A cúpula da comissão de reforma do Código de Processo Civil se reuniu na semana passada para alterar alguns pontos do projeto original, cujo relatório deve ser votado pela Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (17/4). Entre as alterações, está a manutenção da norma atual sobre o efeito suspensivo da apelação. Segundo o projeto original, a sentença do juiz deveria ser executada, independentemente da apresentação de recurso.
O efeito suspensivo não seria regra, mas poderia ser concedido pelo julgador caso a caso. Para Benedito Cerezzo Pereira Filho, advogado do escritório Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados e membro da comissão de juristas que preparou o anteprojeto do novo CPC, “a resistência ao novo sempre foi fator preponderante no que tange as alterações legislativas e o projeto em questão é exemplo vivo dessa realidade”.
Cerezzo destaca que a sentença de primeiro grau continuará como se fosse um “mero parecer” sobre o caso, pois a verdadeira decisão ficará a cargo do tribunal. “O duplo grau de jurisdição, além de não ser garantia constitucional, atenta contra o sistema na exata medida em que não permite a produção de efeitos concretos na vida dos litigantes antes de o tribunal verificar o acerto ou não da decisão proferida em primeira instância. A bem da verdade, o juiz de primeiro grau não decide nada, pois sua decisão estará sempre sob a censura do tribunal, como se o juiz fosse incapaz de exercer a jurisdição”, afirma.
Para Cerezzo, a alteração no projeto, se vier a ser aprovada, “será um golpe no projeto original e na população de um modo geral, que anseia por um sistema processual que dê, efetivamente, uma resposta à ameaça ou lesão ao direito”, conclui.
José Carlos Baptista Puoli, sócio do escritório Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados e professor-doutor de Direito Processual Civil na USP, discorda. Para Puoli, a alteração feita pela comissão é elogiável. “Revigorar o efeito suspensivo das apelações é medida correta por evitar a insegurança que passaria a ser disseminada caso fosse mantida a ideia de dotar de eficácia imediata de sentenças ainda passíveis de revisão”, afirma.
Na avaliação da advogada Ana Carolina Remígio de Oliveira, sócia do Marcelo Tostes Advogados e coordenadora da área Cível, a alteração feita pelos deputados, mantendo o efeito suspensivo dos recursos de apelação, “privilegia a segurança jurídica e a economia processual, já que não é incomum ocorrer a reforma das decisões de primeiro grau pelos tribunais”. Mas, para a advogada, a subtração do efeito suspensivo dos recursos de apelação, apesar de visar acelerar o cumprimento das decisões proferidas, “poderá criar um grande tumulto nos casos em que houver a reforma da decisão, além de ignorar por completo o consagrado direito ao duplo grau de jurisdição”.
Reintegração de posse
Outro ponto debatido na reunião diz respeito à norma que obriga o juiz a fazer uma audiência de conciliação entre governo, Ministério Público, defensores públicos e donos das terras antes de analisar a reintegração de posse nos conflitos por terra ou imóvel. O relator já recuou da proposta original, limitando essas audiências aos casos em que o proprietário demorar mais de seis meses para pedir a reintegração de posse. Ainda assim, alguns deputados, principalmente ligados ao agronegócio, querem ampliar esse prazo para um ano.
Segundo Baptista Puoli, limitar esse procedimento a casos em que o proprietário demorar mais de seis meses para pedir a reintegração de posse atenua, mas não resolve a situação. O ideal, para ele, seria a eliminação completa dessa etapa que adia a proteção possessória. “Condicionar a concessão de liminares possessórias em caso de invasão por grupos de pessoas, a que seja feita prévia e complexa etapa ‘conciliatória’ é esvaziar o direito à posse de imóveis e estimular as invasões de terra. Trata-se de regra que, ao contrário de atingir o propósito supostamente pacificador, irá estimular esse tipo de conflito e ainda impedir que o poder do Judiciário possa fazer sua função constitucional de, liminarmente, analisar as situações e resolver os casos em que estiver nítido o caráter ilícito da invasão”, destaca.
Ainda falta consenso sobre como tratar da penhora online de bens. A prática permite o bloqueio de dinheiro diretamente em conta corrente como garantia de que os valores em discussão na Justiça serão pagos. A maior preocupação é que o congelamento do capital de giro das empresas acabe inviabilizando a atividade comercial. Para Baptista Puoli, o uso da penhora online, com o bloqueio de contas bancárias, banalizou-se nos últimos anos e tem sido fonte de inúmeros casos de injustiça.
Fonte: Conjur