O ex-presidente da Amaerj e presidente da Comissão Mista de Comunicação Institucional do Poder Judiciário do Rio de Janeiro, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, falou à revista eletrônica Consultor Jurídico, em entrevista publicada ontem (22), sobre a implantação da Comissão e a importância do diálogo com a imprensa. “O jornalista está ali a serviço de um direito à informação, que é um direito fundamental do cidadão”.
Confira a íntegra da reportagem:
É papel dos tribunais divulgar informações que facilitem a vida dos jurisdicionados, simplificando a linguagem jurídica e estimulando a busca por meios extrajudiciais. A recomendação é do desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, ex-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros entre 1998 e 1999 e uma das lideranças da Justiça estadual do Rio de Janeiro.
Como presidente da Comissão Mista de Comunicação Institucional do Poder Judiciário do Rio de Janeiro (Comci), instituída há pouco mais de um ano, e da qual é um dos idealizadores, o desembargador tem tido a oportunidade de transpor seu discurso para a prática. Um dos exemplos é o programa de rádio “Informação Legal”, que há cerca de 10 meses tira dúvidas dos ouvintes da rádio Tupi, uma das mais populares do Rio, sobre as mais variadas questões ligadas ao funcionamento da Justiça.
“A nossa comunicação não é só a divulgação do que fazemos ou deixamos de fazer, mas também mostrar que o gargalo do Judiciário só será superado com a massificação dos meios extrajudiciais”, afirmou, em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico.
Na conversa, que aconteceu durante as apurações para o Anuário da Justiça Rio de Janeiro 2014, a ser lançado em novembro, Carvalho falou sobre uma das inovações trazidas pela Comci. Justificando a expressão “comissão mista”, ela possui, entre seus membros, três representantes de fora do tribunal: um advogado, um cientista político e um jornalista. Desse modo, diz, a instituição dá um exemplo de que busca, de fato, o diálogo com a sociedade civil e a imprensa.
“Para dar o passo necessário, uma composição só com membros internos não atenderia os objetivos. Isso representava uma mentalidade de isolamento, que ficou lá atrás. Como a instituição quer se comunicar sem ouvir?”, questiona.
Depois de 30 anos de magistratura, os últimos quatro como presidente da 3ª Câmara Cível do tribunal, ele mostra que não perdeu a inquietação. Afirma que o Judiciário precisa ser transparente para renovar, a cada dia, sua legitimidade. E toca em ponto sensível que gerou debates recentes: os limites do segredo de Justiça. “Note que o segredo de Justiça é uma exceção, só usado em Direito de Família e em casos muitos especiais. Porque aquilo que é secreto é adversário da democracia.”
Carioca, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho atuou por 10 anos como advogado e cinco como defensor público. Também foi presidente da Associação de Magistrados do Rio de Janeiro, tendo já publicado diversos livros, entre eles, A Justiça em Mutação — A Reforma do Poder Judiciário.
De acordo com a Resolução 3 de 2012 do TJ-RJ, um dos objetivos da Comci é “colher junto à sociedade elementos para sua maior eficácia [do Poder Judiciário], bem como mantê-la ciente da extensão de suas decisões”. Para levar a missão adiante, o desembargador antecipa seu próximo passo: promover visitas de magistrados às redações de jornais, revistas, rádios e TVs.
Dessa maneira, Luiz Fernando aposta que os julgadores terão a chance de esgotar todas possibilidades de diálogo com a imprensa. “O jornalista está ali a serviço de um direito à informação, que é um direito fundamental do cidadão”, conclui.
Leia a entrevista:
ConJur — Como surgiu a Comissão Mista de Comunicação Institucional do Poder Judiciário do Rio de Janeiro?
