* Siro Darlan
Ao procurar receber herança que lhe era devida em terras brasileiras, um solitário professor de música alemão tem sua joia, uma partitura original de Johan Sebastian Bach, roubada por dois jovens irmãos órfãos. Desolado, o professor Marten conhece Candido, que o ajuda a encontrar os autores do roubo, adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa.
Encantado com os jovens, o professor resolve ensinar os meninos a tocar instrumentos e forma uma pequena orquestra. Esse gesto de acolhimento ajuda na mudança dos jovens, que retribuem com carinho e a devolução dos objetos roubados, inclusive a preciosa partitura. Essa é a história do filme ‘Os filhos de Bach’, rico em sensibilidade e exemplo de como devem ser tratados os jovens em conflito coma a lei e as fórmulas, que dão certo, para seu pronto processo de recuperação.
Interessante ainda por se tratar de uma coprodução germânico-brasileira. A Alemanha, com seu recente passado de violência contra a humanidade e de discriminação racial que gerou o nazismo e a Segunda Guerra Mundial, apresenta um presente rico em exemplos de solidariedade com o acolhimento de refugiados de várias nações. E o Brasil, exemplo de miscigenação e criação de gente multirracial, que se apresenta com políticas discriminatórias nunca antes imagináveis, impedindo que crianças e adolescentes frequentem as praias da Zona Sul.
A política preconceituosa de fazer barreiras policiais para verificação prévia das intenções de jovens da periferia por meio de ingresso de policiais nos ônibus que vêm dos subúrbios e as declarações das autoridades de que não podem ir à praia sem documentos e dinheiro afrontam todos os princípios básicos de qualquer democracia e insulta a própria história de formação do povo brasileiro.
Ensaios estão sendo feito de políticas inclusivas com a construção do Parque Madureira, onde são criados espaços de lazer para parte da população. Mas não se pode impedir que o povo de Madureira frequente Ipanema, assim como é desejável que o povo de Ipanema frequente o Parque Madureira. Essa interpenetração que une e acolhe toda gente e que é a tradição do povo brasileiro não pode ser afrontada por política de insegurança baseada em práticas nazistas e separatistas.
Siro Darlan é desembargador do TJ e membro da Associação Juizes para a Democracia
Fonte: O Dia