AMAERJ | 26 de outubro de 2017 16:50

Revista FÓRUM: ‘Nós temos leis, e elas têm que ser cumpridas’, diz Marcello Rubioli

Em entrevista o juiz Marcello Rubioli explicou como o Juizado do Torcedor tem combatido a violência no esporte

FÓRUM: Por que os índices de violência não diminuíram após a Copa do Mundo e as Olimpíadas?
Marcello Rubioli: Pela falta de profissionalismo. Faltou entender que as melhorias para a Copa e a Olimpíada nada mais foram do que estruturais, não estruturantes. Criou-se um modelo aprovado internacionalmente, mas, por cima dele, foi reproduzido um modelo antigo já defasado e que permite não só a violência física, como a própria violência jurídica do consumidor, envolvendo desvio de ingressos, lavagem de dinheiro, entre outros delitos. O desrespeito ao Estatuto do Torcedor é outro fator para isso. Não temos ingressos numerados, a biometria e a transparência na arrecadação das verbas também não foram implementadas.

FÓRUM: Por que não?
Rubioli: Porque não interessa aos clubes e às federações. Temos um modelo de atividade esportiva muito fincada nas entidades de organização de desporto. Então, não é de interesse dos clubes, federações e da CBF ser fiscalizado. Só que nós temos leis, e elas têm que ser cumpridas.

FÓRUM: As organizadas são o principal causa da violência nos estádios?
Rubioli: A torcida organizada não é a única causa, apesar de ser a que mais chama a atenção, por serem os elementos de frente, uma espécie de infantaria da violência no esporte. Não podemos nos esquecer do incentivo dos clubes a essas facções e o endeusamento da figura desses grupos. É uma questão mais de mentalidade do que simplesmente das organizadas.

FÓRUM: Como diminuir a violência no esporte?
Rubioli: A transparência é o caminho. É um ato mais de governança do que efetivamente uma solução. Saber quais pessoas estão gerenciando os clubes, quem são os torcedores violentos, quais são as torcidas organizadas, quem são os cambistas, como é feita a venda e a administração dos ingressos e para onde eles são destinados.

FÓRUM: Torcida única e a suspensão das torcidas organizadas é um caminho viável?
Rubioli: Não. Tenho minhas reservas ao banimento e à extinção desses grupos, porque, quem pratica violência, vai continuar praticando, independentemente de qual organizada faz parte. A torcida única foi uma medida eficaz para um determinado momento do Rio. É uma opção, mas não é a solução.

FÓRUM: Por que tivemos tantos problemas nos jogos entre Botafogo e Flamengo?
Rubioli: Esse clássico se tornou o mais problemático, e os dirigentes dos clubes têm quase total parcela de culpa nisso. É notório que eles incentivam a rixa, dão ingressos para as organizadas e empregam integrantes no quadro de funcionários. É um modelo que só beneficia as diretorias e os membros de organizadas.

FÓRUM: O grande número de casos de violência este ano surpreendeu o Juizado?
Rubioli: A violência estava de certa forma dominada. Mas detectamos, sim, um incremento dela, o que é preocupante. Toda medida que o Juizado do Torcedor tem tomado para minorar a violência não tem sido alvo de chancela pelo próprio Poder Judiciário. Nós temos que contar primeiramente com a conscientização interna do próprio Poder.

FÓRUM: Como implementar no Brasil os procedimentos adotados na Inglaterra contra os hooligans?
Rubioli: O paralelo é equivocado. As constituições anglo-saxãs primam sempre pela defesa da coletividade. Já a nossa é tipicamente individualista. Se preocupa com garantias e direitos individuais em detrimento das garantias coletivas. Na Inglaterra a mera individualização já gerou o banimento do torcedor. Aqui, preciso do devido processo legal e de uma ampla defesa. Mesmo assim, não temos a figura do banimento, só o afastamento temporário.

FÓRUM: Como combater os cambistas?
Rubioli: A lei penaliza muito brandamente, muitas vezes punindo com uma cesta básica, o que acaba mais incentivando do que reprimindo a conduta criminosa. Eles também são um núcleo comercial das torcidas e de vários dirigentes. É um delito que precisa ser agravado.

Veja aqui a íntegra da revista FÓRUM.