*O Globo
A pouco mais de duas semanas do fim do contrato de concessão do transporte por barcas no Rio, o futuro do serviço usado diariamente por quase 40 mil passageiros permanece incerto. No fim do ano passado, o governo do Estado anunciou um acordo em que pagaria uma indenização de R$ 600 milhões para a CCR Barcas manter o sistema operando por mais um ano. A prorrogação do prazo, no entanto, depende de homologação da Justiça, o que até agora não aconteceu.
Numa reunião no último dia 11 com representantes do estado, o Ministério Público pediu tempo para analisar os cálculos previstos nas cláusulas de natureza econômico-financeira e verificar questões técnicas que fazem parte do acordo. Um novo encontro para tratar do assunto foi marcado para a próxima segunda-feira. Só após a manifestação da Promotoria, o documento vai para a Justiça. Até lá, pelo menos, segue o temor de que o serviço seja interrompido a partir de 12 de fevereiro.
Nem a Secretaria estadual de Transportes (Setrans), nem a CCR Barcas, e nem o MP, dão detalhes do acordo pretendido. Além da indenização, uma das cláusulas do acordo prevê a devolução ao estado dos bens de propriedade da concessionária, adquiridos à época da privatização da antiga Companhia de Navegação do Estado do Rio de Janeiro (Conerj), no fim dos anos 1990. Nesse pacote estão 11 das 16 embarcações que compõem a frota atual — as outras cinco foram compradas pelo estado e estão cedidas à empresa —, o prédio histórico na Praça Quinze onde funciona a sede administrativa da CCR Barcas, cinco estações de embarque e desembarque de passageiros e dois estaleiros.
O acordo precisa antes ser referendado pelo MP e homologado pela Justiça porque, em 2017, o contrato de concessão foi anulado pelo Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). A mesma decisão determinou a manutenção da operação do sistema até que nova licitação fosse realizada. Houve recurso e desde então o processo encontra-se em análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Caso seja confirmado, o acordo prevê que a CCR Barcas fique à frente da operação do transporte por mais um ano, com possibilidade de renovação por outro ano, até fevereiro de 2025. O tempo seria suficiente para que fosse concluído estudo da Coppe/UFRJ para elaboração de nova modelagem para o trasporte aquaviário no estado, que será usado pelo governo como base para a elaboração de novo edital de concessão. Perguntada se há uma alternativa planejada para garantir a continuidade do serviço caso o acordo não seja efetivado, a Setrans informou que “não há perspectiva de interrupção da prestação do serviço de barcas para a população”.
A Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos de Transportes Aquaviários, Ferroviários, Metroviários e de Rodovias do Rio (Agetransp) afirmou, por meio de nota, que acompanha as negociações e “solicitou ao poder concedente e à concessionária um plano de contingência” caso as partes “não obtenham sucesso”. O órgão informou ainda que a Setrans “iniciou um processo visando à contratação de outro operador do sistema, caso o acordo não seja validado” pelo MP.
— A avaliação que temos é que o governo está apostando numa decisão judicial que obrigue a continuidade do serviço. Enquanto isso, jogam peso para que o Ministério Público avalize um acordo que tem como base uma dívida alegada que tem sido judicialmente contestada há anos. É inaceitável a incompetência do governo nos colocar nessa situação: entre a interrupção do serviço ou assumir uma dívida milionária — observa o deputado estadual Flávio Serafini (PSOL), presidente da frente parlamentar em defesa do transporte aquaviário da Alerj.
Desde 2015, a concessionária pede para deixar de operar as barcas, alegando prejuízos que passariam hoje de R$ 1 bilhão — causados por desequilíbrios no contrato ao longo dos anos. O prazo de concessão de 25 anos vence no próximo dia 11.
Enquanto isso, quem depende do transporte pressiona por uma definição. Na manhã de terça-feira, cerca de 60 moradores da Ilha de Paquetá fizeram um protesto na porta do Palácio Guanabara, sede do governo do estado, em Laranjeiras, na Zona Sul do Rio.
— Não podemos nem pensar em ficar sem barcas; nossa reivindicação é por mais oferta. Estamos há três anos com horários reduzidos em quase 50%, baseados no argumento de que a linha para Paquetá é deficitária — afirma Guto Pires, presidente da Associação de Moradores da Ilha de Paquetá.
Depois do protesto, uma reunião foi agendada para a tarde desta quinta (26) com a participação do secretário de Transporte e Mobilidade Urbana, Washington Reis, parlamentares e representantes dos trabalhadores e usuários do transporte.
— É inaceitável que o governo do estado tenha permitido que se chegasse ao ponto que chegou. Esse é um problema que todos sabiam que iria acontecer. Estamos correndo o risco de a população ficar a ver navios, sem um serviço essencial — disse Serafini, que no dia 9 de janeiro solicitou à Setrans acesso à minuta do acordo, sem obter resposta.
Além da preocupação com a iminente interrupção do serviço, há temor quanto ao destino dos 800 funcionários que trabalham na operação atualmente. De acordo com Marcelo Schmidt, representante da Federação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Afins (FTTAA), o contingente chegou a receber aviso prévio, o que reforçaria a tese de que a concessionária prepara sua retirada no negócio. A medida, ainda segundo Schmidt, foi revertida logo depois. A empresa não confirma a informação.
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