Luiz Fernando — Ela é baseada na reflexão de que o Judiciário precisa se estruturar na área de comunicação. As assessorias de imprensa no Judiciário devem existir há cerca de 20 anos. É uma estrutura relativamente recente. Hoje, todos os tribunais têm a sua, mas é preciso passar a outro patamar, que permita uma interlocução melhor com a sociedade. A Comci foi proposta exatamente para qualificar essa interlocução do Judiciário com a imprensa e a sociedade civil, que abrange as organizações não governamentais e certas instituições com grande destaque na vida do país, como a Ordem dos Advogados do Brasil, a Associação Brasileira de Imprensa e a CNBB, passando por associações de moradores, enfim, abrangendo desde as grandes entidades até os microuniversos, que representam a capilaridade da sociedade. E ainda há uma terceira vertente, que é a comunicação interna. Chegamos à conclusão de que não tínhamos no Judiciário — e, nesse caso, refiro-me ao Judiciário em geral — uma comunicação interna eficiente. Muitas vezes, um órgão do Poder Judiciário não sabia o que o outro estava fazendo. Havia superposição e dispersão de esforços. Por exemplo: o mesmo tribunal ter três ou quatro revistas é demais. Que ele tenha uma para divulgar sua jurisprudência é plenamente justificado. Mas para garantir sua interface com a sociedade de forma eficaz não é necessário ter uma revista do tribunal, outra da corregedoria e outra da escola da magistratura. Isso acaba gerando desperdício de gastos, sem falar na alocação de servidores. Basta uma revista. Assim, otimizamos despesas e recursos humanos.
ConJur — Que dificuldades enfrenta a comunicação interna do TJ-RJ?
Luiz Fernando — O fenômeno dos canais de veiculação de notícias que acabam se tornando semi-institucionais é uma delas. Vou dar um exemplo. Aqui no tribunal, como em qualquer grande empresa, fala-se muito por meio da “rádio corredor”. Os boatos transitam regularmente. Outra emissora que também funcionava aqui era a “rádio garagem”, que são as notícias difundidas pelos motoristas. O resultado é que muitas informações importantes para o funcionamento do tribunal não chegavam ou chegavam de maneira deturpada. Isso tudo é resultado da deficiência da comunicação interna. E há uma tendência de que o boato se espalhe rapidamente. Agora, experimente espalhar o boato positivo. As pessoas logo vão duvidar. Mas o boato clássico tem uma credibilidade extrema, as pessoas tendem a acreditar que o fato negativo, se não é verdade, o será em breve.
ConJur — Como os demais magistrados reagiram à inclusão de pessoas de fora na comissão de comunicação do tribunal?
Luiz Fernando — De fato, ela gerou um bom debate no Órgão Especial. Alguns desembargadores questionaram, mas nós defendemos que, para dar o passo necessário, uma composição só com membros internos não atenderia aos objetivos. Isso representava uma mentalidade de isolamento, que ficou lá atrás. Como a instituição quer se comunicar sem ouvir? Ela não quer ter membros externos que possam dar uma visão diferente da dos magistrados? Que comunicação é essa que já começa cerceando a própria comunicação? Mas isso foi compreendido pelos colegas, tanto que, depois, mesmo quem propôs uma comissão só de magistrados votou pela formação mista. Isso era essencial. Não adiantaria iniciar uma comissão dessa natureza com uma mentalidade de fechamento, enclausuramento.
ConJur — Quem são os membros externos?
Luiz Fernando — Temos o advogado Sérgio Tostes, o cientista político Joel Rufino dos Santos e o jornalista Guilherme Fiúza. O advogado, porque representa a sociedade civil. A OAB, afinal, tem uma representatividade muito grande. Basta lembrar a campanha “Diretas Já”, o impeachment do presidente Fernando Collor e outros grandes movimentos recentes na história do país. Além disso, o advogado é quem se depara com os obstáculos, com o que está funcionando bem, ou não, no tribunal. Já o cientista político nos dá um tipo de avaliação para a qual nós, magistrados, não estamos preparados. Podemos até ser entusiastas da ciência política, saber a importância dela, mas não termos a capacidade de realizar essas análises. Era fundamental ter esse viés dentro da comunicação. E, finalmente, do jornalista, por razões evidentes. É o jornalista quem vai nos dar a visão da imprensa em relação a nós.
ConJur — Como ficou a composição final?
Luiz Fernando — Ela se completa com três desembargadores — todos, vale dizer, com alguma experiência anterior em comunicação, como é o caso de Jessé Torres e Fernando Foch, que exerceram a profissão de jornalistas antes de entrar na magistratura, sendo que Foch preside, atualmente, o Fórum Permanente de Direito à Informação e Política de Comunicação do Poder Judiciário (da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro), e Claudia Telles, que trabalhou por 12 anos como advogada das Organizações Globo. Além deles, temos o juiz Luiz Alberto Ayoub; a ouvidora-geral do Poder Judiciário, juíza Andréa Pachá; e a assessora de imprensa Luzia Giffoni, que passou a ser diretora-geral de comunicação.
