*O Globo
O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve nesta quarta-feira a obrigação dos planos de saúde ressarcirem o Sistema Único de Saúde (SUS) toda vez que um paciente não for atendido pelo plano privado e precisar recorrer ao serviço público. O reembolso está previsto na lei que regula os planos de saúde, de 1998. A decisão do STF é definitiva – ou seja, não cabe recurso. Os outros tribunais brasileiros ficam obrigados a seguir o mesmo entendimento ao julgar o assunto.
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Quando uma pessoa busca o SUS, é feito o registro do atendimento. Depois, essa informação é enviada à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que identifica que o paciente tem plano de saúde. A partir dessa confirmação, a agência filtra os casos em que o atendimento poderia ter sido feito pela operadora. Cabe à agência repassar os valores aos planos para ressarcir o SUS. No ano passado, o repasse foi recorde, no valor de R$ 458,81 milhões. Foram identificados 852 mil atendimentos de usuários de planos de saúde no SUS.
Os valores arrecadados são integralmente repassados ao Fundo Nacional de Saúde (FNS), que, desde 2013, foi ressarcido pelas operadoras em R$ 1,7 bilhão. Também de acordo com a ANS, se o STF tivesse desobrigado os planos de saúde a fazer o ressarcimento, a perda imediata para o poder público seria de R$ 5,6 bilhões, referentes a valores devidos pelos planos de saúde e ainda não pagos. Esses pagamentos ainda não foram realizados por vários motivos – como o parcelamento da dívida e também a contestação do valor em ações na justiça.
O STF também manteve nesta quarta-feira o entendimento de que os contratos firmados antes da Lei dos Planos e Saúde, de 1998, não podem ser atingidos pelas novas regras. Outra norma que o tribunal confirmou foi a possibilidade de operadoras cobrarem mensalidade mais cara de usuários com mais de 60 anos. A exceção é para pacientes com essa idade, mas que já contribuem com o plano há pelo menos dez anos.
A Confederação Nacional de Saúde (CNS), que representa os planos de saúde, questionou a regra do ressarcimento no STF. Segundo a entidade, a saúde é um direito de todos os cidadãos, de responsabilidade do poder público. Portanto, a opção de um paciente pela rede pública não deveria prejudicar o setor privado.
— Se eu resolvo contratar segurança armada, estou impedido de chamar a polícia? A empresa vai ter que pagar a polícia? — questionou no plenário o advogado da CNS, Marcelo Ribeiro.
Mas os nove ministros que participaram da sessão mantiveram a regra do reembolso. O relator da ação, ministro Marco Aurélio Mello, lembrou que os planos de saúde são obrigados a pagar pelo atendimento – seja na rede pública ou privada.
— A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e perpetuação da lógica do lucro às custas do erário. Entendimento contrário significa que os planos de saúde recebem pagamento, mas serviços continuam a ser prestados pelo Estado, sem contrapartida — disse o relator.
O ministro Alexandre de Moraes acrescentou que os pacientes só procuram a rede pública quando os planos falham em prestar o atendimento adequado. Portanto, caberia às operadoras arcarem com o custo.
— Quantas vezes o plano de saúde demora para dar autorização para um procedimento? A ineficiência faz com que muitas vezes se procure o SUS. Não se pode falar em empobrecimento sem causa das seguradoras. O que ocorreria aqui, se não houvesse o ressarcimento, seria o enriquecimento ilícito — argumentou Moraes.
Também nesta quinta-feira, pela manhã, o plenário do STF manteve a validade de uma lei de Mato Grosso do Sul que obriga as operadoras de planos de saúde a informar o paciente sobre o motivo de ter negado cobertura de assistência médica. A decisão vale apenas para esse caso, mas poderá ser levada em conta se forem questionadas leis semelhantes de outros estados.
A ação contra a lei sul-mato-grossense foi proposta pela União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde. A entidade sustentou que a norma é inconstitucional porque os estados não podem legislar sobre direito civil, comercial ou políticas de seguros. Apenas uma lei federal poderia tratar do tema.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que relatou a ação, discordou. Segundo ela, a lei do estado apenas complementou o Código de Defesa do Consumidor. Os oito ministros presentes a acompanharam.