Brasil | 12 de maio de 2017 13:19

Encontro debate a identidade negra na magistratura nacional

FOTO: AMAGIS-DF

A participação dos negros na magistratura representa somente 1,4% da categoria. O tema foi discutido no Encontro Nacional de Juízas e Juízes Negros (Enajun), aberto na quarta-feira (10), em Brasília. Para o presidente da AMB, Jayme de Oliveira, o evento mostra a maturidade da magistratura ao debater o racismo. “A discussão é importante para ter uma sociedade igualitária, começando pela nossa magistratura.”

O Encontro é promovido pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal (Amagis-DF) e pela Associação dos Magistrados de Sergipe (Amase), com apoio da AMB, da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) e da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Com duração de três dias (encerramento nesta sexta-feira, 12), o evento conta com a participação de 199 inscritos nas palestras, mesas de debates e conferências.

“Sou juiz preto, sim, e vou defender esta magistratura que tanto acredito e a quero por inteiro, junto com todos os outros juízes, de todas as outras cores que vierem somar com um serviço de uma natureza extrema para uma sociedade que também é plural”, afirmou o presidente da Amagis-DF, Fábio Esteves.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, disse que é necessário construir uma sociedade justa e solidária, com a erradicação de toda e qualquer desigualdade. “Este é um evento de muita expressão, porque traz à baila esta questão real da sociedade brasileira que, por meios transversos, procura obscurecer a realidade de que convivemos, sim, com o racismo institucional.”

Cotas e barreiras raciais na carreira jurídica

A falta de juízes negros em um país cuja população é metade negra ficou evidente quando foi pedido que se levantassem todos os magistrados negros presentes em um painel do Encontro. Na plateia, de aproximadamente uma centena de pessoas, 21 se ergueram. Diante da flagrante desigualdade racial na Justiça brasileira, o evento discutiu soluções para a questão, como a reserva de vagas para negros em concursos públicos.

As cotas para negros em concursos do Poder Judiciário existem desde 2015, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução CNJ n. 203, para cumprir o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/10). A medida foi tomada após o Censo da Magistratura, realizado pelo Conselho, apontar que, em 2014, negros representavam apenas cerca de 15% do total de juízes do Brasil.

O desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), Ivanilton Santos da Silva, conta que é apenas um dos dois magistrados negros do segundo grau que atuam no tribunal. “Moro em Salvador, a cidade mais negra fora da África, e trabalho no Tribunal da Bahia, o estado de população maciçamente negra. Mesmo assim, só somos dois desembargadores num universo de quase 60 magistrados. É verdadeiramente uma tristeza constatar isso”, afirmou. Segundo o desembargador Ivanilton, ele só foi promovido em 2015 por antiguidade, não por mérito.

Promoção na carreira

Há necessidade de cotas também que viabilizem a promoção não só de juízes, mas de todos os profissionais negros, nas suas respectivas carreiras, de acordo com o padre franciscano e palestrante do painel “Diálogos sobre Racismo e Sociedade”, Frei Davi.

“Em 2005, exigimos do Banco Itaú estatísticas oficiais que mostrassem a quantidade de promoções ofertadas a candidatos negros entre os quadros do banco. Após muita insistência, conseguimos os dados, que revelaram o que já esperávamos: os negros estavam parados na carreira, não eram promovidos”, afirmou. Diante da descoberta, a entidade de Frei Davi, a organização Educafro exigiu novas promoções de negros e, seis meses depois, o número de promoções no banco cresceu 300%.

Também palestrante no painel, o ator Milton Gonçalves narrou as dificuldades enfrentadas ao longo da carreira, principalmente as relacionadas ao preconceito racial, e conclamou a união da população negra no Brasil. “Vocês aqui são heróis por terem estudado e se tornado advogados, juízes, promotores, profissionais negros, pois sempre acham que não somos capazes”, afirmou.

(Com informações do CNJ e da AMB)

FOTO: AMAGIS-DF

FOTO: Gláucio Dettmar