A UPP ruiu e os canais de diálogo firmados com as comunidades não existem mais
* Artigo de Robson Rodrigues da Silva (Antropólogo e ex-chefe do Estado-Maior Geral da PMERJ)
A segurança pública entrou em crise no Rio. Aumentaram os roubos, confrontos entre facções, tiroteios, vítimas de balas perdidas, morte de policiais e letalidade policial. Tudo indica que este ano ultrapassaremos as 5 mil mortes intencionais. Após a expectativa gerada pela pacificação, o sentimento de medo aumentou consideravelmente diante do fracasso das UPPs, sinônimo da pacificação no imaginário popular.
Para piorar, não há sinais de reação do governo, que se prostra diante das crises que se abateram sobre o Estado e de criminosos cada vez mais dispostos a matar. Saímos de um otimismo eufórico para uma depressão paralisante. Por que falharam programas que vinham baixando os índices de criminalidade violenta? Para a Secretaria de Segurança, o motivo foi a crise financeira. A explicação não se sustenta. A crise pode até ter incrementado os problemas de hoje, mas eles já despontavam lá atrás, antes mesmo de ela se instaurar.
Os dividendos políticos da pacificação não resultaram em modernização das organizações policiais. A PM não teve as estruturas reformadas. Não se investiu na capacidade investigativa da Polícia Civil para a melhora das taxas de esclarecimento de crimes. O resultado foi que a UPP ruiu. A violência letal voltou a crescer em favelas pacificadas. A polícia logo retornaria às velhas práticas baseadas na repressão bruta.
Os indicadores já vinham apresentando aumentos desde 2013. O problema é que agora dispararam sem qualquer perspectiva de reação efetiva do Estado. 2017 tem sido catastrófico. Se nada for feito para interromper a escalada de violência, poderemos reviver os piores momentos da série histórica, cujo ápice se deu nos anos 90 (65 homicídios/100 mil habitantes) – em 2015, caiu a 18/100 mil na capital, menor taxa em 25 anos.
A UPP depende sensivelmente da confiança das pessoas e dos próprios policiais. Essa base de sustentação é frágil diante dos riscos de os territórios a qualquer momento se instabilizarem, seja por ação equivocada da polícia seja por ação violenta de criminosos. O caso Amarildo iniciou a derrocada que derreteria rapidamente a legitimidade da UPP. O envolvimento em corrupção do ex-governador Sérgio Cabral e as suspeitas sobre o atual, Luiz Fernando Pezão, aceleraram a fragilização moral do governo. Esse vácuo político não passou despercebido pelas facções. A retomada criminal foi inevitável.
Os casos de corrupção envolvendo policiais de UPP e conflitos com moradores de comunidades pacificadas aumentaram as tensões. Não houve reação eficiente para o controle desses desvios, levando os moradores a desacreditar cada vez mais no projeto. Os canais de diálogo que começaram a se pavimentar no início da UPP acabaram calcinados.