Judiciário  —  ao contrário dos demais Poderes  —  possui caráter nacional e unitário, não faz igualmente sentido a ampliação estrutural e material da Justiça Federal para atuar onde os Juízes Estaduais já estão atuando e exercendo a competência delegada.

A ampliação da Justiça Federal, salvo melhor juízo, parece ter a marca do “custo Brasil”, ao pretender a atribuição de determinada competência atualmente destinada à Justiça Estadual, para a Justiça Federal, de sorte a exigir a ampliação desta com inegável aumento de custos.

No Estudo do CNJ sobre o impacto que teria a extinção da competência delegada (da Justiça Federal para a Justiça Estadual) apontou-se, por exemplo, para a situação de São Paulo, que viria a ter DUPLICADO o número de processos tramitando na Justiça Federal:

Quanto ao número de processos em tramitação (gráfico 11), destaca-se novamente o caso do TJSP, uma vez que cada vara federal passaria a ter, em média, o dobro de processos em tramitação, o que significaria mais de 18 mil processos, em média, caso houvesse o retorno à jurisdição federal das ações processadas na justiça estadual em razão da competência delegada. Outros dois estados que se destacam são Tocantins e Minas Gerais, com aumento em média de quatro mil e três mil processos, respectivamente, em cada vara federal. (Capitulo 4.3, pg. 29)

Ora, não se pode cogitar da duplicação do número de processos sem provocar, ou a insuficiência da prestação jurisdicional ou a necessidade de ampliação da máquina da Justiça Federal.

Finalmente, diante do fato incontroverso e insuperável, do engessamento do orçamento da Justiça Federal por 20 anos, revela-se manifestamente inviável qualquer movimento legislativo destinado a ampliar a competência desta, de sorte a exigir, como consequência, o aumento do seu orçamento.

II – Conclusão

As presentes considerações estão a merecer a atenção e reflexão do Poder Legislativo, porque a PEC 287/2016 se mostra em contradição com a Emenda Constitucional n. 95, recentemente promulgada pelo Congresso Nacional.

 

Associação dos Magistrados do Paraná – AMAPAR

Frederico Mendes Junior

Presidente

 

Associação dos Magistrados Mineiros – AMAGIS

Maurício Torres Soares

Presidente

 

Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro – AMAERJ

Renata Gil de Alcantara Videira

Presidente

 

Associação dos Magistrados do Estado do Tocantins – ASMETO

Julianne Freire Marque

Presidente

 

Associação dos Magistrados do Mato Grosso do Sul – AMAMSUL

Fernando Chemin Cury

Presidente

 

Associação Mato-grossense de Magistrados – AMAM

José Arimatea Neves Costa

Presidente

 

Associação dos Magistrados do Estado de Rondônia – AMERON

Alexandre Miguel

Presidente