“O Globo” publicou nesta segunda-feira (10), no jornal e no site, o artigo da juíza do TJ-RJ Adriana Ramos de Mello “Justiça para as mulheres”. No texto, a magistrada chama a atenção a falta de segurança e as violências sofridas por mulheres no Brasil.
Além de assinalar casos de repercussão em tribunais internacionais, a magistrada relembrou também o feminicídio da juíza Viviane Vieira do Amaral, na véspera do Natal de 2020. Leia aqui o texto na íntegra.
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Justiça para as mulheres
Por Adriana Mello
Todos os dias, meninas e mulheres sofrem variadas formas de violência de gênero no mundo todo. Doméstica, obstétrica, política, sexual, psicológica, além de mutilação genital e casamento infantil, são apenas algumas entre várias outras. O que elas têm em comum é justamente o preconceito contra a mulher. Em 2020, dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontaram que 1.350 foram vítimas de feminicídio no país, e grande parte não teve direito de acesso aos serviços públicos.
As mulheres enfrentam barreiras no acesso à saúde, como restou claro no caso Alyne Pimentel, emblemático de violência obstétrica. Negra e moradora da Baixada Fluminense, a gestante morreu por falta de assistência médica adequada, sendo o Brasil responsabilizado internacionalmente. A violência obstétrica causa sofrimento todos os dias no Brasil, especialmente às negras e pobres, resquícios do período colonial e da escravidão.
A violência de gênero é uma chaga no mundo todo, mas no Brasil atinge de forma desproporcional as negras. Campanhas de conscientização foram criadas, e projetos de humanização foram instituídos pelo sistema de Justiça. Mas tudo parece pouco diante dos dados alarmantes.
No dia 24 de dezembro de 2021, completou um ano o feminicídio da juíza Viviane Amaral, praticado na presença das suas filhas. O patriarcado não perdoa aquelas que ocupam os espaços de poder.
O autor do crime não poupou nem as próprias filhas, causando uma dor sem dimensões à família e aos amigos na véspera do Natal. De lá para cá, muitas foram mortas em condições semelhantes e na presença dos filhos. Quem se importa com a vida delas?
Neste ano eleitoral, precisamos fazer uma reflexão sobre o assunto e sobre que projetos e orçamentos serão destinados às políticas para elas. Faltam centros de referência bem equipados, delegacias estruturadas, servidores capacitados, órgãos judiciais especializados, assistência jurídica gratuita, campanhas educativas de prevenção, além de ensino de qualidade para as crianças e adolescentes com respeito aos direitos humanos e equidade de gênero.
Às mulheres deve ser garantido o direto de acesso à Justiça de forma integral e rápida. O Brasil recentemente foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos justamente porque não garantiu aos familiares de Márcia Barbosa de Souza esse direito fundamental. A estudante foi assassinada em 1998, aos 20 anos, por um deputado estadual na Paraíba. O processo tramitou com extrema lentidão, gerando uma sensação de impunidade e tolerância em relação aos crimes contra as mulheres.
É preciso assegurar investigação, processo e julgamento com perspectiva de gênero e raça, com a devida diligência e celeridade. Vamos refletir sobre que Brasil queremos em 2022, de que investimentos precisamos para que toda mulher possa viver sem violência, livre do racismo e do sexismo. Para que não tenhamos mais Alines, Vivianes e Márcias mortas pelo fato de ser mulheres!