Os diagnósticos apresentados pelas pesquisas “Quem somos. A Magistratura
O vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, abriu na manhã desta segunda-feira (17) o seminário “A magistratura que queremos”, promovido pela Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ). A fala improvisada e descontraída do ministro, futuro presidente da Corte máxima do Judiciário brasileiro, empolgou as cerca de 500 pessoas que […]
A pesquisa “QUEM SOMOS. A MAGISTRATURA QUE QUEREMOS” foi encomendada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) à PUC-Rio, aos mesmos pesquisadores que realizaram, há 22 anos, o primeiro grande estudo sobre o perfil da magistratura nacional.
A participação da AMAERJ na atual pesquisa se deu desde a idealização e o planejamento.
Em 28 de fevereiro de 2018, houve em nossa Sede Administrativa a primeira reunião dos integrantes da Comissão Organizadora.
Na ocasião, estudamos o questionário anterior e discutimos quais seriam as novas indagações apresentadas aos magistrados.
O resultado ficou pronto. Saibam, com profundidade, quem é o juiz brasileiro.
Renata Gil, presidente da Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro
Os pesquisadores Luiz Werneck Viana, Maria Alice Rezende de Carvalho e Marcelo Baumann Burgos, do Departamento de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio).
A comissão da pesquisa foi publicada em 28 de fevereiro de 2018, quando se iniciaram os trabalhos na sede da AMAERJ, através de estudos do questionário anterior e proposições atinentes ao tempo atual...
Prezados Senhores, a pesquisa “Quem Somos. A magistratura que queremos”, que consolida respostas a cerca de 4 mil questionários enviados a magistrados brasileiros...
Alguns destaques eu gostaria trazer. Para o bom exercício da prestação jurisdicional, 70% dos magistrados no 1º grau e um pouco mais de 80% no 2º grau assinalaram a importância...
Em linhas gerais, o que eu queria dizer é que, há cerca de 20 anos, foi lançado este primeiro trabalho, que é o Perfil do Magistrado Brasileiro...
Admirável mundo novo. O título remete ao livro referência, escrito por Aldous Huxley e publicado em 1932, que narra a história de uma sociedade futurista...
A sensação de um pesquisador quando conclui um trabalho, mostra, dá publicidade a ele, agora com vocês, é uma experiência muito particular. Não que, pensando nisso, essa pesquisa foi feita por uma tróica...
O que seria o perfil da magistratura, do ponto de vista socioeconômico e também do ponto de vista das tentativas de ingresso na carreira, e associado com a socialização do ponto de vista acadêmico?
A partir do título “Quem somos. A magistratura que queremos”, afinal, quem é a magistratura? Qual é a conclusão, ou a principal conclusão que vocês pesquisadores atingiram com essa pesquisa?
A pesquisa “QUEM SOMOS. A MAGISTRATURA QUE QUEREMOS” foi encomendada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) à PUC-Rio, aos mesmos pesquisadores que realizaram, há 22 anos, o primeiro grande estudo sobre o perfil da magistratura nacional.
A participação da AMAERJ na atual pesquisa se deu desde a idealização e o planejamento. Em 28 de fevereiro de 2018, houve em nossa Sede Administrativa a primeira reunião dos integrantes da Comissão Organizadora.
Na ocasião, estudamos o questionário anterior e discutimos quais seriam as novas indagações apresentadas aos magistrados.
O resultado ficou pronto. Saibam, com profundidade, quem é o juiz brasileiro.
Por sorte e obra do destino, o grupo anterior se reuniu, a pedido do presidente da AMB Jayme de Oliveira, agora sob a coordenação do ministro Luis Felipe Salomão, e minha sub coordenação, em comunhão de ações com os juízes Durval Rezende, de São Paulo, da juíza Micheline Jatobá, da Paraíba e de Marcia Hollanda.
A comissão da pesquisa foi publicada em 28 de fevereiro de 2018, quando se iniciaram os trabalhos na sede da AMAERJ, através de estudos do questionário anterior e proposições atinentes ao tempo atual.
Procuramos trazer o recorte das diversas regiões do país, das justiças federal, trabalhista e estadual.
Durantes as reuniões discutimos os prognósticos do Poder Judiciário do futuro.
Optamos por organizar um questionário mais longo, que demandou de 40 a 60 minutos para resposta, mas que absorveria com mais profundidade o pensamento, as preocupações e os anseios dos magistrados.
As questões censitárias foram necessárias para o estudo comparativo com a pesquisa anterior, resultando em confirmações de dados coletados recentemente pelo denominado “Censo do Poder Judiciário”, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça.
A convivência com o Prof. Werneck Viana foi extremamente gratificante. Me sinto privilegiada. O professor Werneck durante todos os nossos encontros dizia que Poder Judiciário deveria se voltar para sua força institucional, enxergando o cenário de renovação política que ocorreu, lendo claramente o comportamento da sociedade antes do pleito eleitoral de 2018.
Os pesquisadores Maria Alice e Marcelo Burgos, verdadeiros professores, nos brindaram com o toda a memória da pesquisa anterior e com o seu conhecimento cientifico para que o trabalho atingisse os standards de validade e idoneidade. Amigos que levo para a vida.
A vivencia do Ministro Salomão, profundo conhecedor da magistratura, juiz de carreira, quem trabalhou na alta administração do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, foi presidente da Associação dos Magistrados do Rio de Janeiro, um dos melhores segundo avaliação dos próprios colegas, se tornou desembargador e então ministro do Superior tribunal de Justiça, foi fundamental para legitimação do trabalho, com direcionamentos importantes para que atingíssemos os pontos certos.
O Min. Antonio Saldanha participou de todas as reuniões, trazendo sua expertise para o grupo. Da mesma forma, os juízes Durval, Micheline e Márcia, reconhecidamente magistrados referencia em seus estados, trouxeram a contemporaneidade exigida para o retrato atual da magistratura. Formulavam e reformulavam perguntas, traziam temas atuais e descartavam enfoques ultrapassados.
Tivemos aproximadamente 4000 respondentes e aqui registro o agradecimento aos pares da Justiça federal e da justiça trabalhista, nas pessoas dos presidentes Fernando Mendes e Guilherme Feliciano que, em esforço conjunto, envolveram nossos colegas na pesquisa.
