* ConJur
A crise de caixa que acomete o governo do Rio de Janeiro parece ter desaguado com força no Tribunal de Justiça do estado. Além das ações coletivas ajuizadas por diversas entidades para garantir o pagamento dos salários de servidores ativos e aposentados, as varas de Fazenda Pública registraram também o aumento de ações individuais com o mesmo fim. Para evitar decisões contraditórias, o Órgão Especial do TJ-RJ vai analisar a questão por meio do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Com isso, todos os processos que tratam da matéria deverão ser suspensos até uma decisão definitiva.
O IRDR foi admitido na sessão desta segunda-feira (16/5), na apreciação de um processo levado à pauta após o colegiado analisar um pedido da Defensoria Pública do estado, também para garantir o pagamento dos salários em dia. O relator do incidente, desembargador Nildson Araújo, destacou o interesse público da matéria, tendo em vista o aumento no número de ações individuais e de decisões proferidas pela primeira instância autorizando o bloqueio dos valores devidos diretamente das contas do estado. Até a última quinta-feira (11/5), já somavam 47 as liminares concedidas.
Instituído pelo novo Código de Processo Civil, o IRDR permite que os tribunais de segunda instância estabeleçam o desfecho das demandas consideradas de massa se a matéria não estiver em apreciação pelas cortes superiores. Com a admissão do incidente, o relator deve requisitar a manifestação do Ministério Público e determinar a suspensão de todos os processos semelhantes em tramitação no tribunal.
O admissão do IRDR gerou muito debate entre os desembargadores. Primeiro pelo fato de o processo ter sido chamado à apreciação pelo relator “em mesa”, em vez de anunciado na pauta de julgamentos do Órgão Especial, para permitir a manifestação dos envolvidos.
Diante dessa dúvida, o desembargador Camilo Ruliere sugeriu que o Órgão Especial fizesse a “admissibilidade provisória” do IRDR — medida a ser confirmada em uma sessão posterior, após as partes serem informadas. Dessa forma, o tribunal poderia determinar a suspensão de ações individuais de pronto. “É uma situação excepcional. Na semana passada, tivemos a duplicidade de arrestos. Só não saiu porque o tribunal interviu”, justificou.
Contudo, outra dúvida surgiu no julgamento — desta vez em razão da arguição de descumprimento de preceito fundamental em que o governo do Rio de Janeiro pede ao Supremo Tribunal Federal que proíba o TJ-RJ de determinar o arresto de valores diretamente das contas do estado para pagar os servidores ativos e inativos.
Nildson Araújo explicou que o incidente suscitado pela primeira instância ao TJ-RJ se restringia às ações individuais. No entanto, o inciso 1º do artigo 981 do novo CPC é expresso ao estabelecer que o reconhecimento do IRDR implica na suspensão dos processos pendentes de julgamento, tanto os individuais como os coletivos — estes últimos objetos da ADPF.
O governo do Rio de Janeiro alega nessa ação que a Justiça fluminense já bloqueou R$ 1 bilhão das contas do estado e que as decisões, além de representarem uma interferência na gestão orçamentária do estado, ferem o princípio da isonomia.
O presidente do TJ-RJ, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho se reunirá com a relatora da ADPF, ministra Rosa Weber, para prestar informações sobre os arrestos então autorizados. Em razão disso, o desembargador Luiz Zveiter, decano do tribunal, sugeriu que a admissibilidade do IRDR fosse apreciada pelo Órgão Especial na sessão extraordinária marcada para o dia seguinte ao encontro.
O debate, porém, continuou. Por fim, os desembargadores concluíram que a admissão do incidente não infringiria as regras do novo CPC, uma vez que o Supremo ainda não se manifestou sobre o tema. Por unanimidade, eles reconheceram o IRDR. O presidente do TJ-RJ disse que informaria a ministra sobre a decisão da corte.
Com a admissão, o relator do IRDR poderá determinar a suspensão de todas as ações movidas por servidores, aposentados e pensionistas para garantir o pagamento dos salários em dia, até o julgamento do mérito do incidente. A avaliação do Órgão Especial é que ninguém será prejudicado neste momento, uma vez que o governo depositou a remuneração de abril na semana passada.
Defensoria Pública
Antes de analisar o Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva, o Órgão Especial julgou o agravo interposto contra a decisão do desembargador Caetano Ernesto da Fonseca que havia estendido a liminar que autorizou o arresto dos valores referentes à folha de março da Defensoria Pública também para o mês de abril. Foram bloqueados R$ 49,2 milhões para garantir o repasse do duodécimo da instituição no mês passado.
No recurso, o governo pedia a revogação da liminar e a devolução dos valores repassados, mas o Órgão Especial negou o pedido. No julgamento, foi analisado ainda um pedido da Defensoria Pública para estender a liminar até dezembro, último mês do exercício financeiro do estado.
O defensor público-geral do Rio de Janeiro, André Castro, sustentou que a medida vai além da questão financeira, pois envolve também a preservação do status constitucional da instituição. “Quando a Defensoria Pública impetra o mandado de segurança, é para assegurar que o repasse seja feito não apenas no mês de março ou no mês de abril, mas que a Constituição Federal seja efetivamente garantida. Diante desse pedido, pede que o parâmetro seja o exercício fiscal do ano de 2016”, requereu.
O relator do caso votou a favor da extensão automática da liminar, até dezembro. “Já temos informações suficientes de que o estado não fará o repasse”, destacou.
O Órgão Especial, contudo, se limitou a julgar o recurso do estado. O entendimento que prevaleceu foi que, ao confirmar a liminar concedida pelo relator, o colegiado já deu aval para que a medida seja executada nos meses seguintes se o estado não depositar os salários da Defensoria Pública.
Fonte: ConJur