Notícias | 26 de setembro de 2014 14:52

Novas regras nas eleições do TJ do Rio de Janeiro são inconstitucionais

* Thiago Ribas Filho

Oh tempora! Oh mores! (Que tempos! Que costumes!)

Eleições de verdade para a Administração do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro eram as do meu tempo. Já estou chegando, ou já cheguei, a esta altura da vida, à conclusão de que tudo de bom era no meu tempo; meu e de outros coroas, que insistem em continuar neste mundo, acreditam em Deus, mas não têm pressa de ir ao Seu encontro.

Aos 83 anos, ainda me lembro das eleições para o biênio fevereiro de 97 / janeiro de 99, nas quais fui eleito presidente do Tribunal de Justiça, cargo a que jamais aspirara e, por isso mesmo, não pleiteava disputar. A ele fui alçado por iniciativa de um grupo de colegas, encabeçado pelo desembargador Dilson Navarro, que me apresentou uma lista de apoio ao meu nome, com a assinatura de grande número de eleitores de alta qualificação.

Como me enquadrava nas regras legais exigidas pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) para concorrer, entre elas a de ser um dos cinco mais antigos para inscrever-me, aceitei o encargo, que exerci com dedicação e empenho, em conjunto com os ilustres corregedor e vice-presidentes, e a cooperação eficiente de magistrados e serventuários que escolhi para auxiliar-me. As principais linhas traçadas foram cumpridas e aperfeiçoadas pelos componentes das três direções do tribunal que se seguiram, cada uma com maior êxito e proveito para os jurisdicionados.

À distância, venho acompanhando a vida do nosso Tribunal de Justiça, que ainda se encontra entre os melhores do país e, hoje, conta com 180 desembargadores, e passa, a meu ver, por um momento muito triste e decepcionante, pela grande divisão entre seus componentes.

Recentemente, o Tribunal Pleno, a partir de projetos de alteração do Código de Organização Judiciária e do Regimento Interno da Corte, resolveu, em um tempo realmente curto para exame da matéria, alterar o sistema eleitoral, com a apreciação, sui generis, de 15 questões, compilando propostas dos desembargadores, entre elas:

 a) a do número de votantes (participação ou não dos magistrados de 1º grau (não aprovada)

 b) a dos candidatos passíveis de serem eleitos (a maioria optou por todos os desembargadores)

 c) a de permissão para um desembargador “ser eleito para o mesmo cargo, observado o intervalo de dois mandatos”, “desde que isto ocorra no prazo máximo de quatro anos” (aprovadas)

Estas matérias, que figuram, com outras mais, na Resolução TJ/TP/RJ 01/2014, contrariam, induvidosamente, o artigo 93 da Constituição Federal, reservada, no dispositivo constitucional, à lei complementar federal, que veio a ser a de número 35/79 (Loman). A propósito, há que se considerar que, mais do que as regras de organização interna do tribunal, há precedente de uma lei estadual, número 2.423, de 6 de setembro de 1995, que permitia a reeleição para a Presidência do Tribunal de Justiça, haver sido reconhecida inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 1.422-6-RJ, da qual foi relator o ministro Ilmar Galvão.

 As hipóteses versadas no item c, acima — intervalo de dois mandatos e posterior prazo máximo de quatro anos — deixam entrever estar-se visando a situações específicas de um ou mais desembargadores interessados em uma reeleição ou recondução.

Acredito que a inconstitucionalidade da Resolução 01/2014, que “aprova novas regras para o processo eleitoral no âmbito do Poder Judiciário”, cujo artigo 14 dispõe que suas “alterações terão vigência e eficácia imediatas”, venha a ser questionada junto ao Supremo Tribunal Federal — ou a ser objeto de exame pelo Conselho Nacional de Justiça, para que se proceda à futura eleição com a participação de quem efetivamente atenda às exigências constitucionais e legais para concorrer.

Nesse sentido, destaque-se trecho de decisão de 10 de outubro de 2013, proferida pelo ministro Ricardo Lewandowski, atual presidente do STF, no MS/SP 32.451 MC, onde afirmou categoricamente acerca do tema: “Ressalto, nesse sentido, que não considero recepcionado o art. 102 da Loman somente no que diz respeito à eleição para os cargos de direção dos desembargadores mais antigos. No resto, o citado art. 102 continua sendo aplicável, especialmente no que se refere à vedação de reeleição e à proibição de um mesmo desembargador ocupar cargos de direção por mais de quatro anos” (grifos meus).

Para a magistratura, muito especialmente, a fiel observância das regras constitucionais e legais não será nunca vista como artigo supérfluo ou de luxo, mas como imperativo intransponível do sistema constitucional.

Thiago Ribas Filho é ex-presidente do TJ-RJ e desembargador aposentado.

Fonte: ConJur