Ao presidente Jayme de Oliveira, visionário e homem de habilidade impar para a condução da magistratura nacional, deixo o meu agradecimento pela oportunidade de me deixar conhecer tão profundamente magistratura brasileira.
Jayme durante todo o ano, mesmo com inúmeras atribuições, cuidou do questionário pessoalmente, participava do processo decisório e das reuniões, seja de forma virtual, seja presencial, quando sua agenda permitia. Entrega hoje um trabalho perene e que servirá durante anos como fonte de informações para a sociedade e ate mesmo como base para teses e pesquisas outras. Um marco em sua gestão.
Como dirigente de classe a responsabilidade aumenta com o diagnostico que hoje é tornado público.
Precisaremos avançar na questão da saúde dos magistrados. Pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina e da Escola Politécnica da USP afirmou que a falta de reconhecimento dificulta o trabalho de juízes, concluindo que “é preciso mudar com urgência a coisificação das pessoas e valoriza-las, disso dependendo a saúde de todos”. Prossegue afirmando que “a grande responsabilidade existente nesta profissão é que toda e qualquer ação tem impactos significativos na vida dos cidadãos, fato que aumenta em muito a responsabilidade do que fazem e que permite compreender porque ficam tão expostos na sociedade. Conclui: “o risco de se isolar e, sobretudo, de se constituírem cenários propícios para o sofrimento patogênico persiste”. (Ano 49 – Edição nº 87 – Saúde, USP)
Tal análise restou confirmada na medida em que, no capitulo da rotina profissional, foram apresentadas algumas assertivas para que o respondente indicasse seu grau de concordância. Quanto à afirmação de que “atualmente, os(as) magistrados(as) estão mais estressados(as) do que no passado” quase 97% dos juízes de 1º grau e 94% dos de 2º grau concordaram, pouco ou muito. Diante da assertiva que diz que “os casos de depressão, síndrome do pânico, crises de ansiedade e suicídio são mais frequentes hoje do que há dez anos”, 95% dos juízes de 1º grau e 88,4% dos de 2º grau concordam pouco ou muito. Uma terceira assertiva diz o seguinte: “o aumento da litigiosidade na sociedade brasileira, e a consequente ampliação da atividade dos(as) magistrados(as) exige uma política voltada para a saúde do(a) magistrado(a)”. Quase 99% dos juízes de 1º grau e 97,2% dos de 2º grau concordaram pouco ou muito com ela.
Outro ponto importante foi o que tratou da segurança dos magistrados. As respostas revelaram que os magistrados entendem que a escolta pessoal ´e muito importante, mas que a alteração do horário forense não interfere muito em sua segurança. O resultado deste capitulo será muito importante na reavaliação das medidas já implementadas e na criação de outras mais efetivas, inclusive pelo CNJ, que tem um órgão destacado para tal tarefa.
Questões judiciais relevantes foram abordadas, como o plea bargain, a prisão após condenação em segunda instância, audiências de custódia, quinto constitucional.
Passaremos pelos estados divulgando pessoalmente os resultados e coletando as impressões pessoais que impulsionarão a outra etapa do trabalho, qual seja, a formulação de novas políticas associativas e políticas públicas.
Temos em mãos um rico material que servirá de base para inúmeros outros estudos, para sabermos exatamente quem somos hoje e como queremos nos ver no futuro. Como sempre digo, a instituição Poder Judiciario é gigante e meu respeito por ela é infinito. Entretanto, mais importante que ela, são os homens que a compõem, que dedicam suas vidas para entregar justiça. Que tenhamos mais e mais instrumentos para aperfeiçoar a justiça brasileira, para melhorar a qualidade de vida e de trabalho dos magistrados, de modo que possamos pacificar e tornar feliz a convivência social.
Prezados Senhores, a pesquisa “Quem Somos. A magistratura que queremos”, que consolida respostas a cerca de 4 mil questionários enviados a magistrados brasileiros, almeja contribuir para o aprimoramento da Justiça e o fortalecimento da magistratura, apresentando a visão que temos da nossa carreira, bem como as novas estratégias a serem utilizadas para o melhor funcionamento do poder a que pertencemos.
Dessa forma, temos a oportunidade de participar do processo de criação de novas diretrizes para o Poder Judiciário
Todo Juiz tem de compreender e estar consciente de que, ao proferir um voto, ao fazer um pronunciamento judicial, está lançando um grão de areia na edificação da Democracia brasileira. Manter a supremacia da ordem jurídica constitui obrigação do Judiciário, pois só assim estará servindo à defesa dos ideais perenes da nossa cultura: o predomínio do valor ético, a legitimação da autoridade pela sua subordinação à Justiça.
Ser juiz é uma opção de vida, na qual, pela própria natureza da carreira, tudo é efêmero. Estamos continuamente de passagem. Não há lugar para projetos pessoais e protagonismo, mas devemos, obedientes às leis, cumprir nossos deveres como julgadores e gestores.
Além de pertencermos ao poder responsável pela solução dos conflitos, devemos representar um ponto de equilíbrio para a sociedade, assegurando a organização básica, a convivência pacífica e os direitos aos vulneráveis. Raras são as profissões que exigem tanta serenidade como a dos juízes. E raras – os tempos atuais estão mostrando – têm tido tanta importância para o respeito ao Estado Democrático de Direito.
No contexto em que vivemos no Brasil, cabe a cada um de nós perceber as consequências da crise e contribuir para minorá-las. O que nos toca fazer como cidadãos? E, principalmente, colegas magistrados, o que nos compete como membros do Poder Judiciário?
O italiano Piero Calamandrei, um dos mais renomados juristas da história, dizia que para encontrar a justiça é necessário ser-lhe fiel, pois, como todas as divindades, ela só se manifesta a quem nela crê.
Por sua vez, prossegue Calamandrei, o juiz é o direito feito homem: “Só desse homem posso esperar, na vida prática, aquela tutela que em abstrato a lei me promete. Só se esse homem for capaz de pronunciar a meu favor a palavra da justiça, poderei perceber que o direito não é uma sombra vã. Por isso, indica-se na iustitia (justiça), e não simplesmente no ius (direito), o verdadeiro fundamento regnorum (fundamento do império) – pois se o juiz não for vigilante, a voz do direito permanecerá evanescente e distante, como as inalcançáveis vozes dos sonhos” (Eles, Os Juízes, Vistos por um Advogado – Ed. Martins Fontes, página 12).
