Brasil | 21 de março de 2016 18:31

O repúdio da Justiça

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Com palavras ofensivas e de baixo calão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva provocou a ira dos membros da mais alta corte brasileira. Na quarta-feira 16, grampos obtidos pela Polícia Federal revelaram diálogos de Lula nos quais o ex-presidente afronta todas as esferas da Justiça brasileira. Ele se refere aos membros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça como acovardados. Também desfere impropérios sobre o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato, e sobre Rodrigo Janot, procurador-geral da República.

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E ofende gravemente o juiz Sergio Moro. As frases provocaram uma onda de manifestações indignadas de representantes da Justiça brasileira. O mais antigo ministro do STF, Celso de Mello, reagiu um dia após a divulgação das interceptações e disse que as afirmações de Lula representam uma “reação torpe e indigna, típica de mentes autocráticas que não conseguem esconder o temor pela prevalência do império da lei”. O ex-presidente também provocou a repulsa de associações de juízes e magistrados de todo o País. 

“Precisamos preservar a independência da magistratura e de todos os poderes para evitar um ambiente de tumulto”, diz Jayme de Oliveira, presidente da Associação Paulista de Magistrados. O ministro do Superior Tribunal de Justiça, João Otávio de Noronha, também fez um duro pronunciamento após os insultos. “Não estamos acovardados porque colocamos a mão, o dedo na ferida para investigar todos aqueles que se dispuseram a praticar atos ilícitos e atos criminosos”, afirmou.
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 “Esta é uma Casa de juízes íntegros, que não recebe doação de empreiteiras. Esta Casa não se alinha a ditaduras da América do Sul, concedendo benefícios a ditadores e amigos políticos que estrangularam as liberdades na América Latina.” Noronha chegou a dizer que se envergonha de algumas lideranças políticas do País. “Jamais poderia me calar diante de uma acusação tão grave. Mostra a pretensão ditatorial, o caráter, a arrogância de quem pronunciou.”
O conteúdo das gravações também sugere que Lula queria influenciar as decisões do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Na interceptação, o ex-presidente pede ao advogado Sigmaringa Seixas, próximo ao PT, que converse com Janot sobre as investigações. Em um trecho do áudio, Lula quer que o advogado pergunte se há lugar no Ministério Público para os bens apreendidos. “O favelado não pode me dar dinheiro para guardar aquilo. Os sindicatos não podem dar. Quem pode me dar são os empresários. Eles estão criminalizando os empresários.”
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Em outra gravação, Lula afirma que a militância do PT deve “trucar” e “triturar” o atual procurador-geral da República. Da Suíça, Janot rebateu as declarações de Lula, dizendo que o Ministério Público não tem medo. “O Ministério Público tem que ter couro grosso porque mexe com a liberdade das pessoas, com o patrimônio das pessoas e é normal que elas reajam”, disse. Em outro trecho da gravação, Lula se queixa ao dizer que o procurador-geral recusou quatro pedidos de investigação de Aécio Neves e aceitou o único pedido contra a Lils, empresa de palestras do ex-presidente.

Ele diz: “Essa é a gratidão dele por ter sido nomeado procurador.” Janot rebateu mais uma vez. “Não sei que ingratidão é essa. Estou em final de carreira e se devo meu cargo a alguém é à minha família.” Escutas realizadas no último dia 4, quando o ex-presidente prestou depoimento à Polícia Federal, indicaram que Lula queria uma atuação de Dilma e do então ministro-chefe da Casa Civil, Jacques Wagner, junto à ministra do STF, Rosa Weber, no momento em que a magistrada decidiria sobre o curso das investigações. “Eu queria que você visse agora, falar com ela o negócio da Rosa Weber. Está na mão dela para decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram”, disse Lula a Wagner.
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Os atuais ministros da corte, Marco Aurélio Mello e o presidente do STF, Ricardo Lewandowski responderam aos insultos. “Repudio essa assertiva de que o Supremo seja uma redoma protetora do ex-presidente Lula. Me sinto indignado quando dizem que podemos ser benevolentes. A que ponto chegamos”, afirmou Mello.Lewandowski, por sua vez, disse que os constituintes de 1988 atribuíram à Suprema Corte a elevada missão de manter a supremacia da Constituição Federal e a manutenção do Estado Democrático de Direito. “Tenho certeza de que os juízes dessa Casa não faltarão aos cidadãos brasileiros com o cumprimento desse elevado hunos.”

Lula também mostrou irritação com o andamento da operação Lava Jato. “Eu, sinceramente, estou assustado com a República de Curitiba porque a partir de um juiz de primeira instância tudo pode acontecer nesse País.” Diante do quadro de mal-estar provocado entre os poderes pelo ex-presidente, o ministro Gilmar Mendes criticou o governo e classificou a volta de Lula a Brasília como uma “bizarrice”. “É preciso muita desfaçatez para obrar dessa forma com as instituições. É preciso ter perdido aquele limite que distingue civilização de barbárie.”
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Créditos das imagens desta matéria: Deborah Silveira Monteiro da Silva; Suellen Lima/FramePhoto/Folhapress; Reprodução
Fonte: ISTOÉ