*O Globo
As mortes de Letícia Dias, em Niterói, e Sarah Jersey Nazareth Pereira, no Rio, nesta terça (26), pelos ex-namorados evidenciam a escalada de violência contra a mulher. Com elas, em apenas duas semanas, pelo menos cinco mulheres morreram vítimas de feminicídio na Região Metropolitana do Rio. De 11 a 26 de julho, os crimes noticiados apurados pelo Globo foram praticados por namorados e ex-companheiros das vítimas. Em alguns casos, os assassinatos aconteceram na frente dos filhos.
Leia também: Concurso ‘O juiz do futuro’ prorroga inscrições até o fim de agosto
Andréa Pachá lançará livro em seminário nesta quinta-feira (28)
Vara da Infância de Niterói auxilia na educação e no acolhimento de crianças
No período, o primeiro caso foi o de Marciele Araújo da Silva Souza, de 29 anos, assassinada na manhã do dia 11 de julho, uma segunda-feira, dentro de casa pelo namorado, Glauber Barros, com quem se relacionava há cerca de dois anos. Ele confessou o crime e foi preso na tarde daquele dia.
Dois dias depois, José Carlos Martins Esperidião é preso por policiais da Delegacia de Homicídios da Baixada Fluminense após confessar ter matado a esposa, Claudia Gonçalves de Moura, por ciúmes. Ele esquartejou o corpo da mulher e enterrou no quintal de casa. Ela estava desaparecida desde 4 de julho.
Também desaparecida desde essa data, Elizabeth Lopes da Silva, de 42 anos, foi encontrada morta pela própria filha, no dia 14, dentro da casa do ex-padrasto, em Vargem Grande, na Zona Oeste do Rio.
As semelhanças nas histórias são, na verdade, um padrão. De acordo com o Formulário Nacional de Avaliação de Risco desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Conselho Nacional do Ministério Público, ter filhos pequenos é um dos fatores que aumentam a probabilidade de feminicídio para mulheres que vivem em situação de violência.
— O feminicídio tem a ver com o controle excessivo do agressor, que considera a mulher propriedade dele, e com a vulnerabilidade da vítima. Quando ele perde ou acha que está perdendo esse controle sobre a mulher, ele decide dar um fim na vida dela. A gravidez e o nascimento dos filhos são fatores que agravam o risco porque o homem não aceita dividir essa mulher com ninguém, nem com o próprio filho — explica a juíza Katherine Jatahy Kitsos Nygaard, à frente do Juizado de Violência Doméstica da região da Leopoldina.
Escalada da Violência
Segundo Katherine, a gravidez “divide a atenção da mulher” e, ao mesmo tempo, a torna mais vulnerável física e emocionalmente. A juíza afirma que em sua rotina de trabalho recebe muitos casos em que o agressor dá socos e chutes na barriga da mulher. O pós-parto e os 18 primeiros meses de vida do bebê também são momentos de alto risco. Além disso, a prática de violência na frente das crianças é indicador de que algo ainda pior pode acontecer.
— As agressões na frente das crianças mostram que ele não se importa com nada, nem com a integridade física e psicológica dos filhos — explica a magistrada.
O feminicídio é um crime com etapas bem desenhadas, segundo especialistas. Para a juíza, é clara a “escalada da violência”, dividida por ciclos em três fases: explosão, lua de mel e aumento da tensão. A redução do intervalo entre esses ciclos e o agravamento de agressões nos momentos de “explosão” indicam que o risco de feminicídio é iminente.
— O formulário de avaliação de risco é uma ferramenta tanto para os órgãos de segurança e da Justiça, que vão buscar proteger essa mulher, quanto para a própria vítima, que, através dele, consegue se perceber em situação de risco — afirma a juíza.