Notícias | 25 de agosto de 2014 14:22

Juízes apoiam lei para audiência de custódia

A Associação Juízes para a Democracia (AJD) enviou ofício ao senador Renan Calheiros, presidente do Senado Federal, pugnando pela aprovação do projeto de lei que cuida da audiência de custódia, ou seja, do contato imediato do juiz com o cidadão detido.

Ao lado de entidades que atuam na área dos Direitos Humanos, a AJD considera o projeto essencial para a consolidação da democracia no país.

A apresentação do preso a um juiz logo após a prisão é vista como um passo fundamental para a redução de casos de torturas, maus tratos e outros abusos.

O primeiro contato pessoal do juiz com o preso tem possibilitado a revogação de inúmeras prisões provisórias, que deveriam ser excepcionais.

A prática demonstra que o uso da prisão provisória prevalece especialmente para réus pobres, jovens negros das periferias.

O contato pessoal do juiz com o preso tem possibilitado conhecer eventuais irregularidades na prisão ou mesmo a sua desnecessidade.

Para a AJD, o incremento nos gastos com a apresentação de presos certamente será compensado com a economia na diminuição das despesas com transporte para as audiências de instrução daqueles que forem soltos logo na audiência de custódia. Isso sem falar na redução drástica de gastos com aqueles que deixarão de ser custodiados.

Há experiências exitosas em várias comarcas, nas quais, mesmo sem a lei, os juízes já aplicam a audiência de custódia diretamente com base no Pacto de San José da Costa Rica.

Eis a íntegra do ofício:

 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL RENAN CALHEIROS.

Ref.: Audiência de Custódia

A ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA (AJD), entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade estatutária o respeito absoluto e incondicional aos valores próprios do Estado Democrático de Direito, vem apresentar seu apoio à implementação urgente da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro, dando cumprimento a norma internacional de Direitos Humanos a que o Brasil se vinculou e traçando um caminho concreto na efetiva direção da superação de práticas policiais violentas e abusivas em face de cidadãos detidos, a par da própria racionalização da aplicação da prisão cautelar, compatibilizando-a ao seu verdadeiro caráter excepcional.

Dados divulgados recentemente pela Human Rights Watch demonstram, mais uma vez, que permanece sendo assustadoramente comum a prática de tratamentos cruéis, desumanos e degradantes a pessoas detidas pelas forças de segurança no Brasil. Ao lado disso, ano após ano o censo penitenciário tem revelado níveis insustentáveis de encarceramento, com especial destaque ao uso abusivo de prisões cautelares, medida extrema que, em tese, deveria ser reservada a situações excepcionais.

O contato do juiz com o cidadão detido, logo após a prisão, é condição essencial para que abusos possam ser prontamente identificados, servindo, desse modo, como desestímulo a sua prática, além de se possibilitar um melhor conhecimento das circunstâncias da prisão e da real necessidade de mantê-la ou não.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), ratificada pelo Brasil no já longínquo ano de 1992, em seu art. 7º dispõe que “toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”.

Assim, a Associação Juízes para a Democracia entende ser urgente que o Legislativo pátrio implemente finalmente a audiência de custódia no Brasil, sendo essencial que se realize na presença física de um juiz, posto que assim o exige a norma internacional citada, e porque apenas assim se assegura a plena manifestação do detido, livre de temores de represálias por parte de eventuais abusadores, bem como o profícuo contato franco entre aquele que sofre a privação de sua liberdade e aquele que tem por dever a garantia de direitos.

Certo que os compromissos sociais e vínculos populares dos senadores ensejarão o acatamento desta proposição cidadã, subscreve-se o presente.

São Paulo, 21 de agosto de 2014.

 

André Augusto Salvador Bezerra

Presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia

Fonte: Folha de S. Paulo