A história negra viva na oralidade e na arquitetura da cidade do Rio de Janeiro foi revisitada neste sábado (20), Dia da Consciência Negra. Na “Caminhada Negra” da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), magistrados e familiares percorreram um trecho do espaço conhecido como Pequena África.
A guia Raquel Oliveira, do grupo Sou + Carioca, conduziu o grupo a partir do MAR (Museu de Arte do Rio), na Praça Mauá, por ruas e vielas de rica história na Saúde e na Gamboa, bairros próximos ao Centro do Rio, na zona portuária.
“Esta é a herança africana no Rio. ‘Pequena África’ é um termo cunhado pelo multiartista Heitor dos Prazeres [1898-1966] […] e abrange bairros como Saúde, Gamboa, Santo Cristo, Estácio, Cidade Nova, chegando na beira de São Cristóvão”, contou a guia no início do tour de três horas.
“Com as obras recentes na região, muito foi descoberto em termos arqueológicos. Assim vemos o modo como lidamos com o nosso passado, com muita coisa sendo encoberta, escondida, propositalmente invisibilizada. O trabalho dos grupos de turismo é fazer esse resgate e tornar cada pessoa que faz os passeios conhecedora e multiplicadora e um fator de mudança nessa realidade”, afirmou.
O Morro da Conceição, a Igreja de São Francisco da Prainha e o Largo de São Francisco da Prainha, com suas atrações históricas e culturais, foram os primeiros locais a serem visitados. Outro ponto de efervescência cultural, a Pedra do Sal foi a parada seguinte. O Jardim Suspenso do Valongo e o Cais do Valongo, que detém o título de Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), foram pontos de grande interesse do grupo. O circuito foi finalizado no Mural Etnias, de 2.500 m², na fachada de um antigo armazém do Cais do Porto pelo grafiteiro Eduardo Kobra. Pintado nas Olimpíadas de 2016, representa os cinco continentes.
O grupo foi composto pela desembargadora aposentada do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) Ivone Ferreira Caetano e seu marido, Maurício Caetano; a juíza da Vara de Execuções de Medidas Socioeducativas, Lucia Glioche, e seu marido, o empresário Rafael Fernandes; o juiz da 2ª Vara Cível de Maricá, Vitor Porto, e seu irmão, Isaac Porto, assessor do programa LGBTI do Instituto Internacional Raça, Igualdade e Direitos Humanos; e o juiz Marcelo Piragibe, do TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais).
“[O passeio] Foi muito importante para romper com uma série de apagamentos históricos que tem se repetido ao longo do tempo, mas também como forma de perceber e reafirmar que não estamos falando de uma história que ficou no passado. […] Estamos o tempo inteiro na reencenação desta história”, afirmou Isaac.
Seu irmão, o juiz Vitor Porto, concordou: “Quando crescemos e na nossa formação, pouco disso é ensinado. É muito importante um passeio turístico nos mostrar onde aconteceu tanta história nossa”.
O magistrado Piragibe destacou que, por ser “de geração mais antiga, a história da África foi omitida das grades curriculares. Cerca de 57% da população brasileira se identifica com a cultura afro-brasileira e há um desconhecimento muito grande”.
Para a magistrada Lucia Glioche, “o passeio mostrou a história contada na versão atual. Pudemos vivenciá-la passando nos locais onde aconteceu, vendo na arquitetura como tudo aquilo que pensamos ser antigo ainda é atual. Nós, juízes, devemos ser sempre incentivados a estudar a história de todos os povos, principalmente do povo negro, que contribui”.
O encontro promovido pela AMB para auxiliar no resgate e na valorização da história e cultura negras ocorreu em mais cidades: Brasília (DF), São Paulo (SP), Piracicaba (SP), Salvador (BA), Olinda (PE), São Luís (MA), Ouro Preto (MG), Campo Grande (MS), Curitiba (PR) e Porto Alegre (RS).