O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, recentemente, rejeitou a primeira de três listas sêxtuplas remetidas pela OAB-RJ, cada uma com seis advogados nominados. O Tribunal deveria selecionar três nomes para a formação de uma lista tríplice que seria enviada ao chefe do Poder Executivo para escolha de um e sua consequente nomeação no cargo de desembargador.
O processo de escolha do chamado quinto constitucional é idêntico para todos os tribunais do País. Nos tribunais superiores, a exceção do STF, o processo é similar, guardando peculiaridades próprias.
A existência do chamado quinto constitucional decorre de preceito constitucional. Desta forma, um quinto dos cargos dos tribunais estaduais e federais de segundo grau deve ser ocupado por advogados e membros oriundos do Ministério Público.
Para os advogados, o art. 94 da Constituição Federal exige notório saber jurídico, reputação ilibada e prática funcional efetiva nos últimos dez anos. Para os candidatos provindos do Ministério Público, o legislador constitucional, ciente do dificílimo concurso para ingresso na carreira, exigiu apenas dez anos de prática.
Este sistema surgiu com a Constituição Federal de 1934, no artigo 104, § 6º, sendo mantido por todas as Cartas posteriores. Sempre se disse que o objetivo era oxigenar o Judiciário com a vivência e experiência próprias daqueles oriundos de outras instituições.
Restrita a análise aos candidatos advogados, tem-se observado pelo País afora, a imensa dificuldade que os Tribunais têm para selecionar os três nomes que comporão a lista tríplice. Não raro, listas sêxtuplas são recusadas porque os indicados pela OAB não preenchem os requisitos constitucionais.
Já aconteceu em São Paulo e no próprio Estado do Rio. O próprio Superior Tribunal de Justiça, com imensa dificuldade, levou mais de dois anos para selecionar advogados para as últimas vagas abertas. E por que isto? Porque se constata que a OAB nem sempre atenta para os requisitos exigidos constitucionalmente, o que coloca os Tribunais na constrangedora situação de rejeitar listas.
A responsabilidade pela escolha deve ser compartilhada. Inadmissível que órgão de classe dos advogados, que tanto se empenha pela defesa da sociedade, que luta contra as injustiças e, com razão, reclama contra inobservância dos princípios federativos, dos princípios da moralidade e da eficiência, não se dê conta de que da lista remetida sairá um magistrado, que terá o compromisso apenas com a Lei e com a Justiça, numa forte integração de ambas, atento a sua consciência moral, social e ética.
Quando a OAB indica nomes que não tem preparo jurídico suficiente para ingresso na magistratura, verifica-se um real desrespeito, primeiramente, à sociedade, mas também ao cidadão que tem na Justiça o ancoradouro seguro da esperança, pronto para lhe reparar a injustiça.
Os Tribunais não podem se curvar aos nomes enviados quando não representem boas opções de escolha, sob pena de, em não agindo assim, serem meros cabides de emprego, atendendo apenas à satisfação do ego vaidoso daqueles que pensam que julgar personifica um poder divino. Não o é!
E mais, quando a OAB forma uma lista sêxtupla sem atentar para a qualidade dos seis advogados, acaba por retirar dos Tribunais o seu direito constitucional de escolha, pois só lhe restarão aqueles poucos e exclusivos nomes.
Os tempos são outros. Se desejarmos uma sociedade moderna, justa e balizada por valores éticos e de boa moral, é bom que se comece a refletir e modificar métodos. Isto passa, também, pelo Poder Judiciário. Uma nova geração de magistrados está aí, atenta para o que se passa no dia a dia do cidadão, que quer, além de uma Justiça rápida, uma Justiça de qualidade, digna, transparente, porque sabe que sua falta destes elementos enfraquece qualquer instituição.
Os magistrados de carreira passam por árduo processo seletivo, sem qualquer intervenção política. O concurso é de provas e títulos. Examina-se o perfil psicológico. Exige-se conduta social irreprovável. Conduta moral ilibada. Tomam posse e permanecem em curso, até que possam assumir uma comarca. Todo o processo seletivo é acompanhado por magistrados mais experientes. Ainda assim, vez por outra, surgem notícias lastimáveis e os jornais estão aí para a constatação.
O cuidado no processo seletivo a todos interessa. Sabe-se que a Ordem o faz internamente, mas talvez o processo adotado não esteja atendendo as finalidades da Lei Maior.
Os bons candidatos são bem-vindos. Até agora, se tem conseguido trazer bons nomes e as escolhas têm sido felizes, mas cada vez se verifica maior dificuldade na seleção.
Se os bons advogados não estão interessados em integrar o Poder Judiciário pelo quinto constitucional, então é melhor que se pense na sua extinção, para que cada um exerça o seu papel na sociedade brasileira – advogados são advogados; promotores de justiça são promotores de justiça e magistrados são magistrados, cada qual por seu ideal funcional.
*Ricardo Rodrigues Cardozo é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
(Publicado no Jornal do Commercio no dia 2/02/2011)