Prefaciando o trabalho do Desembargador Nalini, o Ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Veloso registra: “conheço juízes que proferem magníficas sentenças e votos, que estão com o serviço em dia. São excelentes juízes, mas ficam apenas nisto. Outros, que também proferem sentenças e votos notáveis, vão mais longe. Percebem que a Justiça é lenta, emperrada, distante do povo, com o que não se conformam. Querem, então, melhorá-la, querem-na atuante, viva, fazendo felizes as pessoas. Estes são os verdadeiros juízes, os grandes juízes…” (O Juiz e o Acesso à Justiça – Ed. RT, 1994, página 3).
Cada um de nós há de lembrar que construir a paz é missão também da Justiça. Construir a paz social significa garantir a cidadania com equilíbrio, e para alcançar tal desiderato precisamos manter nossa unidade e coesão, sem prescindir de uma magistratura independente.
O Judiciário deve ser capaz de solucionar conflitos de conteúdo social, político e jurídico. Devemos produzir Justiça e contribuir para o equilíbrio social na nossa esfera de atuação. Para que façamos isso, não podemos permitir, sob nenhum pretexto, a violação de prerrogativas dos magistrados, que atuam como guardiões dos direitos fundamentais e da cidadania. Para que alcancemos a necessária dimensão de nossas funções, temos uma cartilha básica, indispensável e insubstituível: a nossa Constituição da República.
Sigamos atuando firme e serenamente, em busca de Justiça para os que dela necessitam, tendo nossas decisões respeitadas como essência do Estado Democrático de Direito, com o qual temos um compromisso inarredável, cientes de que apenas com um Judiciário forte e infenso a pressões é que a cidadania brasileira encontrará abrigo para buscar o seu desenvolvimento com paz social.
Bom dia a todos.É com imensa satisfação que estou hoje aqui no Rio de Janeiro para participar do lançamento deste importante estudo sobre a magistratura brasileira, que atualiza, para os dias de hoje, substancial e pioneira pesquisa realizada nos idos de 1996.
Aliás, como constou do texto de apresentação desta obra, redigido pelo Presidente da AMB, Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto e pelo Ministro do STJ, Luis Felipe Salomão, estamos em face de algo raro, no meio acadêmico, pois ambas essas pesquisas, embora realizadas no intervalo de mais de 20 anos, foram conduzidas praticamente por uma mesma equipe de pesquisadores, sob a condução deste que é um dos maiores cientistas sociais brasileiros, Luiz Werneck Vianna Trata-se de trabalho de fôlego e de suma importância para todos que se dispõem a analisar e tentar compreender quem são, o que pensam e como agem os integrantes da magistratura nacional.
E o espaço de tempo de mais de 20 anos, decorrido desde que realizada a primeira pesquisa, permite que se façam interessantes observações sobre as mudanças experimentadas pelo Poder Judiciário e pela própria sociedade brasileira, agora que já completamos mais de 30 anos de regime democrático, inaugurado com a promulgação de nossa Constituição Federal de 1988.
Conforme destaquei no artigo “O Poder Judiciário através da História”, publicado na obra....:
Ao impulso da História, a Justiça brasileira passou por profundas mudanças. Foram muitos os desafios e os obstáculos e, em que pese as interrupções autoritárias, vivenciamos um processo contínuo de amadurecimento e fortalecimento das instituições e da democracia brasileira. Temos muito o que comemorar, mas há ainda muito o que transformar.
O Poder Judiciário de hoje é diferente daquele pré-Constituição de 1988 – o qual se encontrava mantido na “estufa” pelo regime autoritário, para utilizar a expressão de Werneck Vianna, quando basicamente se limitava à função tradicional de resolução de conflitos individuais entre os particulares ou entre os cidadãos e o Estado, aplicando a lei aos casos concretos específicos.
A Constituição de 1988, atendendo o clamor do povo brasileiro - sedento por Justiça -, elencou um extensivo rol de direitos e garantias individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e de minorias. Para assegurar o cumprimento e a efetividade deles, a Carta Cidadã conferiu plena independência aos magistrados e total autonomia ao Poder Judiciário, o qual passou a exercer um papel proeminente na vida social, econômica e política brasileira.
A Justiça contemporânea passou, portanto, a ser, cada vez mais demandada para resolver questões de grande complexidade, sejam elas de natureza social, ética, cultural, econômica ou política. No Brasil, o Judiciário saiu daquela “estufa” que o inibiu por décadas e conquistou seu espaço na sociedade e na vida cotidiana do cidadão, passando a atuar constantemente no primeiro plano da vida pública.
Com a TV Justiça, ele adentrou o lar das famílias brasileiras. Com julgamentos televisionados, suas decisões passaram a ser submetidas não apenas aos controles recursais, mas ao escrutínio público, sendo aplaudidas por uns e desaprovadas por outros, como é próprio das democracias. Como órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal não é mais “esse outro desconhecido” dos tempos de Aliomar Baleeiro e de sua clássica obra.
Diante da inevitável expansão do protagonismo judicial, o apelo das ruas e o clamor social devem ser catalisados pela Justiça como mecanismos de controle social, aos quais originariamente se devem atentar todas as instituições de um Estado Democrático de Direito”.
Bem por isso, merecem destaque alguns tópicos do presente trabalho, como a compreensão da grande maioria dos entrevistados (em percentual superior a 80%), no sentido de que se mostra desejável a utilização de linguagem acessível, nas audiências e sessões dos Tribunais, para que todos possam bem compreender o que está sendo discutido, bem como da necessidade da conciliação prévia, em matéria de direito civil e de família.
Igualmente parece não haver mais dúvidas de que o processo judicial eletrônico se mostra como a mais premente iniciativa a ser tomada, no sentido de modernização do Poder Judiciário, seguido de perto pelo julgamento virtual de recursos.
Também merece destaque o fato de que a grande maioria dos juízes entende ser legítimo socorrer-se de princípios constitucionais para compelir os demais poderes a assegurar a efetividade dos direitos, especialmente quanto à saúde, educação e segurança.
Tais resultados parecem convergir com a compreensão que temos sobre o moderno papel da Justiça brasileira, expresso em meu discurso de posse na presidência do STF, em que elenquei como chaves da transformação do Poder Judiciário, a eficiência, a transparência e a responsabilidade.