ConJur — A Comissão já tem resultados concretos?
Luiz Fernando — Sim, o programa “Informação Legal”, na Rádio Tupi. É um quadro diário, de segunda a sexta, em que magistrados respondem a todo tipo de pergunta jurídica dos ouvintes. A ideia nasceu dentro da Comci. Com a coordenação do desembargador Fernando Foch, selecionamos cerca de 40 juízes das mais variadas competências e formamos um cadastro. Como o objetivo é prestar um serviço de utilidade pública e esclarecer todas as dúvidas possíveis, procuramos os presidentes do Tribunal Regional do Trabalho e do Tribunal Regional Federal para que seus magistrados também integrassem a equipe, garantindo que as questões trabalhistas, previdenciárias e outras, específicas desses tribunais, pudessem ser respondidas. O nome do programa tem um evidente duplo sentido, pois a intenção é, justamente, desmistificar os assuntos jurídicos. É legal você saber mais sobre o que envolve um despejo, um divórcio, uma guarda de criança. O programa é comandado por um comunicador bastante popular, o Heleno Rotay. Tem bastante audiência, o que só aumenta nossa responsabilidade.
ConJur — O juiz está acostumado com uma linguagem própria em seu trabalho, o chamado “juridiquês”, com seus jargões característicos, muitas vezes indecifráveis para quem é leigo. Há alguma orientação sobre a linguagem a ser usada no programa?
Luiz Fernando — Desde que começamos, em janeiro, a orientação é usar a linguagem mais informal e acessível. Não tem latinório nem data vênia. Porque não adianta você dar uma resposta em “juridiquês”, ninguém entende. E tem que ser curto. As respostas são todas gravadas e não passam de quatro minutos.
ConJur — A mesma recomendação vale para a elaboração de decisões? Como está a linguagem adotada pelos juízes em seus despachos?
Luiz Fernando — Mudou radicalmente. Uma das razões foi a grande multiplicação de processos, que exige maior objetividade. No estado do Rio, nós temos um acervo de mais de 9 milhões de processos. Entram por ano entre um e dois milhões de casos. Se não julgarmos mais de um milhão e meio de processos a cada ano, o acervo vai aumentar. Diante desse cenário, a objetividade se torna uma necessidade vital. Mas também existe a compreensão de que é preciso escrever de modo que as partes do processo não precisem de um tradutor, que em geral é o advogado, para entender o que foi decidido.
ConJur — Usar uma linguagem acessível também faz parte da democracia?
Luiz Fernando — Isso passa pela linguagem e pela difusão do conhecimento. Tem que ser um conhecimento acessível a todos. Que conhecimento é esse que privilegia somente quem detém o domínio da linguagem?
ConJur — Estudiosos das mídias sociais afirmam que o acesso à informação tende a radicalizar a democracia, ao empoderar os cidadãos para a fiscalização dos atos do poder público, como, por exemplo, o destino do dinheiro arrecadado. Qual é o papel do Judiciário nesse cenário?
Luiz Fernando — O Judiciário tira proveito disso quando socializa a comunicação por meio da informatização. Antes, só tínhamos os processos físicos. Hoje temos os eletrônicos. Na hora em que o Judiciário socializa a informação, atinge a sua finalidade. Quanto mais fácil o acesso aos processos eletrônicos, mais o Judiciário atende a essa finalidade. E aí voltamos àquela vinculação do Judiciário com a democracia: um poder que é concebido para, não sendo eleito pelo povo, garantir os direitos fundamentais. De onde o Judiciário tira a sua legitimidade? O Executivo e o Legislativo têm eleições periódicas, uma espécie de purgação de pecados de quatro em quatro anos. Esses Poderes, quando são submetidos ao crivo de uma eleição, estão de certa forma se relegitimando. O Judiciário, por sua vez, não tem sua legitimidade nas eleições. Mas nem por isso é menos legítimo. Nessa hora, a Constituição garante o equilíbrio perfeito. Teria que haver um poder, que não extraindo sua legitimidade das urnas — logo, da vontade da maioria — zelasse pela integridade da Constituição e de todos os direitos fundamentais.
