Destaques da Home | 27 de fevereiro de 2017 09:42

‘Minha meta é imprimir rapidez aos processos’, diz corregedor ao Globo

Foto: Fernando Lemos / Agência O Globo

O jornal O Globo publicou, neste domingo (26), uma entrevista com o desembargador Cláudio de Mello Tavares, corregedor-geral de Justiça do Rio. Com o objetivo de dar celeridade aos processos, ele está fazendo uma auditoria em todas as serventias de primeira instância. “Teremos um levantamento mais preciso de quais varas se encontram mais sobrecarregadas. Por que uma vara cível está com 8.500 processos e outra se encontra com metade disso? São perguntas que temos de responder.”

Leia abaixo a íntegra da entrevista:

‘Imprimir rapidez nos processos’, diz novo corregedor geral de Justiça do Estado

O novo corregedor-geral de Justiça do Estado do Rio tem 56 anos e é um autêntico carioca de sorriso largo. Ele privilegia o diálogo, mas também joga duro: deu início a uma auditoria para verificar a produtividade dos juízes de primeira instância.

Qual a função do corregedor-geral de Justiça?

Orientar e controlar as atividades das diretorias gerais do tribunal, assim como fiscalizar as serventias, contribuindo para a efetividade da prestação jurisdicional. Devo, por exemplo, conhecer as reclamações e representações contra magistrados e serventuários que atuam no primeiro grau, assim como fiscalizar os cartórios notariais e registrais. Muitos não sabem, mas é função também da corregedoria fiscalizar todos os cartórios do Rio, de ofícios de notas, registros de imóveis e protestos, para saber se os tabeliães estão efetivamente cumprindo a lei.

Além dos juízes, o senhor tem um grande número de funcionários da Justiça para fiscalizar.

Exatamente. São 900 juízes, 15 mil serventuários e 485 cartórios para tomar conta no estado.

Qual será a sua prioridade à frente da Corregedoria Geral de Justiça do Rio de Janeiro?

A minha meta é imprimir rapidez aos processos judiciais, para que sejam julgados em tempo razoável. Por isso, estamos fazendo um levantamento de todos os processos nas serventias de primeira instância. Vamos verificar a produtividade de cada juiz. Saberemos quantos magistrados estão com dificuldades para dar sentenças e o motivo pelo qual parte dos processos não está com andamento em tempo razoável. Faremos com que a celeridade processual ocorra de fato, porque Justiça lenta é, na verdade, injustiça.

O que o senhor pretende com essa auditoria? Não faz parte do papel do corregedor punir os juízes que não cumprem metas?

Primeiramente, é importante o corregedor-geral ouvir o magistrado e saber quais são suas dificuldades. Efetivamente, é preciso orientar o juiz e verificar o que está acontecendo. Se, é claro, for o caso de um juiz reincidente em problemas, que não cumpre os trâmites processuais nem respeita os horários de audiência, ele deverá ser punido. Não podemos passar a mão na cabeça de um magistrado, de um servidor público que não queira trabalhar. Não podemos permitir a impunidade.

Qual seria o tempo razoável para a conclusão de um processo judicial?

Não posso estimar porque cada caso é um caso. Mas, dentro do poder de comando e cautela, o juiz deve agir em tempo razoável para dar sua sentença, a fim de que o cidadão que bateu à porta do Judiciário tenha seu direito reconhecido. Temos que reconhecer que a Justiça passou a ser muito procurada pelas pessoas. A meu ver, temos um lado positivo que é a demonstração de confiança da sociedade no Poder Judiciário. Por outro lado, isso faz com que os magistrados e os serventuários precisem trabalhar mais.

Quais são as varas mais sobrecarregadas do Rio?

Há varas cíveis que têm uma média de 8.500 processos. Uma das mais importantes, a Vara de Execuções Penais (VEP), tem cem mil processos, referentes a 50 mil presos. A VEP comprou um sistema de informática do Paraná, o Processo Judicial Digital (Projudi), para dar celeridade aos processos. Atualmente, a VEP está 70% informatizada. Estou fazendo a auditoria em todas as varas para ter um levantamento mais preciso de quais se encontram mais sobrecarregadas. Por que uma vara cível está com 8.500 processos e outra se encontra com metade disso? São perguntas que temos de responder. Todas as varas cíveis contam com nove serventuários. Então, a meu ver, isso parece um problema de gestão. Faz parte do planejamento ter servidores em cursos de aprimoramento para melhorar o atendimento e a prestação do serviço.