Encerro relembrando o que destaquei na abertura do ano Judiciário de 2019, no Plenário do STF:
“Nosso Judiciário é um dos mais produtivos do mundo. Cada um dos 18 mil juízes brasileiros decide, em média, 1.819 processos por ano - 7,2 casos solucionados por dia útil. Agradeço o grande esforço de cada um dos magistrados, dos servidores e dos colaboradores do Poder Judiciário pela dedicação, pelo comprometimento e pela perseverança em realizar a Justiça na vida dos cidadãos”.
Parabenizo todos os pesquisadores que trabalharam na concretização deste trabalho, na pessoa do Professor Werneck Viana, aos magistrados que tornaram possível sua realização, nas pessoas do Presidente da AMB, Jayme Martins de Oliveira Neto e daPresidente da AMERJ, Renta Gil e ao Ministro Luis Felipe Salomão, coordenador da comissão científica.
Bom dia a todos.
Primeiro o meu agradecimento especial ao ministro Dias Toffoli, que se dispôs a vir ao Rio nesta apresentação, e, na pessoa dele, eu saúdo todos os componentes e integrantes da mesa, que já foram nominados pelo Cerimonial.
Podemos colocar uma pequena apresentação que eu preparei. Fica um pouco mais fácil de entender. Mas, em linhas gerais, o que eu queria dizer é que, há cerca de 20 anos, foi lançado este primeiro trabalho, que é o Perfil do Magistrado Brasileiro. Este é o único exemplar que eu guardo comigo.
Foi feito isso na gestão do então desembargador à época Paulo Galotti, que era presidente da AMB, com essa equipe de pesquisadores que, 20 anos depois, nós resgatamos e conseguimos reeditar. Segundo eles, na sociologia, no campo da sociologia, é muito raro de acontecer, é muito raro.
Então, nós pegamos este material como base e o atualizamos para o ano de 2019. Com um ano de trabalho, vocês viram há pouco na fala da presidente Renata Gil. Os trabalhos tiveram início em fevereiro de 2018 e em fevereiro agora, de 2019, nós estamos entregando os resultados.
O trabalho não termina agora. Na verdade, o trabalho começa agora. E é com base nesses resultados que nós teremos a oportunidade de nos aprofundarmos e compararmos com bastante profundidade os dois materiais. Este anterior e este que ora se apresenta à imprensa e à magistratura em geral. É agora que começa o grande esforço.
Hoje nós estamos fazendo uma entrega formal e solene ao presidente Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, porque muito do que tem aqui diz respeito, senão tudo, diz respeito diretamente às atividades do Conselho Nacional. E este material, no nosso ponto de vista, servirá muito para as atividades do próprio Conselho, da Associação e do Supremo Tribunal Federal.
Então, hoje ele recebe, formalmente, depois vou entrgar uma assinada por todos. Pessoal, essa é para o senhor guardar. Depois vamos encaminhar ao Supremo, às bibliotecas todas. O senhor vai receber esta que é o resultado do trabalho desta equipe, de um ano, e o senhor foi o grande incentivador, porque, quando levamos para o senhor a ideia, o senhor disse que seria muito importante e muito útil para uma reflexão sobre a magistratura brasileira. Então, o senhor recebe formalmente este material para discutir agora com o Conselho, com a magistratura, com toda a magistratura brasileira, estas reflexões que os juízes estão trazendo neste material.
Não posso deixar também de fazer um agradecimento muito especial ao ministro Salomão e à Renata Gil, que foram os coordenadores, e à nossa equipe de trabalho, a Márcia, a Micheline e o Durval, além dos nossos três pesquisadores, que ficaram na linha de frente deste trabalho e se apaixonaram pelo projeto e que hoje estão vendo o resultado, ou pelo menos parte deste resultado, que agora vamos para as reflexões.
Fiz uma pequena apresentação, muito rápida. Apenas para que vocês tenham uma ideia. Renata Gil já fez algumas referências. São apenas alguns dos resultados que vocês poderão observar, além desses que já foram citados.
A pesquisa é muito grande. Ela hoje está disponível no site da AMB, para acesso público. Todo o material, está tudo lá, disponível desde hoje de manhã no site da AMB. Vocês poderão pesquisar diretamente ou baixarem, se tiverem interesse. E ela foi feita por recorte.
Aqui estou apresentando os resultados mais globais, mas ela está toda recortada por Justiça Federal, do Trabalho, Justiça Estadual, Militar, primeiro grau, segundo grau. É bastante interessante.
Aqui, por exemplo, neste primeiro quadro, o quadro 25, que corresponde ao questionário 25, nós perguntamos da presença de símbolos religosos em ambiente judiciário. A afirmação foi feita neste sentido. Visa manter a tradição e infundir paz e respeito entre os litigantes sem ferir o princípio da laicidade do Estado. Um tema que vez ou outra volta à imprensa, saber se devemos ou não manter os crucifixos. Essa pergunta diz respeito exatamente a essa questão.
Os resultados, vocês observam, que da primeira instância até os tribunais superiores, vai havendo um aumento de concordância com a afirmação. Revelando o seguinte: que a magistratura mais nova é mais dividida em relação a isso, são 56% contra 43%, e os mais antigos, as pessoas com mais tempo de carreira, vão concordar 85% com essa afirmação.
Quando se compara esse resultado com uma outra questão, que é a da religiosidade, vamos encontrar alguma semelhança. Não coloquei esse quadro aqui, mas há uma indagação sobre a religião dos magistrados. No comparativo de 20 anos, os católicos saem de 80% para algo em torno de 60%, 65%. Isso pode se refletir também nesse resultado que estamos vendo aí.
Uma segunda questão que vira e mexe também está em voga, que é a pergunta 26, quando questiona se os ministros do Supremo Tribunal devem ser indicados para cumprimento de mandato. Uma questão que vira e mexe também é discutida na impresa. Aí nós vamos ter também uma aprovação a esse novo modelo que vai de 56% no primeiro grau até 65% entre os ministros dos tribunais superiores.
Uma outra questão, a pergunta 30, se os magistrados do segundo grau devem se submeter igualmente às corregedorias de tribunais a que estão vinculados, também ganha uma aprovação da magistratura acima de 80%, com exceção dos juízes de segundo grau, porque é justamente deles que se fala. Ainda assim uma concordância de quase 60% no segundo grau.