ConJur — Essa legitimidade se renova?
Luiz Fernando — Diariamente. Quando eu uso uma linguagem acessível para quem veio me pedir jurisdição, estou fazendo minha parte na prestação de contas. A Constituição determina que um dos princípios fundamentais da Administração Pública, nos três Poderes, é o da publicidade. Evidentemente que publicidade, aqui, não é no sentido da propaganda, mas de tornar pública a sua atuação. A regra geral é que as decisões e os processos sejam públicos. Note que o segredo de Justiça é uma exceção, só usado em Direito de Família e em casos muitos especiais. Porque aquilo que é secreto é adversário da democracia. Se você tem um segredo, quem tiver a chave dele está dominando. E quem não tem acesso à chave, está sendo dominado. Nesse cenário, o Poder Judiciário seria usado para a dominação, uma espécie de manipulação das pessoas, uma face bastante perversa, incompatível com sua natureza. O Judiciário só se justifica para garantir os direitos fundamentais e assegurar a integridade da Constituição. Essas finalidades são de interesse público. O Judiciário não serve a si mesmo. Isso justifica que ele tenha uma estatura de poder, porque se o Legislativo, por exemplo, votar uma lei que fere princípios da Constituição, o Judiciário pode, por meio do Supremo Tribunal Federal, declará-la inconstitucional.
ConJur — “Enxugar gelo” é uma expressão muito usada por magistrados para descrever o desafio de enfrentar a alta demanda de processos que chegam todos os dias. Apesar do esforço, a percepção geral ainda é a que a Justiça é morosa. De que forma a transparência das informações pode ajudar a mudar isso?
Luiz Fernando — Justamente por isso a tarefa da comunicação não pode ser entendida num sentido restrito. Nossa comunicação tem que se preocupar também em estudar e divulgar os meios alternativos de prestação de Justiça, como a conciliação, a mediação e a arbitragem. É preciso haver uma combinação. Você não pode restringir o acesso à Justiça por causa da judicialização excessiva em algumas áreas. Afinal, essa é uma conquista irreversível da democracia. O papel da comunicação do Judiciário é, inclusive, divulgar e estimular procedimentos extrajudiciais que, ao desafogar o processo judicial, vão permitir que ele tenha maior agilidade. E aí entramos na questão da qualidade. Hoje, estamos diante de uma quantidade tão opressiva de processos que não há como dimensionar a qualidade da jurisdição oferecida. Se o objetivo passou a ser a pressa, a linha de produção, a qualidade perde espaço. E como se recupera isso? Só conjugando práticas judiciais e não judiciais de resolução de conflito. Porque o que interessa é resolver o conflito e obter a pacificação social. Se foi por processo judicial, por arbitragem, mediação ou conciliação, é secundário. A nossa comunicação não é só a divulgação do que fazemos ou deixamos de fazer, mas também mostrar que o gargalo só será superado com a massificação dos meios extrajudiciais. Só assim a dignidade da jurisdição será restaurada.
ConJur — Os tribunais estão lidando bem com a Lei de Acesso à Informação?
Luiz Fernando — Acredito que sim. A lei recebeu uma divulgação grande nos meios de comunicação. Aquilo que podia não estar tão em evidência, passou a ter. A Comci já preparou, inclusive, o anteprojeto de resolução regulamentando a lei para o Poder Judiciário do Rio. Ele está tramitando no Órgão Especial. A lei abrange muitos pontos, sempre em torno da transparência, mas ela pede regulamentação em aspectos que não detalha, mas que na hora do pedido de informação podem ser necessários.
ConJur — A divulgação dos salários dos servidores tem sido objeto de controvérsia.
Luiz Fernando — Isso tem sido muito discutido no Legislativo, mas também no Judiciário. O Tribunal do Rio já colocava no site a remuneração dos seus servidores e dos seus magistrados. Mas há uma decisão do STF, que está vigorando, pela qual é preciso informar o nome ao lado do salário. Não basta dizer que um juiz substituto e um desembargador ganham tanto, tem que identificar um a um. Isso gerou problemas sérios de privacidade, como, por exemplo, pedidos de pensão baseados nessa informação. Então, isso mexe com um equilíbrio muito delicado entre o direito do cidadão à informação e à transparência e o direito desse mesmo cidadão, na outra ponta, à sua privacidade. Afinal, o que me interessa como cidadão é saber quanto ganha o senador ou o desembargador, ou quanto fulano ou beltrano? Aqui, no TJ-RJ, começou a surgir pedidos curiosos de ex-mulheres, dependentes. O pedido não era feito para atender a uma generalidade do direito da informação, mas para atender um interesse específico. Isso desvirtua, não é interesse público.
