* Siro Darlan
Esopo foi um pensador grego que escreveu no século VII antes de Cristo fábulas de caráter moral e alegórico que permanece aplicável até os tempos atuais. Uma delas me chama muita atenção pelo seu caráter pedagógico e a prevalência do instinto animal da força sobre a razão.
Conta Esopo que um lobo estava bebendo água num riacho, logo mais abaixo um cordeiro começou a beber. O lobo, fazendo uso de sua superioridade, de sua força e de sua arbitrariedade, reclamou arreganhando os dentes: “Como você tem a ousadia de vir sujar a água que estou bebendo?” O cordeiro, com subserviência e humildade respondeu: “Como sujar? A água corre daí para cá, logo não posso estar sujando sua água.”
O lobo, autoritário, replicou: “Não me responda. Pois sei que você estragou o meu pasto. O cordeiro, humilde, respondeu: “Como posso ter estragado seu pasto, se nem dentes tenho?” Ao que emendou o lobo: “Fiquei sabendo que você andou falando mal de mim há um ano”. O cordeiro, inocente, respondeu: “Como poderia falar mal do senhor há um ano se sequer completei um ano?” E o lobo arrogante não tendo mais argumentos, atacando o cordeiro, ainda disse: “Se não foi você, foi seu pai, sua mãe, algum parente”. E devorou o mais fraco.
A história é a mesma. O lobo reformou um estádio com superfaturamento e entregou para seus amigos construtores, destruiu o parque aquático e a pista de atletismo às vésperas de uma Olimpíada. Expulsou os índios, aumentou a tarifa dos transportes, colocou o helicóptero oficial para transportar animais de estimação e contratou a esposa para administrar as concessionárias públicas responsáveis pela má prestação do serviço e alto custo para o rebanho.
O cordeiro oprimido pelo alto custo de vida e entristecido pelo uso feito das taxas e impostos cobrados pelo lobo foi às ruas reclamar contra essa exploração exigindo respeito aos mais humildes e oprimidos. O lobo, tal como no século VII A/C, deu ordens a seus guardas para que prendessem os cordeiros e os levassem para as masmorras acusando-os de incendiarem a Casa das Leis, que nunca foi incendiada; quebrarem as vidraças dos banqueiros, que nunca reclamaram qualquer dano.
Enfim, mais uma vez, o autoritarismo e a força venceram a razão e os argumentos disponíveis dos mais frágeis. Os cordeiros estão nas masmorras. Mas quem se importa?
Siro Darlan é desembargador do TJ e coordenador da Associação Juízes para a Democracia
Fonte: O Dia