* O Globo
Raupp admite que partido está revendo posição; Gilmar critica efeito cascata
A declaração do presidente Michel Temer, em entrevista ao GLOBO, contra a aprovação do aumento dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reforçou ontem o movimento contrário à concessão do reajuste. Os senadores do PMDB, partido de Temer, que eram defensores do aumento, já acenam com um recuo e demonstram que não veem mais o reajuste como um assunto decidido. Ainda assim, aliados do DEM e do PSDB cobrarão dos peemedebistas, a partir de hoje, uma posição firme contra o aumento.
O Palácio do Planalto repassou ao presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR), a missão de fazer um mapeamento dentro do partido e de tentar enquadrar a bancada. Nos bastidores, ministros de Temer dizem que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o líder do partido no Senado, Eunício Oliveira (CE), já entenderam que não é o momento para essa concessão.
Defensor do aumento, o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) já mudou ontem sua postura. Ele havia apresentado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) um voto em separado a favor do reajuste, para se contrapor ao parecer do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), contrário ao aumento.
— Acho que isso (de mudar de posição) já está sendo analisado. Se for um entendimento da maioria, do presidente, é uma questão a ser analisada. Eu estava defendendo o aumento em termos de haver um acordo sobre isso — disse Raupp.
Renan e Eunício eram os maiores aliados do atual presidente do STF, Ricardo Lewandowski, na campanha pelo aumento, mas queriam aprová-lo antes da mudança de comando no STF, que ocorre hoje, mas não conseguiram. A avaliação no Planalto é que a oposição ao reajuste cresce e que a conjuntura muda com a transição de poder no STF. A ministra Cármen Lúcia assume hoje como presidente do tribunal. Lewandowski é o grande defensor do reajuste dos vencimentos dos ministros para R$ 39,2 mil a partir de 2017.
Cármen Lúcia não vê com simpatia o reajuste e não está sozinha no STF. Seu colega Gilmar Mendes, que é contra o aumento por causa do efeito cascata, disse que o vencimento dos ministros virou “bucha de canhão” de uma situação que mostra distorções nas remunerações das Justiças estaduais e no Ministério Público.
— Estamos sendo vítimas de um processo de desgaste. Não faz sentido fazer esse aumento com as práticas que estão aí. Hoje, criou-se uma escadinha e também para as Justiças estaduais. É o momento de se fazer um ajuste (no efeito cascata). O vencimento do Supremo é o teto, não pode estar nessa escada — disse Gilmar, perguntado se a polêmica do reajuste era um bode expiatório.
— Sim, sendo usado (o reajuste) como bode expiatório. Está sendo usado como bucha de canhão — completou o ministro.
A postura de Temer reforçou ontem as críticas de senadores, em especial do PSDB e do DEM, ao fato de ser inadequado aprovar o reajuste, já que o vencimento dos ministros do Supremo é o teto do funcionalismo da União e que terá impacto nas contas públicas dos estados. Na entrevista publicada ontem pelo GLOBO, Temer disse que o aumento geraria “uma cascata gravíssima”, e que governadores o procuraram pedindo “pelo amor de Deus” para que não permitisse isso.
— Jucá ficou com a missão de fazer uma conversa preliminar, uma DR (discutir a relação) no partido e agir, se for necessário. O contexto mudou desde a semana passada — disse um interlocutor de Temer.
Mas o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), duvida da mudança de postura do PMDB.
— Aplaudo a declaração do presidente Temer. Mas ele tem que combinar com Renan, Eunício, que apresentou o pedido de urgência — disse.
PARA RELATOR, TEMER LIQUIDOU ASSUNTO
Eunício Oliveira já falava na semana passada que não faria um “cavalo de batalha” sobre o assunto. E Renan mudara o discurso na quinta-feira, quando não conseguiu aprovar a urgência. Ele defendeu a revisão do princípio constitucional que transforma os vencimentos do STF no teto salarial do funcionalismo público federal. O projeto de aumento dos vencimentos dos ministros da Corte para R$ 39,2 mil em 2017 está na pauta do Senado. Ele disse que, diante das divergências, era o momento de se “rediscutir” o fato de os subsídios serem o teto devido ao impacto nas demais carreiras.
A primeira mudança no comportamento de Renan ocorreu no final da sessão do Senado da última quinta-feira, quando ele e Jucá retiraram de votação o pedido para votar o reajuste em regime de urgência, que tinha sido apresentado por Eunício Oliveira. Não havia clima para isso. Relator do projeto na CAE, Ferraço disse que a declaração de Temer coloca uma “pá de cal” nesse assunto.
— O presidente Temer deixar claro que é contra esse aumento é um tiro de misericórdia, uma pá de cal nessa proposta. Pelo impacto que tem, essa proposta não pode ser aprovada. E Temer deixa claro que a base precisa seguir sua orientação, principalmente o PMDB — disse Ferraço.
Para o senador Agripino Maia (RN), o posicionamento claro de Temer deve influenciar o Senado.
— Ele (Temer) ainda não tinha se manifestado com a devida ênfase, mostrando as consequências. Ninguém é contra, o problema é o momento.
Líder do governo no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) disse que é importante Temer deixar clara sua posição para reforçar no Senado a disposição de não aprovar essa proposta. Aloysio e Ferraço sempre foram contra o aumento.
— No Senado, não existe a disposição de aprovar aumento. Todos os líderes encaminharam contra, e o Jucá falou como líder. A declaração do presidente Temer só reforça isso — disse Aloysio.
Fonte: O Globo