ConJur — Além do programa de rádio, a Comci tem outros objetivos?
Luiz Fernando — Temos um projeto de visita às redações de jornais e estúdios de rádio e TV para promover reuniões informais com as equipes de jornalistas. A ideia é explicar o que é a comissão e nos colocarmos à disposição para qualquer questionamento acerca do Poder Judiciário. É mais uma iniciativa para diminuir o fosso entre Judiciário e imprensa. Nós constatamos, ao longo dos anos, que havia realmente um fosso de desconhecimento recíproco entre magistrados e jornalistas. Não é que essa relação não vai ter nunca algum curto-circuito. Estou falando de algo estrutural, um desconhecimento quase que atávico. Como se fossem duas instituições, que embora sejam essenciais para o funcionamento da democracia, funcionassem estanques. Essas visitas às redações serão informais. Não vamos dar aula, apenas esclarecimentos. Acredito que até onde seja possível, nós, magistrados, devemos esgotar as possibilidades de diálogo com a imprensa. Porque havia, genericamente, uma demonização recíproca entre Judiciário e imprensa. Mas o jornalista está ali a serviço de um direito à informação, que é um direito fundamental do cidadão. A liberdade de imprensa não é um valor só para o jornalista, é um valor fundamental para toda a humanidade. Da segunda metade do século XX para cá, verificou-se que a liberdade de imprensa está umbilicalmente ligada ao direito à informação verdadeira. E só se pode ter informação verdadeira se o país respeitar a liberdade de imprensa. Há situações que não se justificam, como essa decisão que impede o jornalO Estado de S. Paulo de mencionar o nome de Fernando Sarney, filho do senador José Sarney [Fernando foi investigado na operação barrica, da Polícia Federal, noticiada pelo jornal]. Como proibir de mencionar o nome de uma pessoa? O STF já derrubou a Lei 5.250, a Lei de Imprensa, num julgamento histórico, mostrando que ela era incompatível com a Constituição de 1988. E o Judiciário, do seu lado, tem que ter sua independência preservada para poder atuar, inclusive para garantir o trabalho da imprensa. Tem uma frase antológica, de cujo autor agora não me recordo o nome, que diz assim: “Se tivesse que escolher entre ter um governo e uma imprensa livre, não pensaria duas vezes: ficaria com a imprensa livre”. As principais decisões que você toma na vida são baseadas em informações que você recebe da imprensa.
ConJur — Há pontos em comum no trabalho do Judiciário e da imprensa?
Luiz Fernando — Existem muitas convergências, mas há uma distinção no campo filosófico. O jornalista trabalha contra o tempo, enquanto o juiz precisa de algum tempo para ouvir as partes, colher as provas e amadurecer sua decisão. Se o jornalista for usar o mesmo tempo de maturação, a matéria cai, perde a atualidade. Os jornalistas, muitas vezes, têm que colocar o bloco na rua de qualquer maneira, do contrário, a notícia pode escapar. Já o juiz precisa daquele tempo para fazer seu trabalho democraticamente. O jornalista gostaria de dispor de mais tempo, mas, na maioria das vezes, não pode. Por sua vez, se o juiz não usar seu tempo, pode cercear o direito de uma parte de produzir uma prova, por exemplo. Por isso, eu não acredito somente na velocidade como solução para o Judiciário. O juiz tem que garantir um processo efetivamente dialético, democrático, que não resulte de uma concentração excessiva de poderes. A pior ditadura seria a ditadura de juízes, pois se exerceria à sombra da lei e da Constituição. Mas o Judiciário é um poder vocacionado para garantir as liberdades e eis aí uma das convergências com a imprensa. Jornalistas também são vocacionados para garantir as liberdades. Uma pessoa mais informada é mais livre. Pelo menos, na pior das hipóteses, ela sabe que estão tentando ludibriá-la.
Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj com informações do ConJur