O sistema de videconferência, que é a pergunta 35, que está agora nesse projeto recém-apresentado à imprensa pelo ministro Sergio Moro, da Justiça. Quando ele fala no sistema de videoconferência. A nossa pergunta foi se o sistema de videoconferência para a realização de interrogatório e instrução do processo deve ser integrado ao sistema processual penal.
Aí veio uma aprovação de 96% entre os juízes de primeiro grau, 91% entre os aposentados e 94% entre os ministros dos tribunais superiores. Revelando que o sistema de videoconferência é hoje um anseio da magistratura. Por isso, quando saiu o pacote de medidas do ministro Sergio Moro, esta foi uma que a magistratura apoiou de pronto, sem prejuízo de discutir as demais.
Mas essa foi uma que mereceu imediata adesão.
Tanto quanto a seguinte, a pergunta 38, da transação penal, este sistema que também está no pacote de medidas do ministro Sergio Moro, com uma observação: desde que com a participação do Poder Judiciário.
Este sistema de transação penal pode ser feito de duas maneiras. Uma só pelo Ministério Público ou o Ministério Público e o Poder Judiciário. Ou seja, sob controle juridiscional, desde que a transação seja submetida ao juiz, não apenas para mera e formal homologação, mas que o juiz possa questionar os termos do acordo, devolver, recusar.
Isso tudo tem aprovação expressiva da magistratura brasileira, como vocês observam, 89% do primeiro grau, 92% do segundo, também entre os aposentados 90% e 82% de concordância dos ministros dos tribunais superiores.
Duas medidas recentes, isso nós perguntamos há um ano atrás, mas agora o pacote de medidas do Ministério da Justiça vem trazendo estas situações.
Não vou apresentar todas, vou gastar muito tempo aqui, vou pular, portanto, a 46, professor Werneck vai falar disso. A 47 diz também respeito, foram solicitados aos magistrados que indicassem três alternativas para tornar o funcionamento do Judiciário mais eficiente. No âmbito do primeiro grau as quatro alternativas mais citadas foram essas: a primeira do quadro 47 foi a alteração da competência do Supremo Tribunal Federal para que atue apenas como corte constitucional.
Essa foi uma das mais citadas por todos os segmentos: Justiça Estadual, Federal, Militar e Trabalhista.
A segunda, que está no quadro 47, foi a limitação do efeito suspensivo no recurso, revelando que a magistratura brasileira tem sérias preocupações e anseia efetividade no sistema processual.
A terceira resposta indicada pelos juízes: limitação aos recursos judiciais. Ou seja, a rediscussão sobre o sistema de recursos, um repensar o sistema de recursos. A questão aí é: temos muito recursos ou não? Para a magistratura, parece que sim.
E, por último, a efetiva independência e autonomia dos tribunais em relação aos seus orçamentos também foi citada como uma das condições para um melhor funcionamento do Poder Judiciário.
Termino apenas com mais uma observação, sobre o sistema de súmulas vinculantes, no quadro 56. Foram indagados se o sistema de súmulas em precedentes vinculantes garante maior velocidade e segurança jurídica à atividade jurisdicional. Ou seja, uma melhor racionalização do Judiciário. Nesse caso a concordância também foi expressiva: 86% no primeiro grau, 91% no segundo grau, 87% entre os aposentados e 100% entre os ministros dos tribunais superiores.
Essa pergunta, quando comparada com a anterior, os juízes, em matéria de súmulas vinculantes, responderam duas coisas interessantes. Uma: eles reconhecem que o sistema de súmulas de alguma forma limita sua atividade interpretativa. Mas, em outra questão, diz: limita, mas racionaliza o sistema. Isso, então, é o que merece reflexão e é sobre esse tipo de situação que a magistratura brasileira vai agora vai se debruçar para discutir e encontrar o melhor caminho.
Existiriam outras, mas não vou me estender muito com esse assunto, até porque vários dos quadros que preparei para vocês serão agora abordados nas falas dos demais integrantes da mesa, dos sociólogos. Então, eu deixo que eles cuidem dessa segunda parte.
Eu só quis chamar a atenção de dois ou três pontos para que vocês percebessem o grau de profundidade do trabalho e o grau de reflexão que vai levar a magistratura a fazer, o CNJ, o próprio Supremo e todos aqueles que, de alguma maneira, se preocupam com a efetividade do sistema, com um Judiciário melhor, mais valorizado e mais forte institucionalmente.
Com estas palavras eu reiteiro os meus agradecimentos a todos aqueles que participaram desta pesquisa, especialmente aos nossos sociólogos, que fizeram isso há 20 anos e agora conosco. Ao ministro Salomão, que esteve na primeira pesquisa e que agora foi o coordenador dessa pesquisa.
Espero que o material seja útil e vocês possam se debruçar sobre ele, seja a imprensa, seja a propria magistratura e o Conselho para que a gente avance pelo caminho de um Judiciário mais forte e valorizado.
Muito obrigado
Admirável mundo novo. O título remete ao livro referência, escrito por Aldous Huxley e publicado em 1932, que narra a história de uma sociedade futurista, em que seus habitantes passam por um pré-condicionamento biológico e psicológico para que vivam em harmonia com as leis sociais e com um sistema de castas. A história se passa em Londres no ano 2540 (632 DF- "Depois de Ford" - no livro), o romance antecipa desenvolvimentos em tecnologia reprodutiva, hipnopedia, manipulação psicológica e distopia, que se combinam para mudar profundamente a sociedade.
É, pois, neste mundo novo que parece extremamente relevante uma reflexão sobre o momento atual do Poder Judiciário, sobre o rumo até aqui, e – claro - as estradas a serem percorridas.
Lembrei-me da escultura retratando a imagem do Deus romano Jano, que chama a atenção no Museu do Vaticano. Destronado, Jano passou a ser dotado de rara prudência, permitindo que visse sempre o passado e o futuro diante de seus olhos, motivo pelo qual é representado com duas caras voltadas em sentidos inversos. O mês de janeiro (januarius), ao qual o rei Numa deu o seu nome, era consagrado a Jano. Deus romano das mudanças e transições, Jano é o Deus dos “inícios, das decisões e escolhas”. Mas é também o Deus da paz, da reflexão, assim acreditavam os antigos.
