A necessidade de adaptação à Constituição Federal de 1988 e de modernização dos códigos legais — muitos deles com algumas décadas de existência —, aliada às recentes tormentas pelas quais vêm passando a política nos últimos tempos, aumentam a pressão sobre o Congresso na reforma de importantes conjuntos de leis que regem a vida e os negócios no país.
A iniciativa começou em 2008, quando o então presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), decidiu revisar as codificações legais. Para realizar a reforma, Sarney decidiu criar comissões de juristas para orientar os parlamentares coma elaboração de anteprojetos para cada código. A primeira delas foi a comissão que reviu o Código de Processo Civil (CPC), instalada em 2009 e cujo projeto está em fase final de análise na Câmara dos Deputados, já tendo sido aprovada no Senado.
De lá para cá, tramitam no Congresso, projetos de reforma dos códigos Penal; Comercial; de Defesa do Consumidor; e o Eleitoral. Além desses temas, outros projetos que não entraram na lista de revisões, mas foram introduzidos no Parlamento, foram o Código Florestal, já aprovado, e o Código de Mineração, encaminhado pelo Governo, cujo regime de urgência constitucional foi retira dona última segunda-feira por meio de mensagem presidencial.
Para o advogado Caio L. B. Rodrigues, especialista em processo legislativo, essas revisões,que ainda estão em debate, algumas na Câmara outras no Senado, estão promovendo uma revolução perigosa no conceito de Estado brasileiro. “O que surge como a razão dessa sanha recodificadora é a adaptação da legislação brasileira à Constituição de 1988”, diz o advogado. No entanto, ele alerta que, no debate, duas correntes do Direito que se interpõem acabam por dar um novo norte à legislação. Uma dessas correntes seria a do neoconstitucionalimo, que coloca a corte constitucional no centro das posições do poder, fazendo do STF um órgão político. A outra corrente seria a dos garantistas, que defende o Estado Democrático de Direito. Nesse embate, diz o advogado, está vencendo a corrente neoconstitucionalista.
“Está se dando, de barato, a transição do Brasil Estado Democrático de Direito pra o Brasil Estado Constitucional,como se isso fosse natural, sem uma discussão mais profunda”, opina Caio Rodrigues, que é responsável por assuntos legislativos do escritório Mattos Muriel Kestener. Ele cita como exemplo dessa transição as alterações feitas ao artigo 1º do Projeto de Reforma do CPC, ao determinar que “o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código”. Com essa reformulação, no entender do especialista, o Código deixa de ser lei imposta ao juiz e passa a ser mero acessório à interpretação que o juiz dê, a partir da leitura que fizer da Constituição, aos atos e fatos do processo a ele submetido. “O Processo Civil, que sempre foi uma garantia do cidadão contra o poder do juiz, passa, agora, a ser um acessório a um instrumento que lhe confere poder maior, que é a Constituição”, argumenta.
Em seu entender, o novo Código de Processo Civil tem chances de ser aprovado entre o final deste ano e abril de 2014. “É o único projeto que está maturado o suficiente para promover alterações no Código”, diz, ao afirmar que alterações nesse tipo de legislação são complexas e devem levar ao menos cinco anos de discussão. O novo Código Civil, recorda, passou 25 anos sendo discutido, até que fosse aprovado em 2002. Entre todas as reformas, a que acha ser menos provável que ocorra de fato é a do Código Eleitoral. Isso porque, para aprovar, os parlamentares teriam que votar contra os seus próprios interesses.
“Esta é uma composição de interesses contraditórios. Neste caso, o interesse público colide frontalmente como interesse partidário”, afirma.
Fonte: Brasil Econômico