Como será feita essa fiscalização? O senhor tem servidores suficientes para tal tarefa?

A fiscalização deve caminhar ao lado da orientação. O que ser quer é um Judiciário com padrão de excelência, e esse objetivo não deve ser um desejo apenas do corregedor, mas de todos os integrantes do Poder Judiciário. O intuito é que cada um desempenhe a função que lhe cabe da melhor maneira possível. Assim, a fiscalização será primordial para a solução do problema, e prestará um serviço de qualidade para quem precisar da Justiça.

Uma das queixas mais comuns de quem procura o Judiciário é a morosidade nos trâmites processuais. Dados da Ouvidoria do Tribunal de Justiça do Rio, de novembro do ano passado, revelam que, dos 2.941 registros feitos no órgão, 1.625 são reclamações referentes ao trabalho na primeira instância. Como o senhor pretende resolver isso?

Primeiramente, tenho de saber o que realmente está acontecendo. Se tiver alguma representação contra um magistrado, vamos ouvi-lo, assim como sua equipe e as partes interessadas, para só depois decidirmos se damos andamento ao processo. Ele terá ampla defesa, garantida pela Constituição. Se houver indícios, vamos investigá-lo e, caso seja necessário, instaurar um processo contra ele. Não estamos fazendo só a auditoria, também procuramos ouvir a sociedade. Na semana da minha posse, recebi representantes dos sindicatos dos serventuários, dos escrivães do estado e o defensor-geral público, André Luís Machado de Castro.

Qual foi o principal objetivo dessas conversas?

Justamente saber como estão funcionando as varas. No caso do defensor-geral, ele me alertou que o sistema da Polícia Civil destinado à busca de mandados de prisão não estava funcionando. Quando um juiz expede o alvará, tem que fazer esse levantamento. Baixamos um aviso para que cada juiz verificasse em outros bancos de dados se poderia, ou não, soltar o preso. Havia cem alvarás de soltura expedidos, mas nenhum poderia ser cumprido porque o sistema estava fora do ar. Isso prejudica a dignidade do preso. O respeito advém do cumprimento do dever.

O diálogo será sua marca na Corregedoria Geral da Justiça?

Esse foi o meu compromisso durante a campanha para corregedor-geral no biênio 2017/2018. As portas do meu gabinete estarão sempre abertas.

Quantos servidores fazem parte de sua equipe?

Tenho seis juízes auxiliares, além das equipes de 13 Núcleos Regionais, que são os meus olhos em todo o estado. Eles verificam o trabalho desenvolvido por outros juízes e passam o relatório para mim. Cada um tem que dar o melhor de si para um bom resultado final em benefício da população.

Por causa da lentidão nos processos, muitas vezes o servidor público é malvisto. Em alguns casos, há até embate entre ele e o cidadão que procura a Justiça. Como acabar com esse tipo de situação?

O servidor precisa melhorar sua autoestima. O reconhecimento de um trabalho é muito importante para que ele possa ganhar forças para continuar e, ao mesmo tempo, estar consciente sobre suas responsabilidades como servidor. O próprio juiz de primeiro grau tem um papel fundamental. É o juiz, as quatro paredes e o processo. É um ato solitário. Vamos estimulá-lo, dando orientações. Muitas vezes, ele está assoberbado de trabalho porque acumulou processos de outra vara ou perdeu serventuários. Por isso, é preciso ouvir, não só punir.

Como resolver a falta de servidores nos cartórios em um momento de crise?

Vamos fazer com que alguns deles trabalhem além de seu horário. Como não temos condições de pagar horas extras, vamos compensá-los com banco de horas, folgas. O próprio sindicato dos serventuários fizeram essa proposta. Temos um serviço hoje na corregedoria de trabalho à distância. O serventuário pode estar lotado numa comarca e ajudar uma outra, que seja próxima à sua casa, quando houver a necessidade de agilizar os processos desta segunda.

Qual o legado que o senhor quer deixar?

Meu sonho é que as pessoas tenham seu direito reconhecido e que passem a confiar ainda mais no Poder Judiciário. Também quero que servidores e magistrados trabalhem em ritmo de união, prestando um serviço público mais eficiente.