Não foi por acaso que escolhemos este início de ano de 2019 para trazer a público a Pesquisa “Quem somos: a magistratura que queremos”, após quase um ano de trabalho profícuo envolvendo juízes e sociólogos. A equipe dos Professores Luiz Werneck Vianna, Maria Alice Rezende de Carvalho e Marcelo Balmann Burgos é praticamente a mesma da pesquisa anterior – “O perfil do Magistrado brasileiro” -, apresentada há mais de duas décadas. Naquela época, como juiz substituto, participei com entusiasmo da elaboração dos questionários, e acompanhei com vibração cada descoberta sobre o avanço da pesquisa. Agora, a partir do convite do Presidente da AMB, Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto, tive a honra de coordenar o grupo de magistrados, constituídos pelos colegas Durval Rezende Filho Marcia Hollanda, Michelini Jatobá e Renata Gil.
Na verdade, desde o pós guerra (1945), o mundo vem experimentando o que se denomina de judicialização da vida, talvez uma reação à barbárie do conflito e às atrocidades ali cometidas contra os direitos fundamentais. A resposta da humanidade foi buscar soluções às contendas de maneira civilizada.
No Brasil, a judicialização foi ainda mais acentuada diante da Constituição analítica de 1988 – em que se buscou a inserção de direitos após a retomada da democracia –, em um cenário de ausência de políticas públicas e privadas efetivas para soluções extrajudiciais de conflitos. Na maioria dos países desenvolvidos, as políticas de arbitragem, mediação e outras formas adequadas de resolução de conflitos já ocorriam há bastante tempo.
Na minha trajetória profissional de mais de 30 anos, talvez este seja o momento mais difícil para o Judiciário. É o poder garantidor dos direitos individuais, ao mesmo tempo em que é aquele que tem que aplicar as penalidades para as pessoas que se distanciam do cumprimento da lei. O ideal de que a lei deve atingir a todos, como pressuposto do regime democrático.
Essa tensão está nítida na quadra atual, neste milênio da pósmodernidade e das relações liquidas2. Um tema mais do que frequente é o do ativismo, a pauta é a autocontenção judicial ou a escolha de um modo proativo de interpretar as leis (e a Constituição), especialmente com o surgimento nos trópicos do que se denominou neoconstitucionalismo.
Ao comentar sobre Justiça e Democracia, Antoine Garapon3, com uma incrível antevisão da história, em um livro de 1996, aborda alguns temas recorrentes no atual momento:
a) a República compreendida pelo Direito;
b) a desnacionalização do direito e a nova cena da democracia;
c) a tentação populista do poder inédito dos juízes;
d) os processos instruídos pelos médias e a lógica do espetáculo.
Na trincheira do contencioso judicial, o Juiz é responsável direto pela aplicação correta da lei, pela segurança jurídica e pelo restabelecimento da paz social, abalada pelo conflito.
A pesquisa “Quem Somos: a magistratura que queremos”, para além da visão puramente censitária, procurou aprofundar os temas centrais.
Assim é que buscou entender as causas, para os magistrados, do emperramento da prestação jurisdicional. Indagou sobre as premissas utilizadas para a fundamentação das decisões judiciais e tentou colocar a descoberto o que os juízes pensam sobre a relação do Judiciário com os demais Poderes, com a Sociedade e com a Democracia. Tratou de ritos e símbolos das audiências e indagou sobre as formas de controle interno. Mergulhou fundo na rotina profissional do juiz para entender suas angústias e fragilidades.
A pesquisa que ora se apresenta é uma ferramenta importante, pretende fornecer subsídios dos Juízes Brasileiros para elaboração e implementação de políticas públicas no âmbito do sistema Justiça.
É um contributo com base científica que certamente será objeto do escrutínio criterioso daqueles que buscam o aperfeiçoamento da democracia em nosso país.
Bom dia, senhoras magistradas, senhores magistrados, público em geral.
A sensação de um pesquisador quando conclui um trabalho, mostra, dá publicidade a ele, agora com vocês, é uma experiência muito particular. Não que, pensando nisso, essa pesquisa foi feita por uma tróica. O prejuízo agora de sua apresentação, ter que segmentar pontos, é um sentimento de justiça nosso que, para os três pesquisadores, tinham que estar aqui, compartilhando esse prazer que é expor o seu trabalho ao público. Marcelo, Maria Alice foram vitais nesse trabalho, como foram há 20 anos atrás, embora Marcelo fosse muito garoto, era até meu aluno. Mas sempre muito competente, muito dedicado. Antes como agora. Talvez até mais antes do que agora.
O registro sobre os 20 anos atrás, nós e a pesquisa. O clima de encantamento, de busca, me levou a uma viagem maluca pela Espanha, atrás de bibliografia, numa cidade perdida que levei horas para alcançar de carro, e a bibliografia que encontrei lá foi fundamental para o nosso trabalho de pesquisa. Fui num dia para a Espanha, voltei no outro, de tal forma era a nossa paixão pelo que estávamos fazendo. Paixão essa que encontrava uma recepção muito forte, muito intensa entre os juízes que participaram conosco daquela pesquisa e que faço questão de nomear agora. Nossos mestres, nossos incentivadores. Miranda Rosa (in memorian), Luiz Fernando, Doris Castro Neves, Felipe Salomão, ainda um juiz em fase juvenil e Thiago Ribas, nosso santo protetor. Um elenco de primeira ordem. Foram os nossos professores nessa matéria.
Agora, com outros juízes de outra geração, também tivemos o nosso aprendizado. Com a doutora Renata, doutor Jayme, doutora Márcia Hollanda, Durval Rezende, todos aqui presentes. Ainda o Salomão, que resiste, e o ministro Saldanha Palheiro, que agora se junta a nós. E também ajudaram a compor, a aperfeiçoar o questionário, para ver se conseguíamos devassar qual a realidade da vida do juiz.
Agora, um exercício começa a ser feito, como sabemos, em uma situação absolutamente eloquente, doutor Jayme de Oliveira. E começa a explorar as possibilidades analíticas dessas funções práticas que ele pode ter. Acho que doutor Jayme, o senhor hoje iniciou um seminário público que deve se disseminar, que deve se difundir. Esse livrinho, belamente aqui editado por vocês, e que pode ser aliviado desse tamanho com um sumário expandido que a professora Maria Alice preparou.
