Notícias | 13 de março de 2014 09:40

Indiferença diante da morte

*Luciano Rinaldi

Em primeira página, noticia O GLOBO de 8 de março o assassinato de dois policiais militares no exercício de suas funções, após troca de tiros com criminosos. E que, nos últimos dois anos, o número de mortes chega a dez. No editorial “Em defesa dos policiais e das UPPs” merece registro a pertinente referência acerca da passividade da população diante do fato.

Sim, a atividade policial é extremamente perigosa. Mas não, o povo não pode ser indiferente ao assassinato de um agente público. A morte de um policial em serviço deveria causar comoção popular muito maior do que o aumento de tarifas de ônibus. Nossa escala de valores morais está deturpada. A apatia é alarmante e nos enfraquece enquanto nação que busca, ou deveria buscar, a maturidade democrática. Lembremos a advertência de Dante Alighieri, ao lembrar que as regiões mais sombrias do inferno estão reservadas àqueles que permaneceram neutros em tempos de crise moral.

A opção pelo exercício da função pública, norteada pelo propósito maior de servir a coletividade, é sobretudo fruto de vocação, de uma aptidão, de um ideal. Vocação é o chamado da voz da alma. Não fosse a vocação, faltariam soldados, policiais, bombeiros. Ninguém optaria por uma profissão que colocasse em tão alto risco a própria integridade física. Logo, é digno de admiração aquele que coloca sua vida em jogo para nossa segurança.

No entanto, quando a população se comporta com indiferença e insensibilidade às baixas sistemáticas de policiais (mal remunerados e mal equipados), nem a vocação será suficiente para manter os homens de bem em seus postos. O silêncio é grave. Esse comportamento estéril, de desconsiderar as instituições democráticas e seus agentes, cobrará um preço alto no futuro. Precisamos refletir, seriamente, sobre o modelo de país que estamos projetando.

É irremediavelmente falsa a percepção da sociedade de um possível predomínio da chamada “banda podre” nas instituições. É que, infelizmente, a honestidade e as boas práticas, enquanto obrigações de todos nós, não rendem notícias. Nesse contexto, é crucial que as instituições sejam prestigiadas pela sociedade, com a necessária contribuição — responsável — da mídia.

Ensinou Santo Agostinho que a esperança tem duas filhas, a indignação e a coragem. A indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las. Não há esperança para o povo que se conforma diante do abuso e da violência. Tenhamos esperança, mas com coragem.

Luciano Rinaldi é desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

 

Fonte: O Globo