* Folha de S.Paulo
Chamado de “juizeco” pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o juiz titular da 10ª Vara Federal do DF, Vallisney de Souza Oliveira, 51, é avesso a entrevistas.
Manifesta-se por meio de discursos durante formaturas e cerimônias do Judiciário. Já disse, por exemplo, que um juiz não está imune a erros, mas deve atuar contra ameaças ao “Estado de Direito”.
“Não pretendo nunca ser mencionado como o justiceiro ou vingador do povo ou cavaleiro que ganha todas as batalhas ou que nunca erra”, afirmou em 2006, ao se despedir da Justiça Federal do Amazonas, onde trabalhou por 14 anos.
Em 2000, declarou que o juiz precisa agir quando a ordem jurídica e direitos fundamentais “são desrespeitados por grupos e facções ou deliberadamente por setores do próprio Poder Público”.
“Uma atuação implacável de magistrados imparciais e independentes pode recompor com segurança e sem traumas o Estado de Direito ameaçado e reparar as injustiças e violação à ordem jurídica praticada por agentes estatais ou organismos paraestatais”, afirmou.
Vallisney alimenta um blog onde publica poesias, 42 próprias e 42 citações de autores diversos. Nas suas criações, “Poemas tentados”, fala de amor, saudade e a passagem do tempo. Em “Cadafalso”, que escreveu mais de um ano antes de virar alvo dos ataques do presidente do Senado, pontuou: “Era eu duro na queda e firme no passo/ou ainda não era hora de me guilhotinar”.
Na Justiça Federal do Distrito Federal há dez anos, ele foi ou é responsável por casos de grande repercussão, como as operações Zelotes e Greenfield e um dos casos que envolve o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em conexão com a Lava Jato.
Nascido em Benjamin Constant (AM), cidade encravada na floresta amazônica à margem do rio Solimões, Vallisney foi fiscal de tributos estaduais (1984-1988), promotor de Justiça em Manaus (1988-1992) e procurador da República no Espírito Santo (1992), antes de se tornar juiz federal, aos 27 anos de idade, em 9 de novembro de 1992.
Sua trajetória no Judiciário é ligada à área criminal, tendo atuado em tribunais de júri para julgamento de homicídios. Passou um tempo cedido ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) para auxiliar na tramitação de processos sobre autoridades com foro privilegiado, como governadores de Estado.
Nos discursos, busca se afastar da imagem de infalibilidade: “É provável que nessa jornada [eu] muito tenha errado até mesmo em algumas ocasiões em que pensei ter dado a correta e induvidosa decisão”.
Autor de cinco livros e professor na UnB (Universidade de Brasília), Vallisney costuma dar decisões concisas e com poucos adjetivos.
Gastou apenas oito páginas para autorizar o cumprimento dos mandados de busca e apreensão no Senado e quatro prisões de policiais legislativos, naOperação Métis, na última sexta (21).
Ao citar uma prova, costuma fazer referência rápida à representação policial ou à peça do Ministério Público Federal, evitando longas transcrições.
Páginas de argumentos muitas vezes redundantes de procuradores da República e delegados da PF são resumidas pelo juiz em um ou dois parágrafos. Nesse tópico, lembra o juiz federal Sergio Moro, da Lava Jato, que evita escrever peças muito longas.
Vallisney prega maior celeridade no Judiciário. Sob sua responsabilidade há hoje cerca de 2.500 processos. No discurso de 2000, disse que há “lentidão absurda na solução final das controvérsias”.
Contra vários prognósticos negativos, tendo em vista o alto número de réus e de testemunhas, encerrou a fase de instrução e julgamento da primeira ação penal da Operação Zelotes, que investigou o Carf, em prazo de fazer inveja ao próprio Moro. Da deflagração da operação pela PF até a sentença foram apenas um ano e dois meses.
Levantamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) de 2016 indica que o tempo médio de uma ação na primeira instância da Justiça Federal é de dois anos.
Embora rápido na autorização das ações cautelares, como prisões preventivas, quebras de sigilo e busca e apreensão, Vallisney não pode ser considerado inflexível na fase da sentença. No primeiro caso da Zelotes, por exemplo, condenou nove réus, mas permitiu que pudessem recorrer em liberdade, ordenando a soltura. A decisão foi comemorada por advogados de defesa.
Fonte: Folha de S.Paulo