Notícias | 29 de novembro de 2010 13:45

Seminário prepara juízes para identificar casos de tortura

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República promovem até esta terça-feira (23) um seminário para capacitar juízes de varas de execução penal e de infância de todo o país para reconhecer e usar estratégias contra a prática de tortura em presídios e centros para menores infratores.

“A partir dos mutirões carcerários, se identificou que os crimes de tortura ocorrem e são muitas vezes negligenciados, já que a denúncia parte de um presidiário. Os agentes públicos dificilmente são punidos”, disse o coordenador do Departamento de Monitoramento do Sistema Carcerário (DMF) do CNJ, Luciano Losekann.

Segundo ele, o Estado brasileiro também é insistentemente cobrado por organismos internacionais por conta da falta de atuação relativa a crimes de tortura, o que também justificou a realização do evento.

O conselheiro do CNJ Walter Nunes disse após a abertura do evento nesta segunda (22) que os presídios brasileiros não estão cumprindo o papel de recuperar os presidiários, e que a prática da tortura nos cárceres é um dos problemas que impossibilitam essa recuperação.

“O sistema penitenciário em si não está servindo para recuperar, isso é uma coisa muito concreta. A cada dia, de forma mais acentuada, nós estamos vendo nos noticiários pessoas que estão presas e continuam praticando crimes”, afirmou.

Dificuldade de flagrante
Márcio Fraga, juiz auxiliar da presidência do CNJ que atua nos mutirões carcerários em todo o Brasil, falou sobre a dificuldade de comprovar os crimes de tortura. “Muitos elementos dificultam a comprovação da tortura nos cárceres. Feridas podem ser resultado de briga de facções, é difícil dar crédito a uma denúncia de tortura de um presidiário sem o flagrante”, disse.

A juiza de direito Sonali da Cruz Zluhan, de Caxias do Sul, falou sobre um caso concreto que ilustra a situação. Ela recebeu denúncias de tortura em um presídio e foi pessoalmente ao local. “Eles têm um sistema de câmeras de vigilância, mas os próprios agentes penitenciários dificultaram o acesso ao vídeo. Só conseguimos as imagens depois, e já era tarde para configurar o flagrante”, explicou.

Márcio Fraga também explicou sobre a diferença entre os entendimentos de tortura lato sensu e daquela prevista como crime. Segundo o juiz, também se deve debater a espécie de tortura que ocorre por meio da superlotação e más instalações dos presídios, por exemplo, as quais não são previstas pela Lei.

Adolescentes
Reinaldo Cintra, coordenador do programa Medida Justa, do CNJ, afirmou que o sistema socioeducativo tem atuado em condições semelhantes às do sistema carcerário, o que prejudica os adolescentes infratores. “Pouquíssimos lugares têm conseguido atender a proposta de educação e reinserção dos jovens”, disse.

O Medida Justa é um programa que pretende mapear as unidades de internação de adolescentes no país e verificar a situação processual de todos os adolescentes privados de liberdade, além de levantar a situação física e pedagógica das unidades de internação.

O coordenador do programa defende que só é possível melhorar por meio de investimentos na qualidade das unidades de atendimento dos jovens, e da capacitação dos agentes. “Não se pode querer que alguém preparado para o sistema carcerário atue no sistema socioeducativo, são coisas completamente diferentes”, declarou.

Segundo ele, é necessário vencer a “cultura da violência” que ainda existe quanto à educação de jovens infratores, e que o seminário incentiva que os juízes levem um novo entendimento aos agentes, que lidam diretamente com os adolescentes.