Notícias | 12 de fevereiro de 2014 14:57

A visão ambiental e seus aspectos

* Sidney Hartung Buarque

Noticiou-se na época do Natal do ano que passou triste e lamentável episódio verificado em nossa cidade, que foi um ato de vandalismo e irresponsabilidade praticado por um casal no início da madrugada de 25 de dezembro, que picharam a estátua de Carlos Drummond de Andrade com tinta branca. Além deste fato comprovado por câmera do centro de operações da prefeitura, acontecimento semelhante teria ocorrido quanto à estátua situada no Leblon, no final da praia, do jornalista Zózimo Barrozo do Amaral, saudoso colunista do antigo Jornal do Brasil. Na verdade, não foram casos isolados, porque em diversas ocasiões têm sido atingido os monumentos públicos. Inclusive em várias ocasiões ocorreram furtos dos óculos do poeta o que, infelizmente, se tornou fato corriqueiro.

Pelo conteúdo da matéria conclui-se que se trata de típica hipótese de crime ambiental nos termos da Lei 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Em seu artigo 65 da lei em evidência, o legislador estabelece a pena de três meses a um ano de detenção, cumulada com multa para aquele que pichar, grafitar ou por outro meio conspicar edificação o monumento urbano. O fato em si tem muita semelhança com o tipo penal contido no artigo 163 do Código Penal, que tipifica o crime de dano, sendo que com o advento da lei ambiental a matéria está regida por este novo diploma legal, que em boa hora consagrou a punibilidade decorrente das atividades que venham a causar danos ambientais. Não se olvide que o artigo 225 da Constituição Federal impõe ao poder público e à coletividade o dever de defesa e preservação do meio ambiente.

Na ocasião em que ocorreu aquele fato, muitos me indagaram por que o ato de pichar uma estátua seria considerado crime ambiental, já que em nenhum momento agrediu a natureza, não ocorrendo qualquer dano à flora e a fauna. A resposta facilmente justifica o tratamento dado pelo legislador quanto às características do crime ambiental, isto porque a proteção ao meio ambiente não se limita à natureza, estendendo sua tutela não só ao meio ambiente natural, mas também quanto ao aspecto artificial e cultural, protegendo os espaços urbanos, bens públicos, edificações e o patrimônio intelectual. A legislação tem sido bem atuante na defesa do equilíbrio ambiental a que todos têm direito, e logicamente assim se considera pelas disposições que amparam a política nacional do meio ambiente em conformidade com a Lei 6.938/81, dispositivo legal que desenvolveu de forma genérica a proteção ambiental em todos os seus aspectos.

 
A lei infraconstitucional ao agasalho da norma constitucional do citado artigo 225 abriga a prática ambiental em uma multiplicidade de bens juridicamente protegidos, se estendendo a três aspectos tradicionalmente considerados: o aspecto natural, com a defesa da fauna e flora, estendendo-se por evidência a defesa,dos recursos hídricos,},0] ar atmosférico e todos os fatores naturais cuja conservação se torne essencial para a sobrevivência, bem definido pelo artigo 3o da lei acima mencionada, que preceitua que se considera o meio ambiente o conjunto de condições, leis e influências e interações de ordem físicas, químicas e biológicas, permitindo abrigar e reger a vida em todas as suas formas.

Mas a desenvoltura da tutela ambiental amplamente atinge a outros valores essenciais em nosso ambiente social, notadamente nos aspectos urbanos e culturais, pelo que a abrangência das normas ambientais se projeta além da própria natureza. Modernamente, inclusive, muitos têm entendido que devem também ser considerados componentes do meio ambiente as condições de trabalho e o patrimônio genético. Devemos ter em conta que em nosso dia a dia há uma interação permanente envolvendo uma séria de acontecimentos e situações contidas na natureza. Embora nem todos os estudiosos do Direto Ambiental comunguem desta amplitude dos seus aspectos, é bom lembrar a diversidade de fatores que se interligam no meio ambiente. A nossa intenção, inclusive, nas próximas colunas é de desenvolver detalhadamente este tema, fazendo uma apresentação destes aspectos relacionados com o equilíbrio ambiental e sua repercussão na sociedade.

*Sidney Hartung Buarque é desembargador, presidente da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Direito Civil, presidente do Conselho Consultivo da Escola Superior de Administração Judiciária (Esaj) e professor titular da Emerj

Fonte: Monitor Mercantil