Pequenos grupos de estudo para examinar essa realidade, do ponto de vista micro e do ponto de vista macro, do que é a magistratura hoje no Brasil. Há 20 anos atrás, a Constituição ainda viçosa, cheia de promessas, mobilizava o Judiciário como ator, o guardião daquelas promessas, e, ao mesmo tempo, em alguns institutos novos, o facilitador delas: mandado de injunção e outras inovações que o constituinte tinha nos deixado e que a Constituição trouxe à luz. Momento de fervor, de auge, com a presença do Judiciário na cena brasileira.
De lá para cá, muita pedra rolou nesse rio, uma certa volúpia do Judiciário em transformar o mundo voltou-se contra ele próprio. Um ativismo imoderado. Não que o ativismo seja algo condenável, mas é dessas práticas que devem, dessas doutrinas, dessas teorias, que devem ser usadas com moderação. E dependendo das circunstâncias, que o Judiciário não existe solto no mundo, ele está aí, nessa política enlouquecida que é a nossa brasileira.
Prudência, sobrevivência, lembrança das promessas e defesa delas. Para isso nós precisamos de um Judiciário corajoso, senhor do seu destino e capaz de cumprir o seu mandato constitucional. Precisamos de patriotismo institucional, patriotismo constitucional, defesa de direitos. Nós não estamos no mundo da lua. Nós sabemos do que ocorre em torno, o som ao redor não é estimulante, como aquele logo depois da promulgação da Constituição. O que não quer dizer que os nossos sonhos tenham sucumbido. Quer dizer, sim, que, ao contrário, eles devem é ser mantidos agora, sob vigilância, nos nossos corações, na nossa experiência, nesse país desgraçado que é o nosso.
Eu vou terminar, vou passar a palavra aos meus colegas que vão continuar o que o nosso presidente Jayme começou. Decifrar esse papel de como podemos pensar a magistratura nessas novas circunstâncias, pensando principalmente no elemento mais juvenil. Foi mais uma experiência enriquecedora esta que tivemos e eu guardo disso agora no meu coração uma lembrança inesquecível desse encontro e do que foi o trabalho com os senhores e as senhoras magistrados, ok? Obrigado.
Ministro Toffoli, ministro Salomão, ministro Saldanha, doutor Jayme, Renata, colegas aqui da mesa, professor Werneck, professora Maria Alice. Eu me preparei aqui para complementar as intervenções que já foram feitas, especialmente as do Werneck e Maria Alice.
O que seria o perfil da magistratura, do ponto de vista socioeconômico e também do ponto de vista das tentativas de ingresso na carreira, e associado com a socialização do ponto de vista acadêmico? Eu acho que são três aspectos que, vistos em perspectiva que a gente considera de 20 anos pra cá, nos falam de um processo lento de formação, que a gente poderia pensar até em uma certa metamorfose da corporação nestes 20 anos.
Para usar uma expressão do sociólogo Ulrich Back, que eu acho que é muito precisa e interessante, “transformações que vão de alguma maneira, lenta e discretamente definindo o perfil”. Nós trabalhamos com um perfil mais vocacionado, um perfil mais profissional, e a gente poderia dizer que está em curso uma tendência de uma magistratura mais profissional, mais técnica.
Do ponto de vista socioeconômico, a pesquisa revela que há ainda uma diversidade muito interessante na magistratura brasileira. Ela é um pouco menos viva do que há 20 anos atrás, mas, de qualquer modo, temos um percentual de quase 1/3 da magistratura que tem origem familiar popular. Esse é um dado importante que fala sobre uma certa resistência, no sentido de uma permanência desse caráter mais democrático da corporação. Contrariando, inclusive, uma expectativa que nós formulamos há 20 anos atrás, que haveria uma certa tendência de uma apropriação pela classe média. Não que ela não tenha se realizado, mas, de algum modo, ela não foi tão profunda quanto a gente supunha incialmente.
Isso tem a ver com o segundo ponto que eu quero mencionar, que é o percentual muito alto de magistrados que, para ingressar na carreira, realizam muitos concursos, inclusive para as demais profissões jurídicas. A gente fez uma contagem de dois a cinco concursos realizados por juízes, para o MP, para a Defensoria e para a própria magistratura. E um percentual de 60 e tantos porcento que, para ingressar na carreira, passa por cursos preparatórios. Esses aspectos são muito importantes, até porque eles falam de uma mudança no perfil. Se a gente pensa no processo de recrutamento da magistratura brasileira, a ideia de que são profissionais que estão chegando à carreira após inúmeras tentativas. Este dado, inclusive, chamou muito a atenção na Justiça Federal, ele é muito saliente na Justiça federal.
E entendemos que isso pode estar jogando a favor dessa tendência de um perfil mais profissional, uma carreira de juiz que vai se afirmando como uma carreira pautada por critérios técnicos mais exigentes, com uma burocracia pública, criando mecanismos cada vez mais rigorosos de ingresso e, ao mesmo tempo, exigindo atributos. De certo modo, são mais técnicos.
Isso parece estar em consonância com o terceiro aspecto que eu quero mencionar, que é justamente é o percentual crescente, comparado com 20 anos atrás, de magistrados que estão realizando pós-graduação, especialização e estrito senso. Estamos falando ai de 70%. Quando a gente fala especificamente de mestrado, são 20%, inclusive o doutorado também corresponde a um percentual já de 5% a 8%, na Justiça Federal mais, inclusive com pós-graduação no exterior.
Esse dado deve ser, ao meu, ver atrelado à produção intelectual técnica em revistas especializadas, que também cresceu muito quando comparado com os dados de 20 anos atrás. É uma magistratura que está de alguma maneira com um perfil mais acadêmico em alguma medida ou uma presença mais forte na produção técnica por meio de revistas especializadas.
Estou chamando atenção para esses três aspectos porque, evidentemente ainda de forma muito preliminar, como a Maria Alice falava, esses dados são apenas mapeamentos e exigem aprofundamento. Mas eu acho que, quando a gente pensa nessas três dimensões, o perfil socioeconômico, estratégias de ingresso na carreira, exigências para o ingresso na carreira e a socialização na vida acadêmica intelectual da profissão, eu acho que os três juntos, eles permitem pensar nesse processo de mudança que esta ai em curso nessa corporação. Inclusive com nuance muito interessante que distingue o perfil do juiz federal e do juiz estadual.
Então, eu acho que são dados que podem interessar diversos lados, não só da associação, do próprio tribunal, do CNJ, mas para toda a sociedade em geral. Nós estamos efetivamente forjando que juízes precisamos, queremos. Então, eu acho que o nome do próprio projeto “A magistratura que queremos”, esses dados nos ajudam muito a aumentar a nossa capacidade de reflexividade a respeito desses processos que estão em curso. São processos discretos, muitas vezes invisíveis e que estão alterando significativamente o perfil da nossa magistratura.
A partir do título “Quem somos. A magistratura que queremos”, afinal, quem é a magistratura? Qual é a conclusão, ou a principal conclusão que vocês pesquisadores atingiram com essa pesquisa?
É preciso que se diga que essa, como lembrou o doutor Jayme, não é uma pesquisa conclusiva, é uma pesquisa indicativa. Ela contém uma série de aspectos que deverão ser trabalhados ao longo de algum tempo, com questões que deverão ser cotejadas entre si, para que tenha esse perfil, ou que se chegue perto de uma hipótese mais consistente acerca da identidade da magistratura.
Eu lembro que há 20 anos atrás, entre a entrega do catálogo e a formulação do livro Corpo e Alma da Magistratura Brasileira, se passou um ano de intenso trabalho, nós todos debruçados sobre os resultados, pra que tivéssemos a sugestão de um perfil da magistratura.
Essa ideia dos seminários públicos a que se referiu agora o Werneck é muito boa, ela recorda e produz uma imaginação pública acerca da magistratura e deve estar presente nas universidades, contextos onde esta sugestão couber.
Eu vou mencionar três aspectos muito brevemente, que eu acho que são de interesse para essa discussão. O primeiro deles é que a magistratura está envelhecendo, tomando-se o ano de ingresso na profissão, comparada há 20 anos atrás. Naquela época se tinha que 13% da magistratura entrava e permanecia, no que fizemos a pesquisa, com até 30 anos de idade. Era uma magistratura muito jovem. Agora, apenas 2% possuem 30 anos de idade. Então é uma magistratura que, levando-se em conta o ano de ingresso, ela está mais velha.
Sociologicamente esse é um aspecto muito relevante para qualquer produção, porque afeta a composição da categoria profissional, o que significa que afeta o comportamento da categoria profissional. Em geral, as profissões não têm políticas em relação ao recrutamento e à socialização dos jovens que ingressam, isso é uma coisa a ser discutida. Porque sociologicamente esse é um ponto que vale a pena trazer para o debate, o que se faz com o conjunto de magistrados que passou por um processo de socialização dentro do Judiciário e podem estar apresentando algum comportamento, algumas formas de atuação que não sejam tão interessantes para a magistratura. Esse é um ponto que eu acho interessante, que não tem a ver apenas com a categoria dos senhores e das senhoras, mas que é um aspecto analítico relevante para a profissão.
Outro aspecto que eu acho interessante diz respeito ao excesso de trabalho que foi mencionado pelos juízes de primeiro grau, sobretudo por juízes da Justiça Estadual. Eles demonstraram em várias questões que estão trabalhando em excesso e, em alguns momentos, eles se referem à dificuldade de proceder algumas atividades que são da profissão e que não conseguem exercer.
Há uma questão, acho que é a 139, que indaga o juiz acerca das suas atividades, como ele distribui o seu tempo, como é o seu cotidiano. Essa também é uma questão clássica quando se pesquisa categorias profissionais, ou seja, dado que você trabalha oito horas por dia, como que ele organiza a sua agenda nesse dia. Então, nós formulamos essa questão e estabelecemos uma serie de possibilidade da organização da rotina de trabalho em um dia, que era a análise dos autos, realização de audiências, despacho de expedientes, atendimento a advogados, pesquisa de jurisprudência, leitura e estudo de textos técnicos.
A leitura de textos técnicos e a pesquisa de jurisprudência foram os itens menos apontados na rotina desses juízes de primeiro grau, o que significa que eles não estão consultando a jurisprudência, que significa pensando mais extensamente o tema, que um dos elementos da cultura de cunho mor, que é exatamente essa pesquisa sobre precedência, a cultura da jurisprudência não vem se confirmando, ainda que haja uma aproximação da nossa atividade jurídica com esses indivíduos.
Então, você tem um procedimento que vem integrado a Constituição de 88, com uma cultura de cunho mor que não vem sendo realizada porque a jurisprudência não vem sendo consultada. Esse é um tema também para ser debatido, porque, obviamente, os juízes de primeiro grau estão usando muito do seu tempo na análise dos autos, na realização de audiências e outros itens que não a consulta em livros de estudo.
Isso é um pouco diferente para a Justiça Federal, é exatamente o contrário. Eles afirmam que eles têm mais tempo de leitura, de preparação com livros técnicos, e mais tempo, também, de pesquisa de jurisprudência.
O último item que eu gostaria de chamar a atenção é acerca do associativismo que, na relação há 20 anos atrás, o padrão de associativismo continua intenso, 90% dos magistrados pertencem a uma unidade de representação. Contudo, nestes últimos 20 anos, houve uma segmentação muito intensa em relação ao associativismo. Então, se havia há 20 anos atrás o predomínio indiscutível da Associação dos Magistrados Brasileiros, da AMB, hoje não é bem assim. Ela divide com outras entidades a representação da magistratura. Isso deve ser levado em conta porque a gente sabe que o associativismo em todas as categorias profissionais, ele não apenas o lugar da representação das demandas, mas é sobretudo o órgão reflexivo da profissão. É ai que a profissão se pensa ou deveria se pensar, é ai que ela estabelece parâmetros.
Então, todo associativismo é, ao mesmo tempo, um lugar de demandas e um lugar de produção de identidade. Se está muito segmentado, isso pode favorecer a construção das demandas, mas certamente de uma construção de uma identidade acerca da magistratura. Ela vem também marcada por uma segmentação que em alguns contextos pode não ser tão interessante.
Então, há ai três aspectos que eu acho que mereciam uma atenção para uma política de construção da identidade da magistratura, uma política que pense no recrutamento dos projetos de socialização dos ingressantes, uma política que reveja a forma coma a magistratura entra em contato com a pesquisa jurídica e, finalmente, uma discussão do associativismo, que é, no meu ponto de vista, a quem as condições contemporâneas têm um lugar de legitimação de suas práticas. Onde há uma identidade forte no grupo de uma associação, há prática profissional, se torna mais legítima socialmente.